LULA DOOU REFINARIA PARA A BOLÍVIA?
Estadão Verifica
Checagem de fatos e desmonte de boatos
Refinarias de gás na Bolívia foram vendidas, e não doadas por Lula
País vizinho pagou US$ 112 milhões para ter o controle de unidades que
pertenciam à Petrobras
Guilherme Bianchini, especial para o Estado
06 de outubro de 2020 | 19h34
Uma postagem viral no Facebook recicla um boato de que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria doado uma refinaria para a
Bolívia. A afirmação é falsa. Em 2006, o país vizinho assumiu o
controle de duas refinarias da Petrobras após decreto do recém-eleito presidente
Evo Morales, que nacionalizou toda a exploração de gás. Mas os
bolivianos pagaram US$ 112 milhões ao Brasil pela aquisição das unidades, após
negociações.
“O gás tá caro? Só pra lembrar que eu
doei a refinaria pra Bolívia e agora a gente paga uma fortuna pra comprar gás
deles”, afirma a publicação, com uma foto de Lula ao fundo. A alegação sobre o
custo do produto também é enganosa, pois o preço final ao consumidor do gás
liquefeito de petróleo (GLP) pouco tem a ver com a importação do gás natural — e
não sofreu nenhum reajuste significativo no período da venda da refinaria,
tampouco nos últimos anos.
“O custo fundamental do gás vem da
Petrobras, que faz a extração e transporta o produto até o limite dos Estados,
além de ser a responsável por cerca de 70% do gás do Brasil”, explica o
economista Darcio Martins, pesquisador do Insper. “A questão da Bolívia pode
afetar indiretamente, mas é um fator menos importante que a política de preços
da Petrobras”.
Ao comparar o valor nominal do botijão de gás de 13 kg antes, durante e depois
da venda das refinarias na Bolívia (de 2005 a 2007), é possível concluir que não
houve um aumento significativo, e sim um reajuste natural.
Em 2005, por exemplo, o preço final ao consumidor variou entre R$ 29,56 e R$
30,18, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP). No ano seguinte, o mínimo foi de R$ 30,38, com pico de R$
33,17. O teto em 2007 foi mais baixo, na casa dos R$ 33,10.
O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás)
disponibiliza em seu site informações sobre a composição do preço médio do
botijão de gás na atual década. As informações da página confirmam que,
atualmente, a fatia determinada pela Petrobras — cerca de 40% — é a mais
significativa do preço.
Estes são os fatores preponderantes no preço do botijão de gás, segundo o
Sindigás:
Petrobras
Tributos
Margem bruta e custos de distribuição
Margem e custos de revenda
Embora a publicação de setembro de 2020 dê a entender que houve um grande salto
recente no preço do gás, não há qualquer indício de reajustes significativos nos
últimos anos. Entre 2019 e 2020, o aumento nominal foi de 1,63%. No ciclo
anterior, houve queda de 0,35%. O último grande reajuste aconteceu em 2017,
quando o preço médio registrou uma alta de quase 20% — também puxada pela
Petrobras.
O gás natural boliviano foi tema de outro boato que circulou nas redes sociais
neste ano. Uma postagem viral atribuía ao governo de Jair Bolsonaro o suposto
fim da importação do produto, com o Brasil autossuficiente no recurso. A
informação é falsa, pois, apenas em 2020, o Brasil já importou 3,3 bilhões de
quilogramas líquidos do gás boliviano.
Este conteúdo também foi checado pela AFP Checamos.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que
circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens
potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria
com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é
enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social
e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou
compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem
quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico
anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação
da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão
Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de
verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de
princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e
imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e
organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e
honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão
no trabalho.
Estadão Verifica
18 de maio de 2020 | 16h46
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