EDUCAÇÃO E CIÊNCIA PODE SALVAR O BRASIL
Lula: Educação e ciência para reconstruir o Brasil
Exemplo chinês pode alavancar tecnologia e pesquisa e fortalecer a indústria,
afirma Lula em artigo conjunto com o ex-ministro de Ciência & Tecnologia Sergio
Machado Rezende, na Folha de S. Paulo
03/01/2022 22h32 - atualizado em 04/01/2022 16h08
Ricardo Stuckert
Nenhum país conseguiu se desenvolver plenamente sem implantar políticas de
Estado para educação e para ciência e tecnologia (C&T). A educação é porta
de acesso a empregos de melhor qualidade e com maior remuneração, amplia
oportunidades e possibilita um desenvolvimento econômico mais equânime.
O domínio em larga escala de C&T é condição necessária para tornar as empresas
competitivas globalmente, aumentar a riqueza e fortalecer a soberania das
nações.
O exemplo recente mais notável de país que usou educação e C&T para mudar o rumo
de sua história é o da China. Na virada do século, o país investia US$ 40
bilhões em C&T, enquanto os investimentos nos Estados Unidos eram de US$ 300
bilhões. A China implantou uma política de Estado para desenvolver a ciência, no
âmbito de um superministério, e hoje investe mais de US$ 400 bilhões em C&T. Não
foi por acaso que, como noticiado pela Folha em 26 de dezembro, a produção
científica chinesa em 2021 ultrapassou a norte-americana, que há décadas tem
sido a maior do mundo.
Como resultado desse esforço, além de ampliar a produção de commodities
beneficiadas, a China desenvolveu um parque industrial extenso e competitivo,
com programas de interação com o sistema de pesquisa. Exemplo bem conhecido é o
da tecnologia 5G para comunicação digital, que ela desenvolveu antes das
potências industriais. Dessa forma, o PIB do país, que na virada do século era
de US$ 1,2 trilhão, o sexto do mundo, hoje passa de US$ 15 trilhões, só atrás
dos EUA.
Em 2020 a China anunciou 22 iniciativas estratégicas em C&T para sua
modernização até 2050. Curiosamente, dentre elas há nove áreas
estratégicas do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação (PACTI), que
executamos no Brasil entre 2007 e 2010: biotecnologia,
nanotecnologia, tecnologias da informação, insumos para saúde, energias limpas,
biodiversidade, mudanças climáticas, programa espacial, defesa nacional e
segurança pública.
Estes eram os elementos de uma das quatro prioridades do plano, às quais se
somavam: expansão e consolidação do sistema nacional de ciência, tecnologia e
inovação, promoção da inovação tecnológica nas empresas e C&T para o
desenvolvimento social. Para financiar os 87 programas do PACTI, foi essencial
aplicar, sem contingenciamentos, os recursos do Fundo de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico, formado por receitas de empresas de diversos setores,
o que permitiu um investimento de cerca de R$ 65 bilhões em valores de hoje.
Nos anos recentes, tem havido um retrocesso sem precedentes nas políticas de C&T
no país. O desmonte das instituições públicas, na
direção do Estado mínimo, é a marca de um governo que aprofunda a
agenda neoliberal e um ajuste fiscal irrealista. Vamos na
direção oposta da China e de outros países.
Ultrapassando as piores previsões, caminhamos rumo ao obscurantismo, sob um
governo que nega a ciência em cada um de seus atos.
O descaso intencional e criminoso com a saúde pública é a face mais visível e
cruel dessa aversão ao conhecimento, que já resultou na perda de quase 620 mil
vidas para a Covid-19. Felizmente, testemunhamos o enorme esforço da comunidade
científica brasileira e seu compromisso com a vida, na busca de soluções para a
gravíssima crise sanitária. E testemunhamos a rápida resposta do SUS, que
sobreviveu às tentativas de desmonte, e de seus valorosos profissionais na linha
de frente contra a pandemia.
O próximo governo terá o enorme desafio de retomar o crescimento econômico,
criar empregos, superar a pobreza e reduzir a desigualdade. Certamente contará
com o empenho de nossa comunidade científica, que fez o Brasil se tornar o 13º
maior produtor mundial de ciência, como também informou a Folha. Será
fundamental restabelecer uma política e um plano de ciência, tecnologia e
informação, recuperar as agências federais e prover orçamentos adequados, em
esforço conjunto do Estado e das empresas.
O exemplo de outros países, nossos próprios avanços e o amargo retrocesso que
sofremos não deixam dúvidas: educação e ciência são essenciais para a
reconstrução e o futuro do Brasil.
Luiz Inácio Lula da Silva
Ex-presidente da República (2003-2010) e presidente de honra do PT
Sergio Machado Rezende
Doutor em engenharia eletrônica e ciência dos materiais, é professor da
Universidade Federal de Pernambuco e ex-ministro da Ciência e Tecnologia
(2005-10)
Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo.
<https://pt.org.br/lula-educacao-e-ciencia-para-reconstruir-o-brasil/>
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