ENSINO RELIGIOSO IMPOSTO É CRITICADO
ONU critica imposição
de ensino religioso em escolas públicas
Além de desrespeito à laicidade do Estado brasileiro,
relatora denuncia 'intolerância e racismo'
28 de maio de 2011 | 0h 00
Jamil Chade - O Estado de S.Paulo
Centenas de escolas públicas em pelo menos 11 Estados do Brasil não seguem os
preceitos do caráter laico do Estado e impõem o ensino religioso, alerta a
Organização das Nações Unidas. Em relatório a ser apresentado na semana que vem
ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, a situação do Brasil é criticada.
O documento foi preparado pela relatora da ONU para o direito à cultura, Farida
Shaheed, que também alerta que intolerância religiosa e racismo "persistem"
na sociedade brasileira. A relatora apela por uma posição mais forte por
parte do governo para frear ataques realizados por "seguidores de religiões
pentecostais" contra praticantes de religiões afro-brasileiras no País. Uma
das maiores preocupações é o com o ensino religioso, assunto que pôs Vaticano e
governo em descompasso diplomático.
Os Estados citados por Farida, que visitou o País no final do ano passado, são
Alagoas, Amapá, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná,
Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
A relatora diz ter recolhido pedidos para que o material usado em aulas de
religião nas escolas públicas seja submetido a uma revisão por especialistas,
como no caso de outros materiais de ensino. Além disso, "recursos de um
Estado laico não devem ser usados para comprar livros religiosos para escolas",
esclarece.
Para Farida, "deixar o conteúdo de cursos religiosos ser determinado pelo
sistema de crença pessoal de professores ou administradores de escolas, usar o
ensino religioso como proselitismo, ensino religioso
compulsório e excluir religiões de origem africana do curriculum foram
relatados como principais preocupações que impedem a implementação efetiva do
que é previsto na Constituição".
Legislação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação diz que o ensino religioso
deve ser oferecido em todas as escolas públicas de ensino fundamental, mas a
matrícula é facultativa. A definição do conteúdo é feita pelos Estado e
municípios, mas a legislação afirma que o conteúdo deve assegurar o respeito
à diversidade cultural religiosa e proíbe qualquer forma de proselitismo.
"Em tese, deveria haver um professor capaz de representar todas as religiões.
Mas, como sabemos, é impossível", explica Roseli Fischmann, da Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo (USP). "Além disso,
a aula não é tratada efetivamente como facultativa. O arranjo é feito de tal
forma que o aluno é obrigado a assistir."
Roseli explica que o modelo brasileiro é pouco usual nos países em que há total
separação entre Estado e religião. "Até Portugal, que no regime de Salazar
tornou obrigatório o ensino religioso, aboliu as aulas. Educação religiosa
deve ser restrita aos colégios confessionais. Lá, o pai matricula consciente."
/ COLABOROU OCIMARA BALMANT
http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110528/not_imp724971,0.php