É enganoso afirmar que Jair Bolsonaro (PL) tenha vetado o orçamento secreto e que não tenha “nada a ver” com o esquema de repasses bilionários descoberto pelo Estadão. A alegação tem sido reafirmada inúmeras vezes pela própria campanha do candidato à reeleição, e foi repercutida outra vez em um vídeo viral publicado por dois perfis no Instagram. O viral alcançou mais de 1,3 milhões de visualizações na plataforma.
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O vídeo cita as prisões realizadas pela Operação Quebra Ossos no Maranhão e Piauí — na sexta-feira, 14, a Polícia Federal prendeu os irmãos Roberto e Renato Rodrigues de Lima, que fariam parte de um grupo que teria inseridos dados falsos em sistemas do SUS para receber repasses de emendas parlamentares no Maranhão. Diferentemente do que diz o vídeo, o senador do Maranhão Weverton Rocha (PDT) não foi apontado pela PF como o chefe do esquema. O nome do político não foi citado entre os investigados na Representação Criminal emitida pela Vara Federal de Bacamal, que autorizou a operação.
O vídeo usa o nome de Rocha para construir uma possível relação com o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sustentar o argumento de que o orçamento secreto é controlado pela bancada e apoiadores do petista. O senador concorreu ao governo do Maranhão com um candidato a vice do partido de Bolsonaro, Hélio Soares (PL). Apesar disso, Weverton demonstrou afinidade com o ex-presidente e chegou a visitá-lo na prisão. Diferentemente do que afirma o vídeo analisado aqui, a disputa ao governo maranhense foi decidida no primeiro turno — Carlos Brandão (PSB) foi reeleito.
O nome do senador Rocha veio à tona porque ele é correligionário de Erlânio Xavier (PDT), prefeito de Igarapé Grande (MA). De acordo com investigação da Polícia Federal, só nessa cidade, com cerca de 12 mil habitantes, contratos irregulares da Secretaria Municipal de Saúde teriam servido para desviar pelo menos 7 milhões de reais originados do orçamento secreto.
Uma das características do orçamento secreto é a falta de transparência. Deputados e senadores que não querem aparecer se escondem por trás de “usuários externos”, que funcionam como laranjas. Ou seja: a solicitação é feita por esse “usuário secreto” — que no caso da operação Quebra Ossos seriam os irmãos Rodrigues de Lima. O nome do parlamentar continua em segredo. Dessa forma, não foi possível confirmar o suposto envolvimento do senador.
Vale ressaltar que a operação Quebra Ossos é apenas uma das que foram deflagradas para investigar desvios do orçamento secreto. Em série de reportagens, o Estadão revelou que os recursos foram usados para compras superfaturadas de tratores, caminhões de lixo e ônibus escolares. Em agosto, por exemplo, a PF deflagrou operação em Alagoas que teve como alvo 15 prefeituras que receberam dinheiro do orçamento secreto. O prefeito Gilberto Gonçalves (PP), de Rio Largo, chegou a ser preso, mas teve a prisão revogada.
Entenda o esquema do orçamento secreto
O vídeo afirma que Bolsonaro vetou o orçamento secreto e traz trecho de uma entrevista em que o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente, reitera a informação. É uma inverdade. Embora a primeira tentativa de aprovar o orçamento secreto tenha partido do Congresso e sido vetada por Bolsonaro, o presidente recuou do próprio veto. Em dezembro de 2019, encaminhou novo projeto de lei que cria a emenda RP9. O documento (abaixo) é assinado pelo próprio presidente.
Assinatura do presidente Jair Bolsonaro no projeto que fixou as emendas do orçamento secreto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
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A exposição de motivos que justifica o texto leva a assinatura do ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos. Como mostrou esta reportagem do Estadão, a
equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, tinha convencido o presidente de que o orçamento secreto engessaria o governo. Mas, quando o ministro Ramos ressuscitou a proposta,
Bolsonaro trocou as justificativas técnicas que usou para barrar a medida pela
criação de um orçamento que lhe permitiria escolher quais parlamentares seriam beneficiados com bilhões de reais.
Em 2019, Bolsonaro sancionou R$ 30 bilhões – 100% das verbas indicadas pelo Congresso – em emendas do orçamento secreto que poderiam ter sido vetadas por ele. Em três anos, o total sancionado pelo presidente chegou a R$ 65 bilhões.
O responsável pelo vídeo checado aqui também diz que o senador Rogério Carvalho (PT-SE) deu o voto de minerva em favor do orçamento secreto – o que é enganoso. Como mostrou o Estadão Verifica,
Carvalho não deu o voto de minerva ao orçamento secreto, criado na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020. O senador deu o voto definitivo para a aprovação da Resolução 4/2021 do Congresso Nacional, que estipulou as regras de execução das emendas de relator.
Em nota, a equipe de comunicação do senador disse que ele não é investigado por irregularidades no uso do orçamento secreto. “Infelizmente o uso de fake news e acusações sem fundamentos tornaram-se prática comum em substituição à argumentação e ao convencimento no debate político”, disse.