Há alguns
meses, os
dirigentes
da Igreja
Universal do
Reino de
Deus são
denunciados
nas Justiças
do Brasil e
dos Estados
Unidos,
acusados de
crimes
financeiros.
Na semana
passada,
o presidente
do Tribunal
de Justiça
de São Paulo,
desembargador
Antonio
Carlos Viana
Santos,
decidiu que
provas
enviadas por
promotores
americanos
para o
Ministério
Público de
São Paulo
devem ser
desconsideradas
em um
processo
contra
dirigentes
da
Universal,
em que eles
são acusados
de lavagem
de dinheiro
e formação
de quadrilha.
Os documentos
tratam de movimentações bancárias de duas
empresas sediadas em paraísos fiscais:
Investholding Limited, nas Ilhas Cayman, e
Cableinvest, nas Ilhas Jersey. De acordo com as
investigações, essas
duas empresas teriam sido criadas pela Universal
para lavar dinheiro doado por fiéis e desviá-lo
para a compra de empresas de comunicação.
Para o desembargador, todas
essas descobertas
devem ser descartadas porque
os promotores
teriam atropelado formalidades processuais ao
pedir informações protegidas pelo sigilo
bancário aos colegas americanos sem antes obter
uma autorização de um juiz brasileiro. Na
decisão, Viana Santos considera “imprestável
como prova documentação de natureza bancária,
ainda que conseguida por meio de cooperação
internacional, que não observe as formalidades
da lei nacional para sua obtenção”.
A decisão de
Viana Santos causou forte reação no Ministério
Público. Um dos autores do pedido de
colaboração, o promotor Saad Mazloum, nega
irregularidades e diz que a decisão do
desembargador é inusitada. “É a primeira vez que
acontece algo assim no Brasil. Não houve
determinação minha de quebra de sigilo bancário.
Quando eu peço documentos aos Estados Unidos,
é a autoridade de lá que verifica que tipo de
documento estou pedindo. Se o documento precisar
de autorização judicial, eles vão pedir
autorização para o juiz de lá. Não estou
determinando nada, não tenho esse poder. Eu
estou pleiteando. E o inverso também acontece:
quando investigadores americanos pedem dados
sigilosos de contas no Brasil, é a Justiça
brasileira que decide pela quebra do sigilo”,
disse Mazloum. “Eu agi de acordo com o
tratado de assistência legal mútua que prevê o
auxílio direto por parte do Ministério Público
junto a autoridades estrangeiras.”
O acordo de
cooperação internacional a que Mazloum se
refere, assinado entre Brasil e EUA em 2001,
determina que provas podem ser requeridas
diretamente por procuradores e promotores dos
dois países, sem necessidade de intermediação do
Ministério da Justiça ou do Itamaraty. Mazloum
diz que centenas de documentos sigilosos obtidos
por meio da cooperação serão anulados se a
decisão de Viana Santos prevalecer. O
procurador-geral de Justiça de São Paulo,
Fernando Grella Vieira, vai recorrer ao Superior
Tribunal de Justiça (STJ) para tentar reverter a
anulação das provas. O STJ já julgou um caso
semelhante. Em 2008, a ministra Laurita Vaz
considerou que promotores paulistas que
investigavam Eduardo Bittencourt, do Tribunal de
Contas do Estado, não precisavam de autorização
judicial para pedir documentos bancários do
investigado que estavam nos EUA. Para o
advogado da Igreja Universal, Antonio Sergio de
Moraes Pitombo, a anulação das provas será
mantida. “Houve erro primário do promotor. Foi
feita uma quebra de sigilo bancário sem
autorização judicial. O tratado internacional
não pode desrespeitar a lei brasileira.”
A controversa
anulação das provas obtidas no exterior não foi
a única citação da igreja no noticiário criminal
da semana passada. No dia 24, o jornal Folha de
S. Paulo informou que dois doleiros brasileiros,
Marcelo Birmarcker e Cristina Marini
Rodrigues, sócios da casa de câmbio Diskline,
deram um importante depoimento contra a
Universal a promotores americanos. Eles
confessaram que, entre 1995 e 2001, enviaram
R$ 420 milhões do Brasil para Nova York de forma
ilegal. Tudo a serviço da Igreja
Universal, liderada por Edir Macedo. Segundo
o jornal, seriam remessas de aproximadamente R$
5 milhões por mês. Os doleiros se beneficiam de
um acordo de delação premiada. Em troca da
redução de suas penas, oferecem informações que
podem ajudar a investigação.
Segundo os
doleiros, emissários da Universal no Rio de
Janeiro e em São Paulo entregavam malotes de
dinheiro para a Diskline. Os valores eram
depositados no Brasil, e os doleiros então
geravam créditos de dólar equivalentes no
Merchants Bank de Nova York. Lá, uma mulher
chamada Regina da Silva era a responsável por
movimentação em nome da igreja. Regina responde
a processo aberto pela promotoria de Nova York
pela acusação de simular assembleias em duas
igrejas da Universal nos EUA para levantar
empréstimos. Os doleiros da Diskline teriam
operado três contas no Merchants Bank, nas quais
teria passado dinheiro sem origem da Universal."
(Época, 30/08/2010, págs. 102, 103).