O QUE NOS TORNA DIFERENTES DOS OUTROS ANIMAIS
segunda-feira, 13 de janeiro de 2014
Dawkins escreve sobre o que nos torna seres humanos
por Richard Dawkins
Nosso grande cérebro começou a evoluir quando começamos a andar sobre duas
pernas
Os seres humanos são animais.
Não são plantas nem bactérias, são animais — primos dos macacos africanos
chimpanzés, bonobos e gorilas. Os macacos asiáticos (orangotangos e gibões)
são primos mais distantes.
Assim, uma maneira de compreender o que nos torna humanos é perguntar: "O que
nos faz diferente dos macacos, e do resto do reino animal?" O que nos torna
especial?
Por exemplo, diferentemente de todos os outros macacos, andamos sobre duas
pernas, o que libera nossas mãos para fazer todo tipo de coisas. E (talvez
uma coisa esteja ligada a outra) temos cérebros muito maiores do que
outros macacos.
Há outra maneira de fazer a pergunta: "O que nos torna humanos?" "Quais são as
características que nos tornam humanos em oposição ao brutal?"
Temos grandes cérebros. As demais espécies são marcadas por outras
características. Andorinhões e albatrozes são espetacularmente bons voadores.
Cães e rinocerontes têm bom faro. Morcegos possuem sistema de captação
de som bem desenvolvido. Toupeiras e porcos da terra são especializados
em cavar.
Outras espécies podem se comunicar, mas nenhuma possuem verdadeira linguagem com
gramática.
Nenhuma outra espécie tem literatura, música, arte, matemática ou ciência.
Nenhuma outra espécie faz livros ou máquinas complicadas, como carros,
computadores e colheitadeiras.
Nenhuma outra espécie dedica tempo substancial em atividades que não
contribuem diretamente para a sua sobrevivência ou reprodução.
Nossos grandes cérebros evoluíram após começarmos a andar sobre duas pernas.
Agora podemos traçar nossa ancestralidade por intermédio de uma série contínua
de fósseis, e estamos confiantes de que nossos antepassados de três milhões de
anos eram membros do gênero Australopithecus.
O Australopithecus mais conhecido é Lucy — assim chamado porque a vitrola do
acampamento da missão exploradora na Etiópia estava tocando Lucy In The Sky With
Diamonds, dos Beatles, quando os caçadores de fósseis voltaram com a importante
notícia da descoberta.
Lucy tinha um cérebro do tamanho do de um chimpanzé, mas ela caminhava sobre as
patas traseiras. Provavelmente é por acaso que o nosso cérebro começou a
inchar como um balão evolutivo após as nossas mãos terem sido libertadas do
fardo de andar. E as mãos ficaram livres para manipular ferramentas e
transportar alimentos.
Os seres humanos têm mostrado como são especiais. Há 50.000 tínhamos os mesmos
corpos e cérebros que temos hoje e provavelmente já usávamos a articulação da
fala para nos comunicarmos. Mas nós ainda não tínhamos algo que pudesse se
chamado de arte e nossos artefatos estavam limitados aos funcionais —
ferramentas de pedra para a caça e abate, por exemplo.
Isso mudou em torno de 40 mil anos atrás, quando o registro arqueológico
mostra um florescimento magnífico e repentino de arte, incluindo até mesmo
instrumentos musicais.
A evolução cultural — o que supera por ordens de magnitude a evolução genética —
foi um grande avanço para a espécie humana. Em seguida, veio a transição do
caçador/coletor para o desenvolvimento da agricultura, e logo [no tempo
histórico] sugiram as cidades, mercados, governos, religião e guerra.
A Revolução Industrial expandiu as cidades em megalópoles, impulsionando a nossa
espécie para todo o mundo (e potencialmente desastroso) dominação, até mesmo
para chegar à Lua e rumo aos planetas.
Ao mesmo tempo, a mente humana tem se estendido para o universo mais amplo, e
muito além das limitações de tempo de uma vida humana.
Sabemos agora que o mundo é uma minúscula partícula orbitando uma pequena
estrela entre algumas centenas de bilhões de estrelas, em uma galáxia média
entre algumas centenas de bilhões de galáxias.
Sabemos que o mundo começou a 4,6 bilhões de anos, e o universo 13,8 bilhões.
Entendemos o processo de nossa evolução e que vida tem como base o DNA.
Há muito coisa que ainda não compreendemos, mas estamos trabalhando nisso. E o
desejo de fazê-lo é talvez a mais inspiradora de todas as qualidades únicas que
nos tornam humanos.
Este texto foi publicado originalmente no
NewStatesman.