POR QUE EXISTE SEGUNDA-FEIRA
E NÃO EXISTE PRIMEIRA-FEIRA
Por que existe segunda-feira, se não
existe primeira-feira? Essa é a pergunta a que a curiosidade infantil me levou.
Obtive uma falsa resposta, mas ela não durou muitos anos.
Entre as muitas perguntas que tinha
para fazer à minha mãe, que me parecia muito sábia, uma foi esta: "Por que existe
segunda-feira, se não existe primeira-feira?"
Minha mãe imediatamente me respondeu:
É porque Jesus ressuscitou na primeira-feira, e por isso o nome do dia foi
mudado para domingo. Fiquei satisfeito, mas, no decorrer dos anos, essa
explicação foi ficando duvidosa, até um dia em descobrir que a história era
outra.
Filho de pais católicos, tendo
recebido todos os sacramentos determinados pela igreja, certo dia fui convencido
a passar para outra ala cristã, que me afirmava que a autoridade máxima da
Igreja Católica era a besta do apocalipse, e o verdadeiro cristianismo tinha
outro nome. Por essa época já aprendi que o nome domingo teria sido dado
ao primeiro dia da semana, antes dia do Sol, pelo imperador Constantino Magno já
no século IV da Era Cristã. Isso me pareceu bem plausível, uma vez que,
nos chamados evangelhos e nas cartas apostólicas, todas as referência ao
primeiro dia da semana o tratam como "primeiro dia da semana", não havendo
nenhum título especial dado a esse dia.
Ao comprar um relógio
com um calendário semanal com Dia do Sol (Sol), Dia da Lua (Lun), Dia de
Marte (Mar), Dia de Mercúrio (mie), Dia de Júpiter (Jue), Dia de
Vênus (Vie) e Dia de Saturno (Sat), achei compatível com a informação de
que o dia era chamado do pelos romanos de "Dia do Sol" (dies solis).
Percebi que todos os dias da semana já tinha recebido nomes dos deuses
representados pelos planetas do Sistema Solar. Entretanto, não encontrava informação a respeito da semana cheia de feiras com exceção da primeira e da
sétima.
Muito tempo depois, quando já havia
concluído que a chamada palavra divina era um engano, após mudar-me
para Belo Horizonte, seguindo aquela curiosidade de conhecer literatura antiga, comprei um livro
bem antigo que informava que os criadores das medidas do tempo foram os
sacerdotes caldeus, e eles criaram a semana em honra aos sete astros conhecidos
do sistema solar: “Inventaron... la semana dividida en siete días, en honor
de los siete astros” (A. Malet, História del Oriente, pág. 118); e eles
eram muito mais antigos do que os criadores da Bíblia. A essa altura, já
estava percebendo que a primeira lenda judaica da criação do mundo, pelo fato de
aquele povo rejeitar o politeísmo, havia substituído os nomes astrológicos da
semana por outros. Todavia, ainda continuava sem saber a verdade sobre as feiras
da semana.
Pela leitura do chamado Novo
Testamento, percebi que o cristianismo primitivo, conforme teria escrito Paulo
de Tarso aos cristãos de Colossos, não se submetia aos preceitos de guardar
“dias de festa, lua nova ou sábados” (Colossenses, 2:16). Isso já abonava
a afirmação de que eram os cristãos cristãos romanos que, posteriormente,
converteram o “dies solis” (dia do sol) em “dies dominicum” (dia do Senhor), em
homenagem à ressurreição de Jesus, que teria ocorrido no primeiro dia da semana.
Só próximo à virado do século,
em 1999, li uma artigo da Superinteressa que informava: “O papa Silvestre I,
líder cristão entre 314 e 335, ... dividiu a semana da seguinte maneira: feria
prima, feria secunda, feria tertia, feria quarta, feria quinta,
feria sexta e
feria septima.” (SUPERINTERESSANTE, dez/1999, pág. 21). “Féria” significava
comemoração. A evolução da língua se encarregou de transformar "féria" em
"feira" no Português. Para o Papa Silvestre, todos os dias seriam sagrados. Já
entendi que o único povo que aceitou a nova nomenclatura dada pelo papa foi o
português; pois, até onde tenho conhecimento, as outras línguas neolatinas
mantiveram a nomenclatura romana dos dias dedicados aos planetas. Embora
tenhamos adotado os novos nomes dados pelo Papa, quanto ao sétimo dia prevaleceu
a tradição hebraica e o primeiro ficou mesmo como domingo (dies dominicum ou
dominicus dies). Séculos depois, Napoleão III, que gostava muito de trabalhar,
ou mais provavelmente, queria ver seus súditos trabalhando mais, conforme
informa o artigo da Super, substituiu a semana por um período de dez dias. Esse
novo calendário, por sua vez, como é óbvio, não agradou a ninguém e foi revogado
poucos anos depois. A lenda religiosa foi refutada pelo pouco que restou
da história, e a semana na nossa língua é a que tem mais de Cristianismo, porém
as outras mantiveram os traços das antigas religiões.
Resumindo, nosso calendário
começou com uma semana dedicada aos deuses dos sete astros que os caldeus
conseguiram diferenciar das estrelas, e as religiões posteriores fizeram suas
alterações até chegar a nós essa semana que tem um pouco de judaísmo e o resto
de cristianismo.