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GUERRA EM MINAS GERAIS
Seis dias que abalaram Belo Horizonte Fogo
cruzado entre Força Pública e Exército, na Revolução de 1930, levou
terror à população. Marcas do conflito que matou mais de 50 estão no
12º Batalhão de Infantaria
Gustavo Werneck -
Publicação: 08/10/2011 06:00 Atualização: 08/10/2011 07:05
Poste com marcas de tiros
virou o marco da revolução e está até hoje no
12º BI |
Poste com marcas de tiros virou o marco da revolução e está até hoje no 12º BI
(Maria Tereza Correia/EM/D.A Press.)
Um poste de ferro fundido é
‘testemunha’ e marco dos seis dias que abalaram Belo Horizonte, há exatos 81
anos, durante a Revolução de 1930. Transformado há mais de meio século em mastro
da bandeira do Brasil, na sede do 12º Batalhão de Infantaria (12º BI),
subordinado à 4ª Região Militar (4ª RM), no Bairro Barro Preto, na Região
Centro-Sul, o equipamento, antes usado na iluminação pública da Rua Tenente
Brito Melo, se mantém crivado de balas, indicando a violência dos conflitos
entre a Força Pública, antiga Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), e praças e
oficiais do Exército. No saldo do episódio sangrento, que teve o quartel como
palco principal, morreram mais de 50 pessoas, entre militares e civis. O fogo
cruzado tomou conta das ruas, com os bondes parados, comércio fechado, cinemas
sem funcionar e muito medo entre a população.
Mas para entender as razões do combate ocorrido entre 3 e 8 de outubro e,
principalmente, da revolução, é preciso voltar no tempo, partindo da década de
1920, diz a professora de história da PUC Minas Carla Ferretti. A República
Velha (1889-1930) começava a dar sinais de cansaço. As oligarquias rurais, com
cafeicultores à frente, se enfraqueciam e as perspectivas econômicas se tornavam
cada vez mais sombrias, culminando, em 1929, com a quebra da Bolsa de Valores de
Nova York e posterior crise internacional. Foi nesse cenário de instabilidade e
quebradeira que o gaúcho Getúlio Vargas (1882-1954), candidato da Aliança
Liberal, com união de forças entre Minas, Rio Grande do Sul e Paraíba, e o
paulista Júlio Prestes (1882-1946), de São Paulo e com apoio maciço das
oligarquias, foram às urnas em 1º de março de 1930 na disputa pela sucessão do
presidente da República Washington Luís (1869-1957), representante dos
cafeicultores.
Minas e São Paulo se alternavam no poder, vigorava a política do “café com
leite” – e estando na presidência Washington Luís, chamado de “paulista de
Macaé”, era natural que o próximo chefe da nação fosse mineiro ou apoiado pelo
estado. No entanto, quem ganhou a eleição mas não levou foi Prestes, pois o
gaúcho derrotado deu um golpe militar, inaugurou a Era Vargas e ficou no poder
até 1945.
O foco, então, se voltou para BH. Eram 17h25 de 3 de outubro quando os
“revoltosos” da Aliança Liberal chegaram ao então 12º Regimento de Infantaria
para comunicar a posse de Vargas, naquele mesmo dia, no Rio de Janeiro (RJ). É
preciso lembrar que a comunicação a longa distância era difícil e as informações
circulavam a passos lentos. Ninguém sabia de nada no quartel do Barro Preto,
subordinado à 8ª Brigada de Infantaria, e, para piorar a situação o general da
instituição tinha viajado. Nada, portanto, de comunicado oficial. Certo de que a
sua obrigação era cumprir a Constituição Federal e ciente de que Prestes era o
presidente, o comandante do regimento, tenente-coronel José Joaquim de Andrade,
não se intimidou nem se rendeu e acabou preso pelo secretário de Interior (a
pasta incluía Segurança Pública), Cristiano Machado (1893-1953). O governador de
Minas, na época presidente, era Olegário Maciel (1855-1933), partidário de
Vargas.
Da prisão, Andrade mandou um comunicado aos subordinados: “Aos que se encontram
dentro do quartel, que resolvam como melhor lhes parecer, de modo refletido aos
ditames e do dever naquele momento”. Num telefonema, ele perguntou ao major
Pedro Campos, que estava no quartel, sobre a sua decisão e ele respondeu:
“Salvar a honra do Exército, resistindo até o último cartucho”.
Operação de guerra
O quartel do Exército contava com 672 homens, sendo 47 oficiais e 625 praças,
enquanto a Força Pública tinha em torno de 4,8 mil. Conforme a edição do Estado
de Minas de 4/10/1930, na hora do expediente havia 200 praças ao passo que do
lado de fora mais de 1 mil homens Os ânimos se acirraram quando o tenente José
Moacir foi atacado na Praça Raul Soares pela Força Pública, oficiais foram
presos nas residência e outros conseguiram entrar no quartel sitiado. Na
cobertura dessa “operação de guerra”, o jornal relatou a ocupação de repartições
públicas, a exemplo dos Correios, pelas tropas estaduais.
Há um ano e meio no comando do 12º BI, o tenente-coronel Alcio Costa, sergipano,
se encantou com a história pouco conhecida dos mineiros, reuniu documentos e
fotografias e tem feito palestras em escolas com um audiovisual. “Nesse
episódio, não há mocinhos nem bandidos, apenas mocinhos. O Exército estava
defendendo a constituição e a Força Pública cumpria ordens. Todos lutavam por um
país melhor”, afirma. A resistência terminou no dia 8, com a rendição da tropa
federal, que foi levada para o 5º Batalhão da Força Pública no Bairro Santa
Tereza e depois para o Rio. Sobre a falta de informações, o comandante diz que,
num radiograma (mensagem transmitida pelo rádio), o ministro da Guerra (hoje, da
Defesa) dizia que a situação era normal e que mandaria reforços.
Linha do tempo
1920 – Começa a crise que leva à Revolução de 1930, com enfraquecimento das
oligarquias rurais e sinais do fim da República Velha
1929 –Crise econômica internacional afeta cafeicultores que apoiavam o
presidente Washington Luís
1930 –Em 1º de março, há eleição para a presidência da República, com vitória de
Júlio Prestes sobre Getúlio Vargas
1930 –Em 26 de julho, João Pessoa, vice de Getúlio Vargas, é assassinado na
Paraíba
1930 –Em 3 de outubro, Vargas dá o golpe e toma o poder. Em BH, começa o
conflito entre a Força Pública e o Exército
1930 –Em 8 de outubro, termina o conflito em Belo Horizonte, com a prisão dos
militares do 12º Batalhão de Infantaria
1930 – Em 3 de novembro, Vargas é empossado por uma junta militar como
presidente do Brasil
1934 –Promulgada uma nova constituição, trazendo direitos como voto secreto e
voto feminino
Quartel baleado virou atração
Na época, fachada do Regimento de Infantaria ficou cheia de buracos de
balas e teve vidros quebrados (Arquivo/EM - 1/1/1930)
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Além do poste-monumento, que acabou apelidando o 12º BI de “batalhão do mastro
crivado de balas”, há outras referências importantes do movimento de resistência
de praças e oficiais. No museu da sede da instituição instalada em BH em 1919,
há fotografias dos federais nas trincheiras construídas nas partes mais altas do
terreno; paredes e telhados das casas vizinhas, furados como se fossem peneiras,
pelas metralhadoras e fuzis; feridos nas padiolas; cavalos mortos; e os
integrantes da força estadual durante o cerco, entre outros registros. Terminada
a confusão, o quartel virou atração, com a população em peso visitando o local.
As pesquisas do Exército mostram que durante o cerco os federais tiveram a luz
elétrica cortada, falta de água, pois o abastecimento pela prefeitura teria sido
contaminado com creolina, escassez de alimentos e de atendimento médico, além de
outros duros reveses. “Mas, no final, os vencedores reconheceram o valor do 12º
BI e os praças e oficiais foram homenageados no Rio”, afirma o tenente-coronel.
O Exército perdeu 17 homens, que foram sepultados num mausoléu no lugar do
antigo paiol.
O presidente da Associação dos Reservistas do Brasil (Areb), João de Souza
Armani, com integrantes da Marinha, Exército, Aeronáutica e forças auxiliares
(bombeiros e policiais militares), destaca a importância do resgate da história.
“Nos bairros Santa Tereza e Santa Efigênia há ruas com nomes de heróis do
conflito, como tenente Garro, o primeiro a morrer, tenente Anastácio de Moura,
tenente Vitorino e major Barbosa. Ficou a história denominada Resistência do
12”, diz Armani, lembrando que a sua mãe, moradora de uma casa no alto da Rua
Rio de Janeiro, estava lavando roupa no quintal quando uma bala perdida
ricocheteou e bateu no tanque.
MEMÓRIA
Força das oligarquias
Na República Velha, as oligarquias eram grupos políticos formados por uma
pequena elite, na sua maioria composta por grandes proprietários rurais que
controlavam o poder, agindo na política em função de seus interesses privados e
pessoais. Em virtude da forma federalista do governo, no período, as oligarquias
tinham sua base de poder nos estados, organizando-se em partidos políticos
estaduais, explica a professora de história da PUC Minas Carla Ferretti.
<http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2011/10/08/interna_gerais,254867/seis-dias-que-abalaram-belo-horizonte.shtml>
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