LEI DOS SEXAGENÁRIOS
A Lei dos Sexagenários (LEI Nº 3.270, DE 28 DE SETEMBRO DE 1885), também
conhecida como Lei Sararaiva-Cotegipe, concedia liberdade aos escravos
com mais de 60 anos de idade.
Leia o texto original:
“Regula a extincção gradual do elemento servil.
D. Pedro II, por Graça de Deus e Unânime Acclamação dos Povos, Imperador
Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os Nossos
subditos que a Assembléa Geral Decretou e Nós Queremos a Lei seguinte:
DA MATRICULA
Art. 1º Proceder-se-ha em todo o Imperrio a nova matricula dos escravos, com
declaração do nome, nacionalidade, sexo, filiação, si fôr conhecida, occupação
ou serviço em que fôr empregado, idade e valor, calculado conforme a tabella do
§ 3º.
§ 1º A inscripção para a nova matricula far-se-ha á vista das relações que
serviram de base á matricula especial ou averbação effectuada em virtude da Lei
de 28 de Setembro de 1871, ou á vista das certidões da mesma matricula, ou da
averbação, ou á vista do titulo do dominio, quando nelle estiver exarada a
matricula do escravo.
§ 2º A’ idade declarada na antiga matricula se addicionará o tempo decorrido até
o dia em que fôr apresentada na Repartição competente a relação para a matricula
ordenada por esta Lei.
A matricula que fôr effectuada em contravenção ás disposições dos §§ 1º e 2º
será nulla, e o Collector ou Agente fiscal que a effectuar incorrerá em uma
multa de cem mil réis a tresentos mil réis, sem prejuizo de outras penas em que
possa incorrer.
§ 3º O valor a que se refere o art. 1º será declarado pelo senhor do escravo,
não excedendo o Maximo regulado pela idade do matriculando, conforme a seguinte
tabella:
Escravos menores de 30 annos ……………………………………………………………… 900$000
» de 30 a 40 » ………………………………………………………………………………… 800$000
» » 40 a 50 » ………………………………………………………………………………… 600$000
» » 50 a 55 » ………………………………………………………………………………… 400$000
» » 55 a 60 » ………………………………………………………………………………… 200$000
§ 4º O valor dos individuos do sexo feminino se regulará do mesmo modo,
fazendo-se, porém, o abatimento de 25% sobre os preços acima estabelecidos.
§ 5º Não serão dados á matricula os escravos de 60 annos de idade em diante;
serão, porém, inscriptos em arrolamento especial para os fins dos §§ 10 a 12 do
art. 3º.
§ 6º Será de um anno o prazo concedido para a matricula, devendo ser este
annunciado por editaes affixados nos logares mais publicos com antecedencia de
90 dias, e publicos pela imprensa, onde a houver.
§ 7º Serão considerados libertos os escravos que no prazo marcado não tiverem
sido dados á matricula, e esta clausula será expressa e integralmente declarada
nos editaes e nos annuncios pela imprensa.
Serão isentos de prestação de serviços os escravos de 60 a 65 annos que não
tiverem sido arrolados.
§ 8º As pessoas a quem incumbe a obrigação de dar á matricula escravos alheios,
na fórma do art. 3º do Decreto n. 4835 de 1 de Dezembro de 1871, indemnizarão
aos respectivos senhores o valor do escravo que, por não ter sido matriculado no
devido prazo, ficar livre.
Ao credor hypothecario ou pignoraticio cabe igualmente dar á matricula os
escravos constituidos em garantia.
Os Collectores e mais Agentes fiscaes serão obrigados a dar recibo dos
documentos que lhes forem entregues para a inscripção da nova matricula, e os
que deixarem de effectual-a no prazo legal incorrerão nas penas do art. 154 do
Codigo Criminal, ficando salvo aos senhores o direito de requerer de novo a
matricula, a qual, para os effeitos legaes, vigorará como si tivesse sido
effectuada no tempo designado.
§ 9º Pela inscripção ou arrolamento de cada escravo pagar-se-ha 1$ de
emolumentos, cuja importancia será destinada ao fundo de emancipação, depois de
satisfeitas as despezas da matricula.
§ 10. Logo que fôr annunciado o prazo para a matricula, ficarão relevadas as
multas incorridas por inobservancia das disposições da Lei de 28 de Setembro de
1871, relativas á matricula e declarações prescriptas por ella e pelos
respectivos regulamentos.
A quem libertar ou tiver libertado, a titulo gratuito, algum escravo, fica
remittida qualquer divida á Fazenda Publica por impostos referentes ao mesmo
escravo.
O Governo no Regulamento que expedir para execução desta Lei, marcará um só e o
mesmo prazo para a apuração da matricula em todo o Imperio.
Art. 2º O fundo de emancipação será formado:
I. Das taxas e rendas para elle destinadas na legislação vigente.
II. Da taxa de 5% addicionaes a todos os impostos geraes, excepto os de
exportação.
Esta taxa será cobrada desde já livre de despezas de arrecadação, e annualmente
inscripta no orçamento da receita apresentado á Assembléa Geral Legislativa pelo
Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Fazenda.
III. De titulos da divida publica emittidos a 5%, com amortização annual de 1/2
%, sendo os juros e amortização pagos pela referida taxa de 5%.
§ 1º A taxa addicional será arrecadada ainda depois da libertação de todos os
escravos e até se extinguir a divida proveniente da emissão dos titulos
autorizados por esta Lei.
§ 2º O fundo de emancipação, de que trata o n. I deste artigo, continuará a ser
applicado de conformidade ao disposto no art. 27 do Regulamento approvado pelo
Decreto n. 5135 de 13 de Novembro de 1872.
§ 3º O producto da taxa addicional será dividido em tres partes iguaes:
A 1ª parte será applicada á emancipação dos escravos de maior idade, conforme o
que fôr estabelecido em regulamento do Governo.
A 2ª parte será applicada á libertação por metade ou menos de metade de seu
valor, dos escravos de lavoura e mineração cujos senhores quizerem converter em
livres os estabelecimentos mantidos por escravos.
A 3ª parte será destinada a subvencionar a colonização por meio do pagamento de
transporte de colonos que forem effectivamente collocados em estabelecimentos
agricolas de qualquer natureza.
§ 4º Para desenvolver os recursos empregados na transformação dos
estabelecimentos agricolas servidos por escravos em estabelecimentos livres e
para auxiliar o desenvolvimento da colonização agricola, poderá o Governo
emittir os titulos de que trata o n. 3 deste artigo.
Os juros e amortização desses titulos não poderão absorver mais dos dous terços
do producto da taxa addicional consignada no n. 2 do mesmo artigo.
DAS ALFORRIAS E DOS LIBERTOS
Art. 3º Os escravos inscriptos na matricula serão libertados mediante
indemnização de seu valor pelo fundo de emancipação ou por qualquer outra fórma
legal.
§ 1º Do valor primitivo com que fôr matriculado o escravo se deduzirão:
No primeiro anno………………………………………………………………………………………… 2%
No segundo…………………………………………………………………………………………….. 3%
No terceiro………………………………………………………………………………………………. 4%
No quarto…………………………………………………………………………………………….. 5%
No quinto……………………………………………………………………………………………….. 6%
No sexto……………………………………………………………………………………………….. 7%
No setimo……………………………………………………………………………………………….. 8%
No oitavo…………………………………………………………………………………………….. 9%
No nono…………………………………………………………………………………………………… 10%
No decimo………………………………………………………………………………………………. 10%
No undecimo…………………………………………………………………………………… 12%
No decimo segundo……………………………………………………………………………………. 12%
No decimo terceiro……………………………………………………………………………………. 12%
Contar-se-ha para esta deducção annual qualquer prazo decorrido, seja feita a
libertação pelo fundo de emancipação ou por qualquer outra fórma legal.
§ 2º Não será libertado pelo fundo de emancipação o escravo invalido,
considerado incapaz de qualquer serviço pela Junta classificadora, com recurso
voluntario para o Juiz de Direito.
O escravo assim considerado permanecerá na companhia de seu senhor.
§ 3º Os escravos empregados nos estabelecimentos agricolas serão libertados pelo
fundo de emancipação indicado no art. 2º, § 4º, segunda parte, si seus senhores
se propuzerem a substituir nos mesmos estabelecimentos o trabalho escravo pelo
trabalho livre, observadas as seguintes disposições:
a) Libertação de todos os escravos existentes nos mesmos estabelecimentos e
obrigação de não admittir outros, sob pena de serem estes declarados libertos;
b) Indemnização pelo Estado de metade do valor dos escravos assim libertados, em
titulos de 5%, preferidos os senhores que reduzirem mais a indemnização;
c) Usufruição dos serviços dos libertos por tempo de cinco annos.
§ 4º Os libertos obrigados a serviço nos termos do paragrapho anterior, serão
alimentados, vestidos e tratados pelos seus ex-senhores, e gozarão de uma
gratificação pecuniaria por dia de serviço, que será arbitrada pelo ex-senhor
com approvação do Juiz de Orphãos.
§ 5º Esta gratificação, que constituirá peculio do liberto, será dividida em
duas partes, sendo uma disponivel desde logo, e outra recolhida a uma Caixa
Economia ou Collectoria, para lhe ser entregue, terminado o prazo da prestação
dos serviços a que se refere o § 3º, ultima parte.
§ 6º As libertações pelo peculio serão concedidas em vista das certidões do
valor do escravo, apurado na fórma do art. 3º, § 1º, e da certidão do deposito
desse valor nas estações fiscaes designadas pelo Governo.
Essas certidões serão passadas gratuitamente.
§ 7º Emquanto se não encerrar a nova matricula, continuará em vigor o processo
actual de avaliação dos escravos, para os diversos meios de libertação, com o
limite fixado no art. 1º, § 3º.
§ 8º São válidas as alforrias concedidas, ainda que o seu valor exceda ao da
terça do outorgante e sejam ou não necessarios os herdeiros que porventura
tiver.
§ 9º E’ permittida a liberalidade directa de terceiro para a alforria do
escravo, uma vez que se exhiba preço deste.
§ 10. São libertos os escravos de 60 annos de idade, completos antes e depois da
data em que entrar em execução esta Lei; ficando, porém, obrigados, a titulo de
indemnização pela sua alforria, a prestar serviços a seus ex-senhores pelo
espaço de tres annos.
§ 11. Os que forem maiores de 60 e menores de 65 annos, logo que completarem
esta idade, não serão sujeitos aos alludidos serviços, qualquer que seja o tempo
que os tenham prestado com relação ao prazo acima declarado.
§ 12. E’ permittida a remissão dos mesmos serviços, mediante o valor não
excedente á metade do valor arbitrado para os escravos da classe de 55 a 60
annos de idade.
§ 13. Todos os libertos maiores de 60 annos, preenchido o tempo de serviço de
que trata o § 10, continuarão em companhia de seus ex-senhores, que serão
obrigados a alimental-os, vestil-os, e tratal-os em suas molestias, usufruindo
os serviços compativeis com as forças delles, salvo si preferirem obter em outra
parte os meios de subsistencia, e os Juizes de Orphãos os julgarem capazes de o
fazer.
§ 14. E’ domicilio obrigado por tempo de cinco annos, contados da data da
libertação do liberto pelo fundo de emancipação, o municipio onde tiver sido
alforriado, excepto o das capitaes.
§ 15. O que se ausentar de seu domicilio será considerado vagabundo e
apprehendido pela Policia para ser empregado em trabalhos publicos ou colonias
agricolas.
§ 16. O Juiz de Orphãos poderá permittir a mudança do liberto no caso de
molestia ou por outro motivo attendivel, si o mesmo liberto tiver bom
procedimento e declarar o logar para onde pretende transferir seu domicilio.
§ 17. Qualquer liberto encontrado sem occupação será obrigado a empregar-se ou a
contratar seus serviços no prazo que lhe fôr marcado pela Policia.
§ 18. Terminado o prazo, sem que o liberto mostre ter cumprido a determinação da
Policia, será por esta enviado ao Juiz de Orphãos, que o constrangerá a celebrar
contrato de locação de serviços, sob pena de 15 dias de prisão com trabalho e de
ser enviado para alguma colonia agricola no caso de reincidencia.
§ 19. O domicilio do escravo é intransferivel para Provincia diversa da em que
estiver matriculado ao tempo de promulgação desta Lei.
A mudança importará acquisição da liberdade, excepto nos seguintes casos:
1º Transferencia do escravo de um para outro estabelecimento do mesmo senhor.
2º Si o escravo tiver sido obtido por herança ou por adjudicação forçada em
outra Provincia.
3º Mudança de domicilio do senhor.
4º Evasão do escravo.
§ 20. O escravo evadido da casa do senhor ou d’onde estiver empregado não
poderá, emquanto estiver ausente, ser alforriado pelo fundo de emancipação.
§ 21. A obrigação de prestação de serviços de escravos, de que trata o § 3º
deste artigo, ou como condição de liberdade, não vigorará por tempo maior do que
aquelle em que a escravidão fôr considerada extincta.
DISPOSIÇÕES GERAES
Art. 4º Nos regulamentos que expedir para execução desta Lei o Governo
determinará:
1º Os direitos e obrigações dos libertos a que se refere o § 3º do art. 3º para
com os seus ex-senhores e vice-versa.
2º Os direitos e obrigações dos demais libertos sujeitos á prestação de serviços
e daquelles a quem esses serviços devam ser prestados.
3º A intervenção dos Curados geraes por parte do escravo, quando este fôr
obrigado á prestação de serviços, e as attribuições dos Juizes de Direito,
Juizes Municipaes e de Orphãos e Juizes de Paz nos casos de que trata a presente
Lei.
§ 1º A infracção das obrigações a que se referem os ns. 1 e 2 deste artigo será
punida conforme a sua gravidade, com multa de 200$ ou prisão com trabalho até 30
dias.
§ 2º São competentes para a imposição dessas penas os Juizes de Paz dos
respectivos districtos, sendo o processo o do Decreto n. 4824 de 29 de Novembro
de 1871, art. 45 e seus paragraphos.
§ 3º O acoutamento de escravos será capitulado no art. 260 do Codigo Criminal.
§ 4º O direito dos senhores de escravos á prestação de serviços dos ingenuos ou
á indemnização em titulos de renda, na fórma do art. 1º, § 1º, da lei de 28 de
Setembro de 1871, cessará com a extincção da escravidão.
§ 5º O Governo estabelecerá em diversos pontos do Imperio ou nas Provincias
fronteiras colonias agricolas, regidas com disciplina militar, para as quaes
serão enviados os libertos sem occupação.
§ 6º A occupação effectiva nos trabalhos da lavoura constituirá legitima isenção
do serviço militar.
§ 7º Nenhuma Provincia, nem mesmo as que gozarem de tarifa especial, ficará
isenta do pagamento do imposto addicional de que trata o art. 2º.
§ 8º Os regulamentos que forem expedidos pelo Governo serão logo postos em
execução e sujeitos á approvação do Poder Legislativo, consolidadas todas as
disposições relativas ao elemento servil constantes da Lei de 28 de Setembro de
1871 e respectivos Regulamentos que não forem revogados.
Art. 5º Ficam revogadas as disposições em contrario.
Mandamos, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da
referida Lei pertencer, que a cumpram, e façam cumprir e guardar tão
inteiramente, como nella se contém. O Secretario de Estado dos Negocios da
Agricultura, Commercio e Obras Publicas a faça imprimir, publicar e correr.
Dada no Palacio do Rio de Janeiro aos 28 de Setembro de 1885, 64º da
Independencia e do Imperio.”
<https://blogdabn.wordpress.com/2016/09/28/fbn-i-historia-28-de-setembro-de-1885-promulgada-a-lei-dos-sexagenarios/>
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