BRASILEIRO PAGA CARO PELO PROJETO
TEMER-BOLSONARO
Brasil à venda
Projeto iniciado por Temer e seguido por Bolsonaro desintegra Petrobras e
povo paga o preço na bomba
Planos para a estatal apontam para uma empresa voltada apenas para a exploração
e produção, como era na década de 90. Brasil caminha
para ser cada vez mais exportador de óleo bruto e importador de derivados,
tornando-se refém dos preços do mercado internacional
Por Eduardo Maretti, da RBA
Publicado 24/01/2020 - 10h34
Eduardo Maretti
Gasolina
"A gente vê uma total falta de
compreensão da população do porquê dos preços estarem tão altos”,
diz dirigente da FUP
São Paulo – Dois movimentos recentes e significativos da atual gestão da
Petrobras, comandada por seu presidente, Roberto Castello Branco, reforçaram
mais uma vez, nas últimas duas semanas, a expectativa dos rumos que a companhia
começou a trilhar desde 2016, com a posse de Michel Temer na presidência da
República e de Pedro Parente na chefia da estatal.
Em Davos, durante a realização do Fórum Econômico Mundial, o presidente do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano,
afirmou na quarta-feira (22) que a pretendida venda de até 9,86% das ações
ordinárias da Petrobras que o banco detém visa melhorar o resultado primário da
União em 2020. O executivo explicou ainda que tal operação faz parte da
política de “desinvestimento” do BNDES.
“Com a venda dessas ações, o risco de o Estado brasileiro perder o controle da
Petrobras é muito grande. São ações ordinárias (que dão direito a voto), e não
preferenciais, que estão sendo vendidas. Isso pode ameaçar
seriamente a capacidade do Brasil de conduzir a Petrobras, que pode
deixar de ser uma empresa pública e virar uma empresa privada, como aconteceu
com a BR Distribuidora”, diz José Sergio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras.
O outro movimento da gestão da estatal foi a conclusão, no dia 14 de janeiro, da
venda (para a canadense Africa Oil Corp) da participação
societária da estatal brasileira na Petrobras Oil & Gas B.V. (PO&GBV),
que produzia petróleo na Nigéria. Com isso, a Petrobras
encerrou suas atividades na África.
“Infelizmente isso vai ao encontro do que eles já tinham estabelecido no plano
de negócios da gestão anterior (de Pedro Parente). A gestão da empresa vai focar
apenas o pré-sal. Dos outros ativos, a gestão vai se desfazer, não só na África
como na América Latina, inclusive aqui no Brasil”, afirma Deyvid Bacelar,
ex-conselheiro da Petrobras e diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP).
A Petrobras na contramão
Para Gabrielli, há duas questões a ser avaliadas quando se fala sobre o que era
a Petrobras até 2002, o que vinha sendo no período dos governos de Luiz Inácio
Lula da Silva e Dilma Rousseff e as expectativas de seu papel na economia e na
sociedade brasileira a partir de 2016.
A primeira questão, diz, é que todas as grandes empresas de petróleo do mundo,
privadas ou públicas, buscam integração entre suas atividades, como se formassem
uma teia. “Elas querem explorar, produzir e refinar petróleo, transformá-lo em
derivados, vender esses derivados e produzir energia. Todas as grandes empresas
de petróleo do mundo caminham nessa direção. Mas a Petrobras caminha na direção
oposta, saindo da integração, tornando-se uma empresa exclusivamente focada na
produção do petróleo do pré-sal.”
A segunda questão, na avaliação do ex-presidente da Petrobras, é que,
diferentemente das empresas privadas, as estatais tendem a adotar a estratégia
de manter dentro do país a maior parcela possível da renda gerada pelo petróleo.
Um dos elementos dessa renda é criar uma cadeia de fornecedores internamente.
“No caso da Petrobras, que trabalha em produção marítima em águas profundas, a
ideia deveria ser criar uma indústria naval no Brasil.”
Esse projeto foi desenvolvido. Em 2003, a indústria naval brasileira empregava
cerca de 7,5 mil trabalhadores. Dez anos depois, o setor tinha 82 mil postos de
trabalho, fora os milhares de empregos indiretos. “A
Petrobras e o governo estão mais uma vez na direção inversa, na contramão ao que
está acontecendo no mundo. Tentam fazer com que mais empresas internacionais
venham para cá”, aponta Gabrielli.
Antes com atividades integradas, a estatal atuava em uma imensa cadeia em que
explorava, produzia e refinava petróleo, transformando-o em derivados, para
vender e produzir energia – e divisas para o país. “Mas
a empresa vem se desintegrando, com os seus ativos das áreas de
biocombustíveis, termoelétrica, fertilizantes nitrogenados, química e
petroquímica sendo vendidos. Ela vai se reduzindo a uma empresa de
exploração e produção, como era na década de 90”, observa Bacelar.
Assim,
o Brasil passa a ser um exportador de óleo bruto e importador de produtos
refinados, refém dos preços do
mercado internacional. A população não entende por que paga tão caro pela
gasolina. “Com a política de preços implantada por Temer em outubro de 2016, a
gente vê uma total falta de compreensão da população do porquê dos preços
estarem tão altos.” Hoje, o litro da gasolina não é inferior a R$ 4,40, em
postos confiáveis.
Desintegração
O caso paradigmático da desintegração foi o fato de que a enorme BR
Distribuidora, em julho de 2019, passou a ser uma empresa privada, com a venda,
pela Petrobras, de 30% de suas ações, por US$ 2,5 bilhões, para 160 investidores
de vários países. Até 2017, a Petrobras era detentora de 100% das ações da BR.
Naquele ano, sob o governo Michel Temer, a companhia vendeu o primeiro lote das
ações. Com o negócio de 2019, já sob Bolsonaro, a Petrobras ficou com apenas
41,25% da BR Distribuidora e não é mais sua controladora.
Bacelar aponta a venda de oito importantes refinarias da estatal – o próximo e
principal objetivo de “desinvestimento” da gestão – como uma “atrocidade”, junto
com a venda da BR. “Com isso, a Petrobras vai abrir mão do
sexto maior mercado consumidor de derivados de petróleo do mundo. O que
estão fazendo é uma atrocidade”, diz.
“É o Estado
brasileiro entregando para outros países. Isso tudo vai ameaçar o abastecimento
nacional e fazer com que os preços de derivados (gasolina, diesel etc) se elevem
ainda mais, já que essas empresas privadas ou estatais de outros países não
terão compromisso algum com a população brasileira ou com a economia do nosso
país”, acrescenta o
dirigente.
O governo quer vender as refinarias Alberto Pasqualini (RS), Presidente Getúlio
Vargas (PR), Gabriel Passos (MG), Landulpho Alves (BA), Abreu e Lima (PE), Isaac
Sabá (AM), a fábrica de lubrificantes e derivados Lubnor (CE) e a Unidade de
Industrialização de Xisto (PR). O foco da estatal brasileira, como já declarou
Castello Branco, é agora apenas o Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.
Se, de 2003 até 2014, a Petrobras se tornou mais próxima do povo brasileiro –
continua Bacelar –, com projetos sociais, esportivos, culturais, educacionais e
ambientais, hoje ela caminha no sentido oposto. “A maioria desses programas foi
extinto.”
Segundo relatório da própria estatal de 2015, os projetos de pesquisa
desenvolvidos pelo Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez
de Mello (Cenpes) receberam, em 2014, US$ 1,1 bilhão, o que fazia da Petrobras
uma das maiores empresas investidoras em pesquisa na área de energia no planeta.
Entre 2012 e 2014, o total investido na área de pesquisa e tecnologia chegou a
US$ 3,4 bilhões. Em 2014, o Cenpes atuou em parceria com cerca de 100
universidades e centros de pesquisa brasileiros, e 35 no exterior.
Mas a preocupação que a empresa tinha em ajudar no
processo de desenvolvimento industrial, econômico e social do país hoje é
passado. “Os projetos de pesquisa, mestrado, doutorado e outros,
financiados pela empresa, se reduziram a quase zero.
O foco da gestão é dar
alta rentabilidade aos seus acionistas, sem nenhuma preocupação com a indústria
nacional e o povo brasileiro”,
lamenta Deyvid Bacelar.
<https://www.redebrasilatual.com.br/economia/2020/01/preco-petrobras-combustivel/>
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