MANIFESTAÇÃO NACIONAL PELO FORA BOLSONARO
Atos de 29 de maio abrem novo ciclo de lutas democráticas, avaliam cientistas
sociais
Sociólogos Juarez Guimarães, Eliara Santana e Leonardo Avritzer analisam os
impactos dos atos “Fora Bolsonaro”
Rafaella Dotta
Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
01 de Junho de 2021 às 11:26
“Com as manifestações, passamos a ter três polos: opinião pública, oposição
parlamentar e o ocupação das ruas” - Créditos da foto: @caiodcouto / Mídia NINJA
As manifestações de 29 de maio em todo o Brasil reacenderam chamas e debates.
Sob o lema “o governo é mais perigoso que o vírus”,
milhares de pessoas ocuparam as ruas para reivindicar vacinação ampla,
auxílio emergencial e o impeachment de Jair Bolsonaro. Os atos foram
um sucesso nas ruas e nas redes, mas o que dizem os cientistas sociais?
O Brasil de Fato MG ouviu a avaliação de três pesquisadores mineiros, das áreas
de comunicação e política, que analisam os atos e trazem novos elementos.
Conjuntura e novos ares
Antes de tudo, para o professor Juarez Guimarães, do Departamento de Ciência
Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as manifestações de 29
de maio devem ser consideradas junto a dois elementos: o profundo desgaste do
governo Bolsonaro e a anulação do processo que impedia o ex-presidente Lula de
ser candidato. “Penso que essas manifestações expressam a convergência desses
dois grandes fatos”, explica.
:: Artigo | Manifestações trouxeram de volta uma palavra que andava sumida:
impeachment ::
Juarez avalia que os atos dão uma nova legitimidade e força à CPI da covid, que
está sendo realizada pelo Senado. Mas numa leitura mais ampla, em sua opinião, o
29 de maio pode representar um marco.
“Um novo ciclo das lutas democráticas e populares no Brasil está ganhando corpo.
Se antes a resistência era uma forma de se proteger da destruição, agora é a
esperança da reconstrução e transformação do Brasil que puxam a própria
resistência”, analisa Juarez.
Bloco de forças para um impeachment
Leonardo Avritzer, pós-doutor pelo Massachusetts Institute of Technology e
professor titular da Departamento de Ciência Política da UFMG, também destaca a
importância dos atos na formação de um novo padrão de oposição ao governo
Bolsonaro. Se antes a oposição ao governo federal contava com a opinião pública
e a oposição parlamentar, adiciona-se a esse bloco a oposição popular.
:: Artigo | Trevisan: Adesão a protestos surpreende e pressiona por impeachment
::
“Com as manifestações, passamos a ter três polos reunidos: opinião pública,
oposição parlamentar e o polo da ocupação das ruas. A união desses três polos é
fundamental para colocar o governo na defensiva e tentar desencadear um processo
que possa botar fim a ele”, sentencia.
O número de manifestantes também seria um dado de credibilidade às
manifestações, destaca Avritzer, pois reuniram muito mais pessoas do que os
bolsonaristas conseguiram durante a pandemia, apesar destes terem feito diversos
atos.
Mídia comercial “silenciou” protestos
Se as fotos e vídeos das ações de 29 de maio tiveram grande repercussão nas
redes sociais, o mesmo não se pode dizer das capas de jornais e noticiários de
TV. A avaliação é de Eliara Santana, jornalista, doutora em Linguística e Língua
Portuguesa pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) e
podcaster do Boletim do JN.
“O evento foi absolutamente silenciado pela imprensa em todo o Brasil”, avalia.
“Os veículos não podiam simplesmente deixar de noticiar, pois era um evento
muito significativo, mas fizeram de uma forma protocolar. Para tirar a dimensão
expressiva que as manifestações de 29 de maio tiveram”.
:: Artigo | Dez pontos sobre as manifestações do 29M ::
A pesquisadora é enfática ao classificar a cobertura como um “silenciamento
intencional”, uma vez que seria simples verificar que o evento é noticiável.
“Num cenário gravíssimo de pandemia as pessoas saíram às ruas, eu estava lá, o
ato foi bonito, expressivo, todos de máscara, muitos jovens, muitas famílias.
Isso não é notícia?”, questiona.
A capa do jornal O Globo deve ficar para a história, sob a manchete “PIB
reaquece, e empresas desengavetam R$ 164 bilhões em projetos”, qualificada por
Eliara de uma “manchete ilusória”. Já o Jornal Nacional soltou uma reportagem
“burocrática, sem repórteres com a população, sem dimensionar as manifestações”,
relata Eliara.
Os maiores jornais comerciais mineiros seguiram a mesma tendência, segundo a
pesquisadora. “O jornal Estado de Minas trouxe uma manchete sobre igrejas
mineiras, uma pauta atemporal, que podia ter sido publicada em qualquer momento.
O jornal O Tempo foi na mesma linha e deu destaque ainda a uma ação do
Ministério da Saúde”, apontou.
:: Artigo | Milhares foram às ruas pelo "Fora, Bolsonaro", R$ 600 de auxílio e
vacina já ::
“É absurdo que a mídia corporativa brasileira ignore os protestos e que as capas
de jornais e a TV simulem um país fictício, como se tudo estivesse normal. Um
país sob um governo genocida e que foi eleito graças ao apoio e à ação dessa
mesma mídia”, finaliza Eliara Santana.
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