BOLSONARO E GUEDES DESTROEM RESERVAS
NACIONAIS
Venda de reservas internacionais pelo
governo deixará Brasil vulnerável a crises externas
Acumulados nos governos Lula e Dilma, ativos são um "seguro" que o país tem, mas
do qual está se desfazendo para implementar a agenda ultraliberal
Por Eduardo Maretti, da RBA
Publicado 13/01/2020 - 20h23
Marcello Casal/ABr
Na verdade, o governo vende as reservas para abater dívida bruta e se desfazer
de um instrumento de política cambial
São Paulo – No ano passado, o Banco Central (BC) vendeu US$ 36,9 bilhões das
reservas internacionais brasileiras, que servem como garantia ou seguro em
momentos de crises cambiais. Ao final do ano de 2002, antes de o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva assumir a presidência da República, as reservas
brasileiras eram de US$ 38 bilhões. Em março de 2016, em pleno processo de
impeachment da presidenta Dilma Rousseff, elas somavam US$ 372 bilhões.
A “queima” das reservas pelo governo Jair Bolsonaro é explicada comumente pela
necessidade de o BC conter a alta do dólar, e porque o Brasil registrou em 2019
a expressiva saída de recursos da ordem de US$ 45 bilhões.
“Na verdade, o governo vende as reservas para abater dívida bruta e para se
desfazer de um instrumento de política cambial, porque acha que não precisa
dela. Acha que o mercado de câmbio tem que se autorregular e ser determinado
exclusivamente pelo mercado”, explica o economista e professor da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp) Pedro Rossi. “As reservas dão ao governo mais
autonomia de política econômica. Mas vender desta forma é ruim, porque não tem
objetivo estratégico claro.”
O fato de as reservas internacionais – deixadas por Lula e Dilma – ainda estarem
em um patamar alto “é um fator crucial para o país não estar numa situação igual
ou pior do que a da Argentina”, diz o economista e ex-presidente da Caixa
Econômica Federal Jorge Mattoso.
A continuidade desse movimento é perigosa, na opinião de Rossi. “Se o governo
continuar sinalizando na redução das reservas e o mercado entender que o Brasil
quer se desfazer dos instrumentos de política econômica e cambial, é
preocupante, ainda mais porque o mercado externo é complexo e há mudanças em
curso que precisam de atenção do governo.”
A complexidade do cenário internacional, hoje instável, envolve a guerra
comercial China-Estados Unidos, a reorganização da Europa, com o Brexit, as
várias tensões geopolíticas de desfecho imprevisível, como a dos EUA com o Irã.
Esses fatores trazem consigo a possibilidade de crise financeira e, portanto,
quanto mais as reservas brasileiras caírem, maior será a vulnerabilidade do
país.
O comércio exterior é revelador da atual conjuntura interna brasileira, e também
da conjuntura internacional. A balança comercial apresentou em 2019 o pior
resultado desde 2015, com superávit de US$ 46,7 bilhões no ano. Em 2015, o
superávit foi de US$ 19,5 bilhões.
Para Mattoso, o horizonte está longe de ser promissor, dado que o governo
Bolsonaro, com sua agenda ultraliberal, ainda tem três anos de mandato. “Os
estrangeiros não estão investindo, estamos exportando menos. Não tem
investimento nem na área financeira, nem na área produtiva e muito menos
investimento público, e não podemos esperar que este governo vá fazer alguma
coisa nesse sentido”, diz. “Portanto, a situação em 2019 deve continuar em 2020.
Vamos provavelmente usar ainda mais as reservas e dependemos cada vez mais
desses recursos para garantir alguns anos de sobrevivência ao país.”
O movimento brasileiro relativo às reservas, na opinião de Rossi, faz parte de
um conjunto de políticas que devem ser analisadas separadamente, mas que estão
dentro da “agenda anacrônica de defesa radical de um liberalismo financeiro,
comercial, unilateral, sem contrapartida e visão estratégica, o que inclui a
política cambial e a venda de reservas”.
Um projeto enviado pelo governo ao Congresso é simbólico dessa agenda, comandada
pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. O projeto inclui a possibilidade de
pessoas físicas e jurídicas abrirem conta no Brasil em dólar. “O Brasil caminha
para ser um Equador ou uma Argentina. No conjunto, as políticas voltadas para as
reservas refletem a orientação ultraliberal, anacrônica, que o governo está
implementando em várias áreas”, diz Rossi.
<https://www.redebrasilatual.com.br/economia/2020/01/venda-de-reservas-internacionais-pelo-governo-deixara-brasil-vulneravel-a-crises-externas/>
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