O PIOR PRESIDENTE DA HISTÓRIA DO BRASIL

2021

 

Bolsonaro não é apenas negligente, é o pior presidente da história do Brasil
Sergio Dutti/Isto É
Ricardo Chapola
Edição 08/07/2021 - nº 2686

Embora a CPI da Covid não conte com nenhuma mulher entre seus titulares, uma das principais personagens da comissão até aqui foi a senadora Simone Tebet (MDB-MS). Foi graças a ela que o deputado Luis Miranda (DEM-DF), um dos delatores do esquema de pagamento de propina nas negociações na compra de vacinas, e considerado testemunha chave nas investigações, jogou luz sobre outro nome no suposto conluio: o do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara. “Não ter mulher faz a CPI perder força de alguma forma”, afirmou em entrevista à ISTOÉ. Advogada, Tebet tem procurado participar sempre que pode das sessões semanais da CPI. A senadora afirmou que “há fortes indícios de materialidade” de corrupção no esquema de propina no caso da compra da vacina Covaxin, disse que Bolsonaro pode entrar para história como o pior presidente de todos os tempos e criticou a postura da Procuradoria-Geral da República (PGR) diante de denúncias de corrupção envolvendo o governo Bolsonaro. “A PGR não tem sido pródiga em querer investigar o presidente da República. O que nós podemos dizer é que avançou sobre a PGR nuvens duvidosas em relação à sua independência”.

Qual é a opinião da senhora sobre o STF ter pedido para que a PGR investigue Bolsonaro por prevaricação?
Sabemos que a PGR só mandou investigar Bolsonaro por determinação do STF. A ministra Rosa Weber passou um sabão na procuradoria. A PGR não tem sido pródiga em querer investigar o presidente da República. Está fazendo por livre e espontânea pressão. A CPI tem que focar na compra da Covaxin nos próximos 15 dias, porque é dali que surgem uma série de outras consequências, não só para municiar a PGR na investigação, mas municiar também o TCU. Como temos prazo determinado e estamos mais adiantados, a CPI será instrumento de pressão para que os órgãos de controle avancem nas suas próprias investigações.

A PGR não tem sido pródiga em querer investigar o presidente da República. Está fazendo por livre e espontânea pressão

Mas pegou mal para a PGR?
Está pegando muito mal para a PGR já faz algum tempo. A harmonia de poderes se faz presente e é necessária. Mas tão importante quanto a harmonia é a independência. E o Ministério Público tem papel crucial em todo esse processo. Faz muito tempo que nós podemos dizer que avançou sobre a PGR nuvens duvidosas em relação a sua independência e aos reais interesses de apurar irregularidades dependendo dos personagens que estejam envolvidos.

A CPI não tem nenhuma integrante mulher, mas foi graças à senhora que surgiu uma informação valiosa na comissão, que foi o envolvimento do nome de Ricardo Barros na compra da Covaxin?
Isso já faz parte da nossa história. Ocupar espaço público nunca foi fácil para a mulher e continua não sendo. Não ter mulher faz a CPI perder força de alguma forma, porque perde o lado de sensibilidade da mulher, do feeling da mulher. Na fala do deputado Luis Miranda, houve uma junção entre homens e mulheres. Eu vi que estava tudo batendo. E vi que o deputado já estava emocionalmente abalado, vi que ele queria falar. Mas vi que ele estava inseguro. Então eu disse: “Não tenha medo, não se preocupa”. Foi nesse aspecto de proteção, do acolhimento, e que muitas vezes a testemunha precisa ouvir. E foi aí que ele revelou o nome do Ricardo Barros.

Até onde a senhora acha que levarão as investigações do caso da vacina indiana da Covaxin?
A CPI tem que focar na investigação sobre a compra da Covaxin. Além de todos os elementos do caso da AstraZeneca, envolvendo o Dominguetti e a Davati, o caso da Covaxin tem indícios muito mais fortes da materialidade do esquema de propina. Tudo leva a crer que é um esquema de propinoduto dentro do Ministério da Saúde e que não vem de agora. A Covaxin abriu duas linhas de investigação. Uma que apura possível crime de prevaricação envolvendo as autoridades máximas do País e possíveis crimes relacionados ao esquema de corrupção. Nesse segundo aspecto, estamos falando de advocacia administrativa, tráfico de influência, peculato, corrupção ativa, corrupção passiva, de concussão e organização criminosa. Aí vem algo maior ainda, que é mais escandaloso, mais cruel. Diria ser até um pecado mortal diante de tantas mortes, que é um esquema de propina em cima desse contrato de compra de imunizantes. Essa relação toda está mais fácil de ser investigada, comprovada.

Ficou demonstrada a ocorrência de crime de prevaricação, certo?
A prevaricação depende da comprovação dos crimes de corrupção. É ela que vai confirmar a ocorrência de uma possível prevaricação das autoridades máximas. Tem uma matriz de risco da Covaxin. Elencaram seis matrizes de risco elaboradas dentro do ministério, antes da assinatura do contrato. Tem a ver com prevaricação também. Se tinha essa matriz de risco, como é que o Elcio disse ao Pazuello, que, por sua vez, disse ao presidente, que não havia nada de irregular? Está comprovado que havia elementos que diziam ter algo de muito errado em relação a essa vacina indiana e tudo depõe contra eles no caso da prevaricação.

Sobre o caso do Dominguetti, que depôs na CPI dizendo que negociava uma comissão de 25 centavos de dólar por vacina, a senhora não considera grave?
Precisamos separar comissão da questão da propina. Até agora, ao que tudo indica, Dominguetti era um lobista que, em função dessa posição que ocupava, apesar de forma irregular, ilegal, por ele ser PM da ativa, ele recebia uma participação. Propina é outra coisa.

Mas não é algo nebuloso?
É. Mas acho que no caso da AstraZeneca, a CPI não vai conseguir encontrar materialidade. Não houve contrato, nota de empenho. O depoimento de Dominguetti foi importante porque aponta indícios fortíssimos de propinoduto. E porque cita os mesmos personagens. Neste momento, o que ele reforça é a relação de possíveis autores de um esquema criminoso de corrupção dentro do Ministério da Saúde.

Por que a senhora concordou com a decisão da CPI de não ter mandado prender Dominguetti?
A prisão é caso extremo. Temos que ter um flagrante delito. Ele procurou a CPI, não se recusou a responder as perguntas. Deu a sensação que parecia ter caído a ficha dele de que a gravação não tratava de vacinas. Quem quis plantar o áudio? Achávamos que Dominguetti tinha sido plantado na CPI. Mas logo começou a ficar claro que dificilmente ele teria apresentado o áudio da forma como apresentou. Até que ponto Christiano Carvalho quis se livrar do processo? Quem saiu perdendo foi o Dominguetti, pelas infrações que cometeu, pelo fato de ser PM e que podem resultar na sua demissão. Por ter perdido credibilidade como testemunha, ele não levou nada, a não ser a ideia de que está muito protegido por alguém. E mostrou que ele não está nem um pouco preocupado com o seu futuro profissional.

Acredita que isso ajude a enfraquecer a CPI?
Não. Ficou no ar, até o final, qual era o papel de Dominguetti no processo. Ele reconheceu que poderia não estar se tratando de vacina no áudio. É quase como se ele tivesse ouvido o áudio pela primeira vez ali na CPI. Nós utilizamos um instrumento muito mais eficaz, que foi ter apreendido o celular dele.

A hipótese de que ele estaria a serviço de alguém já foi descartada?
Ela se fragilizou, porque os senadores da base do governo não souberam aproveitar a testemunha. Não teve jogo, não teve encenação, orquestração ali do lado dos senadores governistas. Eles também estavam tentando entender o processo.

Mas tinha algo por trás dessa tentativa de Dominguetti tumultuar a CPI?
No começo, pensávamos que era uma testemunha plantada pela empresa ou pelo governo. Cinco senadores do G-7 ainda estão tentando entender o papel de Dominguetti.

Alguns de seus correligionários que integram a CPI defendem o governo obstinadamente. O que a senhora acha disso?
O único que defende o governo até pela missão que tem, é o Fernando Bezerra. Só não entendo porque ele ainda está na liderança do governo. Se ele é líder do governo é porque acredita no governo. Ele tem que acreditar nisso para ser líder do governo. Eu tenho que lamentar. Isso gerou um esquema de propinas sem precedentes. Cada zero a mais significa vidas perdidas por vacinas a menos. No caso da AstraZeneca, estou falando de propina de R$ 2 bilhões. Eu nunca vi isso. Implica em crimes contra a humanidade e contra a população brasileira. Se nós não tivéssemos atrasado a compra de vacina, respondido aos mais de 50 e-mails da Pfizer, as pessoas que morreram na faixa de 35 a 60 anos nos últimos 60 dias já estariam vacinadas. A pergunta é: teriam morrido prematuramente? São mais de 530 mil cruzes espalhadas por todos os municípios em todos os rincões deste País.

O depoimento de Dominguetti foi importante porque aponta indícios fortíssimos de propinoduto dentro do Ministério da Saúde

Que imagem Bolsonaro vai deixar para a história?
A história é implacável. O tempo da história é um tempo diferente do tempo da política. Acredito que o presidente vai entrar para a história não só como negligente. Mas pode entrar como o pior presidente da história do Brasil.

Qual o grau de envolvimento do presidente no que está sendo investigado pela CPI até agora?
A primeira fase da CPI deixou muito claro que o negacionismo levou à omissão dolosa, intencional, por negar a pandemia e atrasar a compra de vacinas. A segunda fase começou com os irmãos Miranda denunciando um outro deputado federal, que é o líder do governo na Câmara. Bolsonaro falou com Pazuello dois dias antes de ele sair do Ministério da Saúde. E Pazuello disse ter acionado Elcio Franco, que saiu do Ministério da Saúde um dia depois. Nesse elo, alguém prevaricou. Basta saber quem vai ter coragem de assumir essa prevaricação. O problema é que Pazuelo estava saindo e disse que mandou Elcio apurar. Elcio disse que apurou, mas na verdade não averiguou coisa nenhuma. Ele vai ter que mostrar o que fez. Apresentou para a CGU, para o TCU, para os órgãos de controle? Tem e-mail? Tem ofício? Tem fax? Onde está?

A senhora acha que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, deve determinar logo a continuação dos trabalhos da CPI?
Não tem como isso não acontecer. Pacheco é uma pessoa muito zelosa e equilibrada. Tem consciência do impacto fatal e político para sua imagem se ele não prorrogar a CPI. Tendo as 27 assinaturas, não é uma questão dele querer ou não. É dever de prorrogar. Pacheco é advogado e sabe disso.

O que acha sobre os áudios que implicam o presidente Bolsonaro no esquema das rachadinhas em seu gabinete como deputado?
Isso é grave. Mas essa é uma questão que não pode entrar para a pauta da CPI. A comissão não pode se contaminar. A CPI precisa ter disciplina, ritmo e foco. A rachadinha não é foco da CPI. Ela tem quer ter disciplina de ordenar os trabalhos e dar ritmo no sentido de acelerar as investigações.

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