A estudante paulista Ana Karina Marques, de 22 anos, não
encontra a menor dificuldade para ter gente em volta de si.
Simpática, bem-humorada e dona de olhos verdes e sorriso
largo, ela é aquele tipo de esponja social. Dez minutos num
bar ou numa fila de banco já são suficientes para que muitos
papos tenham início. Alguns evoluem e acabam virando
amizade. É impossível precisar o número exato, mas a sua
relação de amigos e conhecidos já beira o milhar. Tanta
sociabilidade na vida real transborda para a virtual. Ana
tem mais de 800 amigos no site de relacionamento Orkut.
Faltou dizer uma coisa a respeito da moça no parágrafo
anterior: ela é dona de uma saúde que a vem mantendo longe
do mais corriqueiro dos resfriados. Os cientistas sabem que
os amigos "de verdade" ajudam muito a melhorar o nosso
bem-estar (veja o box "Alívio imediato", na página ao lado).
Mas pesquisas recentes começam a derrubar essa barreira
entre o real e o virtual e a mostrar que tanto faz se a
amizade é daquelas de se encontrar todos os dias ou se é com
pessoas que você só vê na tela do computador: ambas fazem
bem à saúde.
Pesquisadores da Universidade Flinders, em Adelaide, na
Austrália, mostraram que os idosos com uma rede social
efetiva têm 22% menos chance de morrer num prazo de dez
anos. Por "rede social efetiva", os estudiosos entendem
aqueles contatos com amigos e conhecidos que acontecem
tête-à-tête, por telefone, carta ou e-mail. Eles afirmam que
o contato físico é mais eficaz, mas quaisquer das outras
três formas de contato teve mais influência na sobrevida dos
voluntários do que a convivência com crianças ou família.
A cientista social e professora da Universidade da
Califórnia Bella DePaulo concorda com as conclusões do
estudo australiano. "O contato real entre as pessoas é ótimo
para a amizade, mas compartilhar algo importante com alguém,
mesmo que online, também faz bem à saúde, desde que as
relações sejam autênticas." Ou seja, para que os benefícios
apareçam, é preciso levar para o mundo virtual as
características e atitudes que tornam saudáveis as amizades
com contato físico. Dar ajuda e sustentação emocional é um
exemplo de atividade que pode ser exercida pela internet e
que terá efeitos sobre o "amigo". Segundo o psicólogo
australiano Paul James, especialista em relacionamentos
humanos, isso funciona desde que essa relação seja
recíproca, mesmo que não tenha a mesma intensidade de ambos
os lados. "O importante é poder contar com amigos em
circunstâncias boas e más."
POR QUE O FACEBOOK FAZ BEM A SUA SAÚDE
Alguns efeitos benéficos das amizades reais
transbordam para aquelas cultivadas nos sites de
relacionamento |
1>>>
Ao reduzir a sensação
de solidão, traz bem-estar
2>>> Diminui o risco de
problemas mentais sérios na velhice
3>>> Pessoas com dificuldade de
se socializar, como quem sofre da síndrome de
Asperger, experimentam grandes benefícios das
amizades virtuais
4>>> Bem-estar decorrente de
saber que sempre há alguém disponível para
compartilhar uma notícia boa
5>>> Reduz o estresse
6>>> Cultivar grandes círculos
de amizade (reais + virtuais) diminuiu em 22% o
risco de morte de moradores de um asilo
australiano
7>>> Fortalece o sistema
imunológico
8>>> Ajuda a atenuar o efeito
traumático de experiências como divórcio,
doenças sérias, perda de emprego ou a morte de
um ente querido |
E isso vale tanto para o mundo real quanto para o
virtual. A qualidade conta muito mais pontos do que a
quantidade na hora de montar uma rede "saudável" de amigos.
Para mostrar a pouca eficácia de colecionar amigos sem fim
na internet, o sociólogo e pesquisador norte-americano
Cameron Marlow virou um "residente" do site de
relacionamentos Facebook. Ali, ele é responsável pelo
departamento de Ciência de Dados. Marlow e sua equipe
realizaram uma pesquisa sobre o tamanho das redes pessoais e
os tipos de relacionamento mantidos por usuários num período
de 30 dias. De acordo com os estudos, alguém com 150 amigos
demonstra, em média, interesse por 19 pessoas das que estão
adicionadas ao seu perfil, comunica-se com 7 e obtém
respostas de apenas 5. Assim, dá pra contar em uma mão as
amizades que são boas para a saúde.
A possibilidade de construir relacionamentos consistentes
em um ambiente virtual facilita as coisas para quem não tem
a desinibição e o carisma de Ana Karina, a moça do começo
deste texto. O estudante Cezar Augusto de Souza, de 15 anos,
morador de João Pessoa, na Paraíba, tem dois perfis no Orkut,
com mil amigos cada um. Diz que não conhece todo mundo ali,
mas que esse é seu jeito de se aproximar de um número maior
de pessoas. "Sou tímido, não faço muitas amizades fora da
rede." O curioso é que tanto o tímido e "virtual" quanto a
extrovertida e "real" fazem um balanço parecido do número de
amizades que valem a pena. "Amigo mesmo, que me conhece e me
ajuda, tenho uns 10 ou 15", afirma Cezar. Ana diz contar com
20. E todos são fundamentais, quer o contato com eles se dê
por meio de um clique ou de um toque.
ALÍVIO IMEDIATO |
Mais resistência ao frio, menos
vulnerabilidade a vírus, maior capacidade de
recuperação, menor sensibilidade a dor e
manutenção da saúde mental na terceira idade.
Apesar de recentes, os estudos sobre os efeitos
das amizades presenciais na saúde já concluíram
que esses são alguns dos benefícios decorrentes
da convivência frequente com gente querida.
"Compartilhamos nossas experiências emocionais
com os amigos, eles sabem muito sobre nós. Por
isso, eles são um forte apoio nos momentos
difíceis", diz a cientista social Bella DePaulo.
E esse apoio está na raiz de tudo de bom que a
amizade tem para oferecer à saúde.
Karen Roberto, diretora do Centro de
Gerontologia da Universidade de Virginia Tech,
nos EUA, afirma que os benefícios desses
relacionamentos, além de numerosos, são
duradouros. Em sua pesquisa sobre a influência
das redes sociais na saúde de mulheres idosas,
Karen constatou que as oportunidades para troca
de intimidade, sustentação emocional e
compreensão oferecidas pelos amigos refletiam
num quadro de saúde positivo, com mais qualidade
de vida e bem-estar das mulheres estudadas. "O
contato com os amigos é saudável porque ajuda a
combater a solidão e o isolamento social, comuns
entre pessoas com problemas de saúde crônicos."
Em outro estudo, divulgado pelo jornal da
Faculdade Americana de Cirurgiões, pacientes em
pré e pós-operatório de cirurgias de alto risco
e que possuíam maior rede social apresentaram
menor intensidade na dor percebida e menos
ansiedade. O uso de analgésicos e o tempo de
internação também foram menores para aqueles que
desfrutavam de fortes laços de amizade. |