Hoje as pessoas se vêem, se atraem mutuamente, namoram,
convivem de forma bem íntima antes de, como se diz, “se amarrarem”, e, não
obstante todas essas oportunidades, tantos casamentos se desfazem em pouco
tempo. No passado, no entanto, já foi bem diferente. Acho, entretanto, que agora
está melhor.
Afirma-se que o homem primitivo, quando percebia a sua cobiçada fora da tribo,
sem perda de tempo, pregava-lhe uma cacetada na cabeça, e, enquanto desmaiada, a
futura esposa era arrastada para a caverna do felizardo. Dizem que pancada de
amor não dói, mas esse arriscado ato amoroso devia doer muito! E algum
desastrado podia apagar para sempre sua preciosa presa.
Um jeito mais ameno de conquistar a esposa, como se conta, era agarrá-la e
conduzi-la carregada para o lar do novo casal. Dizem que, se ela conseguisse
escapar-se das mãos do caçador, ficaria livre daquele pretendente; caso, porém,
fosse transportada até a caverna, estaria condenada a amá-lo e respeitá-lo até
que a morte os separasse, sem a mínima chance de divórcio.
A mulher, que já devia estar começando a criar seus truques de sedução,
certamente dava uma forcinha quando se via espreitada por um bonitão. Devia se
separar propositalmente do grupo a fim de ser pega por aquele que a pudesse
fazer feliz. Mulher nunca foi boba nada!
Houve, também, entre determinado povo, certo costume de os dois fugirem e a
família da moça montar uma falsa perseguição ao casal, apenas como um ritual,
sem a verdadeira intenção de capturar os aventureiros do amor. Durante toda uma
revolução lunar, os jovens, em lugar isolado, passavam, como popularmente se
diz, só pensando “naquilo” e tomando chá afrodisíaco à base de mel, donde surgiu
o termo “lua-de-mel”.
Com o desenvolvimento de uma forma de relações mais amistosas entre as tribos,
veio aquela fase em que o que valia era o pai da moça gostar do rapaz. Bem
estranho para as meninas de hoje; não é? O patriarca escolhia quem merecia ser
seu genro, e azar da filha! A Bíblia relata que Jeová, o criador de todas as
coisas, proibiu seu povo eleito, os hebreus, de dar suas filhas aos filhos de
determinados povos e de tomar as filhas desses povos em casamento. Entre os
próprios hebreus havia também o sistema de compra da noiva, como no caso do
Jacó, que foi meio jacu, deixando-se ser enganado pelo Labão, que lhe empurrou a
filha mais feia e, para ter a mais bela, o moço teve que trabalhar mais sete
anos para o sogro, totalizando quatorze longos anos da sua vida. O amor é
paciente mesmo!
Mas a mulher não concordou em ficar para sempre nessa condição de coisa não.
Lutou para valorizar-se. Ser caçada! Ser comprada! Ser dada! Isso era bem
humilhante. Era uma injustiça. A mulher batalhou para se igualar ao homem, ter o
direito de escolher seu par. Como o Deus de Israel era bem machista, permitiu ao
seu povo que aquele que achasse alguma coisa indecente em sua esposa desse-lhe
carta de divórcio. A coitada, todavia, nada podia fazer se seu marido fosse um
nojento, fedorento, chato ou tivesse qualquer tipo de indecência. Os homens
podiam ter mais de uma esposa, o que estava fora de cogitação para a mulher.
Em uma época já de muito progresso feminino, o futuro noivo já tinha que fazer
um pedido ao candidato a sogro, dependendo, ainda, de aceitação da pretendida.
Já era um grande avanço! Já estávamos na era em que o rapaz ficava conversando
longa e pacientemente com o velho, enquanto a jovem o apreciava pelo buraco da
fechadura, avaliando o material e, depois, discretamente levava-lhes um
cafezinho e dizia aquele respeitoso “bom dia”, ou “boa noite”.
Passada a fase do buraco, a aproximação do casal veio se tornando mais fácil.
Algumas já podiam sentar-se no mesmo banco em que estivesse o rapaz. Progredindo
um pouco mais, passou-se a aceitar darem-se as mãos e, paulatinamente, foi-se
dando, até chegar ao estágio que se vê hoje: “no limits”, como por toda parte se
adora falar inglês.
Não obstante estarmos na era da liberação geral, muitos ainda mantêm aquela
ideologia de que o homem é o conquistador, e a mulher deve ser conquistada, mas
com largas possibilidades de dar uma ajudinha, com muita liberdade de executar
todo seu jogo de sedução. Algumas, porém, já acham muito antiquada essa idéia de
conquistador e conquistada, tendo a mulher o mesmo direito de lançar-se na
conquista de seu par, ficando assim mais equiparados ambos os sexos. E isso não
é ruim; mormente quando o homem é bem tímido, evitando-se que a falta de
coragem masculina seja prejudicial também à mulher que está a fim de ser amada.
Pensando bem, neste pormenor também o nosso mundo tem melhorado bastante. Ao
invés de nos arriscarmos à periculosidade das tais pancadas de amor dos
trogloditas, ou mesmo termos que correr como cavalos para tomar violentamente as
nossas companheiras, temos até a oportunidade de sermos caçados, e sem a
violência que tinham os nossos ancestrais remotos que empregar na caça à mulher.
Ademais, as experiências malsucedidas não mais precisam eternizar-se, havendo,
para ambos, uma saída para se remediar o engano, podendo ocorrer mesmo ensaios
pré-nupciais, que possibilitam uma escolha mais segura daquela companhia tão
importante. Viva a liberdade!
(Histórias, Estórias, etc.)