NÃO SOMOS TÃO
LIVRES COMO NOS PODE PARECER
"Não creio, no sentido filosófico do termo, na liberdade do
homem. Todos agem não apenas sob um constrangimento exterior mas também de
acordo com uma necessidade interior." (Albert Einstein)
O livro do Gênesis afirma que, por comer do fruto da árvore
da ciência do bem e do mal, o homem foi condenado ao trabalho. Isso é uma lenda,
todavia está bem próximo da realidade. A vida cheia de trabalho e preocupações
estressantes que levamos atualmente é na realidade derivada do desenvolvimento
do saber humano.
O evangelista Mateus afirma que Jesus, o
Cristo, disse estas palavras: “Olhai para as aves do céu, que não semeiam,
nem ceifam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não
valeis vós muito mais do que elas?” (Mateus, 6: 26) “E pelo que haveis de
vestir, por que andais ansiosos? Olhai para os lírios do campo, como crescem;
não trabalham nem fiam” (Mateus, 6: 28). As coisas, entretanto, não são
simples assim.
Vivíamos nas savanas, comendo os frutos que nos fornecia a
Natureza. Não plantávamos, e podíamos colher. Nossos corpos peludos nos
abrigavam do frio e nos deixavam menos vulneráveis aos espinhos.
Entretanto, nosso ambiente não era um verdadeiro Éden, sem nenhum problema.
Tínhamos que disputar as dádivas da Natureza com outros seres mais bem dotados
fisicamente e donos de armas naturais eficientes para nos manter à distância.
Se nos descuidássemos, virávamos alimento.
Diante dos obstáculos com que deparávamos em nosso paraíso,
engenhosos que somos, elaboramos artifícios capazes de superar os dentes e
garras dos felinos, os chifres dos bovinos, os venenos das serpentes e,
finalmente, até as asas das aves e os olhos da água. E, enfim, vencemos,
podemos dizer. Entretanto, nossa ciência e nossa arte nos têm um custo, não
muito baixo.
Para minimizar nossa vulnerabilidade aos espinhos
e às garras e dentes dos nossos poderosos conterrâneos, começamos a envolver
nossos corpos com couro das nossas vítimas, e isso foi muito bom, até certo
ponto; porém, como efeito colateral, nossas pele protegida ficou muito mais fina
e macia, conseqüentemente muito fácil de ser furada e dilacerada quando despida
da proteção artificial. Até nossos músculos, dos quais já não precisávamos
exigir muito, ficaram bem mais frágeis. Nossa capacidade de correr caiu
acentuadamente.
Contudo, não obstante todas as perdas, as
vantagens foram maiores. Conseguimos criar ambientes bem seguros, o que foi
tornando menos necessária a proteção que criáramos para os nossos corpos. E, já
em lugar mais tranqüilo, podendo viver afastados dos chamados irracionais,
pudemos dar outra finalidade à cobertura artificial da nossa pele, que passou a
ter mais função de adorno do que de proteção. Podendo construir nossas
habitações em lugar mais apropriado, utilizamos nossa capacidade artística para
criar inúmeros instrumentos que nos trazem grande conforto. Após nos valermos de
animais fortes, como o cavalo e o boi e da força da água, do vento, etc.,
avançamos ao estágio das máquinas, instrumentos capazes de produzir trabalho
independentemente até certo ponto da energia biológica. Criamos muitos meios de
lazer, e a vida parece ter-se tornado muito, muito, muito melhor. Melhorou
mesmo, não resta dúvida; contudo passou a nos exigir muito para a aquisição de
todos esses equipamentos que nos colocam em grande superioridade aos demais
membros do reino animal. Problemas psicológicos, neurológicos, psicossomáticos,
etc. de várias ordens têm sido um dos legados do nosso desenvolvimento.
Mas que pode dizer que eles não existiam naquele passado?
Não adianta olhar “os lírios do campo”, nem “as aves dos
céus” e deixar de pensar no amanhã. Você não consegue mais pegar o seu
jantar nas árvores; seu corpo não pode mais ficar livre dos envoltórios que
criamos; não há caverna segura para você se refugiar; e tudo isso nos leva a ter
que fazer uma porção de coisas como meio de adquirir os produtos do nosso
conhecimento: pagar um aluguel ou comprar um imóvel; se temos imóvel livre de
condomínio, não conseguimos fugir dos tributos, etc. Estamos cercados de coisas
maravilhosas que foram criadas para nosso bem-estar, mas temos que lutar de
alguma forma para nos apossarmos desses bens. Não temos que enfrentar as feras
que nos perseguiam no passado, é verdade, porém somos perseguidos, muitas vezes
de forma mais traiçoeira, pela nossa própria espécie, quando querem tirar maior
proveito de nós ou simplesmente nos invejam. E, em um mundo onde vigora a lei da
oferta e da procura, o trabalhador não é tão livre para escolher o que fazer; ao
contrário, submete-se ao que determina aquele que lhe der uma oportunidade para
sua sobrevivência.
E, para complicar ainda mais a nossa
estressada vida, ainda criamos seres sobrenaturais, conhecedores até dos nossos
pensamentos, para nos castigar quando procuramos satisfazer algumas das nossas
necessidades básicas.
No final das contas, criamos tanto conforto, que até nos
tornamos mais frágeis fisicamente. No entanto, não obstante alguns pontos
negativos, acho que estamos em melhores condições de vida que no passado. E se
não tivéssemos os desafios por que temos que passar, também não seria bom. É
agradável a sensação de transpormos obstáculos. A vida é boa e bela, apesar dos
males. Não somos livres tanto quanto se diz, mas estamos bem melhor
do que no passado.
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