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COLLOR E O CONFISCO
DA POUPANÇA
Vinte anos depois, Plano Collor é lembrado pelo trauma do confisco da poupança e
pelo mau exemplo de gestão da economia
Jorge Félix
19.03.10 - 21h00 - Atualizado em 21.01.16 - 09h06
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HISTÓRIA
Collor e Zélia: hoje um pede desculpas ao povo pelo confisco e a outra nem gosta
de comentar o seu próprio plano
Há 20 anos, um homem desconhecido, com um nome árabe e um sotaque inglês tão
acentuado a ponto de prejudicar a compreensão de seu português, foi para a
televisão explicar aos poupadores brasileiros o ato mais traumático do Plano
Collor: o confisco da caderneta de poupança. Era Ibrahim Eris, turco de
nascimento e então presidente do Banco Central. Sua imagem ao lado da ministra
da Economia, à época Zélia Cardoso de Mello, jamais saiu da mente de quem
assistiu àquelas imagens. Os erres escorregadios de Eris em rede nacional
indignaram ainda mais os correntistas que acordaram no dia 16 de março de 1990,
com apenas 50 mil cruzados novos nas contas – ou R$ 4.142 em valores corrigidos
pelo INPC. Um dia após a posse de Fernando Collor de Mello, o primeiro
presidente eleito depois de 29 anos de recesso democrático, o País viveu o que
entrou para a história como o melhor exemplo de como a economia jamais deve ser
conduzida por um governante. A escolha de Eris como um dos porta-vozes do plano
econômico foi interpretada pela opinião pública como um descaso ao sentimento de
milhões de brasileiros, que, do dia para a noite, ficaram sem dinheiro até para
tratar de doenças, mesmo que suas economias estivessem em uma aplicação
financeira intocável e garantida por lei, como a caderneta. Com a justificativa
de debelar uma inflação de mais de 80% ao mês, a equipe de Zélia, nas palavras
do ex-ministro Delfim Netto, transformou a economia do País em uma “experiência
de laboratório e os brasileiros em ratinhos”. As consequências para muitas
famílias foram irreparáveis com mortes, suicídios e desemprego
– provocado por
uma recessão aguda logo no primeiro ano do plano. Em 1990, o PIB caiu 4,5% e a
economia permaneceu estagnada.
A inflação também despencou para 7,59%, mas resuscitou com força nos anos
seguintes, encerrando o período Collor em mais de 25% (IPCA de dezembro de
1992). Foram os anos da chamada “estagflação” – uma anomalia econômica. Mais do
que herança, o Plano Collor deixou um trauma, até hoje, entre os aplicadores da
caderneta de poupança. Duas décadas depois, os brasileiros ainda se assustam –
como ocorreu recentemente – com qualquer ameaça de alteração nas regras desta
aplicação financeira. É difícil esquecer como o valor do confisco foi definido,
de forma totalmente irresponsável, sem nenhuma fundamentação técnica. Pouco
tempo depois de deixar o cargo, a própria ministra Zélia contou em sua biografia
“Zélia, uma paixão” que os 50 mil cruzados novos foram resultado de um sorteio.
Ou seja, poderia ser qualquer um dos valores que estavam escritos em pedaços de
papel. Da mesma forma amadora, a equipe de Zélia conduziu os outros pontos de
seu programa de combate à inflação, como o enxugamento da máquina do Estado (a
ponto de eles mesmos chegarem para trabalhar e verificar que estavam sem
funcionários nos gabinetes, que haviam sido demitidos ou transferidos,
comprometendo o funcionamento da administração pública naquele momento crucial),
as privatizações e a abertura da economia. Este, aliás, é o ponto sempre
destacado por alguns economistas como o lado positivo do Plano Collor.
No entanto, depois de duas décadas, é fácil constatar que a globalização da
economia no fim do século XX empurraria o Brasil mais cedo ou mais tarde para
este caminho. As reservas de mercado, sobretudo de informática, estavam com os
dias contados, diante da inexorabilidade de incremento do comércio exterior. Ao
contrário da avaliação de muitos economistas, a abertura de mercado promovida
pelo governo Collor – a despeito de trazer mais competitividade e modernização à
indústria brasileira – foi feita de forma atabalhoada, quase da mesma maneira
que a equipe econômica escolheu o valor do confisco da poupança. Neste
aniversário de 20 anos do Plano Collor, muitos economistas, principalmente os
mais ortodoxos, costumam louvar o programa econômico de Zélia por seu caráter
liberal – a ponto de defini-lo como “avô do Plano Real”. No entanto, o Plano
Real foi muito mais uma consequência dos erros do programa de Collor e da
oportunidade desperdiçada. Com sua imagem de debelar a inflação com um só golpe
de judô, Collor acabou levando o empresário brasileiro a nocaute. O principal
desafio do Plano Real para obter sucesso foi restabelecer a confiança quebrada
pelo Plano Collor e devolver ao empresariado um ambiente de negócios favorável
ao investimento.
ONDE ESTÃO OS AUTORES
MENTORES
Assis, Zélia e Eris no anúncio do Plano Collor, em 1990
Depois de cumprir sua pena de oito anos de direitos políticos cassados, após o
impeachment, o ex-presidente Fernando Collor de Mello hoje é senador por Alagoas
e apoia o governo Lula. Não só. Collor defende a ampliação do papel do Estado na
economia e até a reestatização de empresas que foram privatizadas. Sobre o
confisco, declarou ao jornal “O Globo”: “Já pedi desculpas. Se não quiserem
aceitar, não aceitem. Eu não vou perder a minha noite de sono porque eles (os
brasileiros) não aceitam meu pedido de desculpas.” Vivendo nos Estados Unidos
com seus filhos, Rodrigo e Vitória, do casamento com o humorista Chico Anísio, a
ex-ministra Zélia Cardoso de Mello, 57 anos, trabalha como consultora da empresa Aquilas Associates. Em eventos públicos, Zélia recusa-se a falar sobre o passado
e, principalmente, sobre confiscos de poupança. Ibrahim Eris é empresário e dono
da Linvest Participações, gestora de recursos, cujo principal cliente é ele
mesmo. Desde que deixou o governo, dedica-se ao mercado financeiro, assim como
quase todos os ex-integrantes da equipe econômica do governo Collor. O
ex-diretor de política monetária do BC Luis Eduardo de Assis, que também
participou do anúncio do plano, é hoje diretor de banco.
http://istoe.com.br/58752_DIFICIL+DE+ESQUECER/
24.03.2010
O povo esquece muito
fácil. Após os oito anos sem direitos políticos, Collor retornou à
política e foi um dos senadores mais votados. Dá para entender isso?
Ver mais
POLÍTICA BRASILEIRA
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