DEUS POR TODA PARTE
Wagner Gutierrez Barreira
"Ao redor de uma fogueira, milhares de anos atrás, no
tempo ocioso que separava o fim das tarefas diárias da
hora de repousar, os nossos antepassados começaram a
contar histórias. Com elas, tentavam encontrar respostas
para as coisas que não compreendiam. O por quê de
existir o Sol, a Lua e as estrelas que surgem e somem no
céu. Quem comandava os raios e tempestades? O que
acontece depois que morremos? Como tudo isso ao meu
redor foi criado? E o mais inquietante: “Por que estou
aqui?”
A base da mitologia é o esforço permanente e contínuo de
entender o mundo e o próprio homem. Histórias
maravilhosas passaram de geração a geração e, à medida
que foram contadas e re-contadas, tornaram-se mais
magníficas, ganharam também mais personagens e
variantes. Explicações para fenômenos físicos adquiriram
uma dimensão sublime.
Não existe nenhum grupo cultural ou étnico na Terra que
não associe a origem do universo (mundo), dos seres
humanos, da fauna e da flora, dos acidentes geográficos
a uma força superior, “sobre-humana”. Deuses e heróis
convivem com a humanidade desde a aurora de nossa
espécie. E essas histórias, que não têm autores, ainda
continuam a nos encantar.
Os mitos afiavam o pensamento abstrato, estavam
presentes e alimentavam o cotidiano do homem. Por que
fazer um ritual de sepultamento ao invés de abandonar o
corpo para os animais comerem? Na Espanha, homens
primitivos pintavam suas caçadas nas cavernas. Na
África, estatuetas representavam mulheres de nádegas e
seios fartos.
Para muitos arqueólogos e antropólogos, as pinturas
evocavam o sagrado em busca de melhor sorte e proteção
na próxima caçada. A estatueta é o símbolo da “Mãe
Terra”, uma deusa da fertilidade e, para muitas
culturas, a força motriz que deu origem ao mundo.
Povos de todo o planeta forjam seus heróis e deuses de
acordo com aquilo que têm à mão. Os nórdicos do norte da
Europa achavam que o mundo começara no embate, em um
grande campo de gelo, entre o “calor” e o “frio”. Para
os gregos, os deuses viviam em uma montanha, assim como
para os indianos.
Os habitantes do oeste da África imaginavam que a origem
do mundo era um grande “ovo cósmico” (assim como os
chineses). O homem pré colombiano nascera do milho, já
em outras culturas ele veio da argila, do barro, da
madeira, ou do sopro divino. Em muitas das crenças, fora
difícil chegar à humanidade, e os deuses criavam e
destruíam vários protótipos. Ao mesmo tempo, os
personagens mitológicos lidam com sentimentos humanos
como: a raiva, a vergonha, o ciúme, a culpa. (sejam
deuses, sejam heróis ou mortais).
Não foi por acaso que a psicologia e a psicanálise foram
buscar em histórias ancestrais, os exemplos para suas
hipóteses. O suíço Carl Gustav Jung defendia a
existência do “Inconsciente Coletivo” (uma grande
herança de imagens e símbolos que cada um de nós
carrega, tal como um DNA). O próprio Freud (Fróid) usou
o mito de Édipo como motivo em seus textos. Aliás, não
podemos nos esquecer, que as relações incestuosas são
abundantes na mitologia e a destruição do pai pelo
filho, um tema recorrente.
A relação com os deuses em geral é bem complicada para
nós humanos. Eles são seres superiores que ajudam os
homens, lhes dão a luz do Sol, conhecimento e sabedoria.
Mas também têm uma cólera divina, exemplificadas nas
histórias de dilúvios e inundações da África, Oriente
Médio, nas Américas, no sul e leste da Ásia e na Europa.
Punições aos homens são freqüentes, e muitas delas
projetam o fim dos tempos, das narrativas Astecas às
indianas, cada uma à sua maneira."
(Fonte, O Livro das Mitologias, Superinteressante
Especial, ed. 280-A/julho 2010).
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