ÓRGÃO PÚBLICO
NÃO PERTENCE À MAIORIA
HÉLIO
SCHWARTSMAN
domingo, 11 de março de 2012
"Cristo
despejado.
O assunto é
menor, mas tem elevado valor simbólico. Nesta semana, a Justiça gaúcha
determinou a retirada dos crucifixos de todas as suas dependências. Como bom
ateu, sou favorável à medida. Entendo, porém, que alguns cristãos se sintam
frustrados. Vou tentar mostrar que a laicidade do Estado interessa mais a eles
do que a mim.
Um dos argumentos mais populares entre os defensores da permanência da cruz é o
de que a maioria da população é cristã. Bem, a maior parte dos
brasileiros também é flamenguista ou corintiana. A ninguém, contudo,
ocorreria ornar os tribunais com bandeiras e flâmulas desses clubes. Maiorias
não bastam para definir a decoração de paredes públicas.
De resto, nem todos os cristãos são entusiastas do crucifixo. Algumas
denominações protestantes o consideram um caso acabado de idolatria, pecado cuja
prática meus ancestrais judeus costumavam punir com o apedrejamento até a morte.
A vontade da maior parte dos cidadãos é, por certo, um elemento importante da
democracia, mas não é absoluto nem incondicional. Um país só é democrático
quando defende suas minorias da tirania das massas.
E o direito de todos a espaços públicos livres de proselitismo religioso deveria
ser autoevidente. Ao contrário do que muitos podem pensar, isso importa mais
para o crente membro de grupo ou seita minoritários do que para ateus e
agnósticos.
Nós que não acreditamos num ser superior ou que julgam essa uma questão
indecidível, tendemos a considerar imagens religiosas como uma manifestação
supersticiosa, uma excentricidade, no máximo. Já um judeu ou muçulmano
praticantes podem ver na figura do Cristo crucificado um símbolo de opressão e
morte. Não se pode dizer que não tenham razões históricas para pensar assim.
Exceto para os apreciadores de teocracias de partido único, a laicidade do
Estado é a melhor garantia da liberdade religiosa.