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PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO
Hoje se fala muito em
privatização de tudo, até da educação e da saúde. E, ao que parece, até os
que dependem dos serviços públicos estão sendo convencidos de que isso seja bom.
Daria mesmo certo? Ou seria trágico para o país?
Para exemplificar como
seria, vou usar a minha experiência, como vim de um interior muito pobre até
aqui.
Nasci perto de uma
escola pública rural, onde havia apenas uma sala grande com carteiras de
madeiras para acomodar os alunos, um quadro e giz e uma professora que
lecionava sozinha para alunos do primeiro, do segundo e do terceiro ano.
Livros eram aqueles preparados segundo os ditadores da época. Só tínhamos
que comprar cadernos. Como vivíamos com muito pouco dinheiro, e eu gostava
de escrever, quando estava fora da escola em escrevia muito em folha de
bananeira, para não gastar caderno.
Terminado o terceiro
ano, tive que andar uns dez quilômetros da minha casa até uma escola na
cidade. Tive, porém, um benefício: a escola aceitou que eu estudasse sozinho os
materiais da minha irmã que frequentava a escola diariamente e fosse lá só para
fazer as provas. Com isso, eu não precisei caminhar esses dez quilômetros
o ano inteiro e fiz a quarta série primária.
Depois disso, mudamos
para Mato Grosso e, após uma década sem frequentar escolas, fui fazer a quinta
série em outra escola pública em Rondônia. Minha professora de Português
me informou que havia ali um supletivo no qual eu poderia terminar o primeiro
grau em dois anos, já que o meu conhecimento estava bem além do que me era
ensinado na quinta série, e o supletivo seria fácil para mim. Ouvi a professora,
fiz o supletivo, completei o primeiro grau. Nessa época, eu já havia saído
da vida rural e trabalhava com fotografia.
Já tendo um pouco de
economia feita com o serviço fotográfico, montei uma sociedade comercial com a
minha irmã, o que foi quase totalmente destruído por um incêndio depois de pouco
mais de dois anos de atividade. Decidi vir para Belo Horizonte. Como
não me parecia tão promissor trabalhar com fotografia por aqui, resolvi ser
empregado em outra atividade. Comprei uma pequena máquina datilográfica, treinei e consegui o
primeiro emprego. Depois de uns três meses trabalhando como datilógrafo em
um escritório de uma construtora, fiquei sabendo de um concurso público do
Tribunal de Contas, cujas provas eram só Português e datilografia, vi nisso uma
boa chance. Mesmo com apenas o primeiro grau e concorrendo com milhares de
pessoas de nível superior, me classifiquei bem na prova de Português e a de
datilografia foi uma brincadeira. Nesse período de Tribunal de Contas, já
pude pela primeira vez pagar um ensino privado em um cursinho dos mais baratos e
fazer o segundo grau também por supletivo.
Após três anos no
Tribunal de Contas, mediante outro concurso, passei para o Tribunal de Alçada. A
essa altura, já tinha passado em outro concurso, na Justiça do Trabalho, mas
preferi o Tribunal de Alçada, onde a remuneração estava muito melhor. As
coisas deram uma grande reviravolta, quando, enquanto Newton Cardoso arrasou com a
remuneração dos servidores públicos, Sarney determinou a reposição de grande
parte das perdas ocorridas nos tempos da ditadura, e a minha esposa, que
trabalhava na Justiça do Trabalho, passou a ganhar mais de três vezes o que eu
ganhava no Tribunal de Alçada. Eu precisei fazer outro concurso e fui para
a Justiça do Trabalho.
Trabalhando na Justiça,
fiz o curso de Direito pela UFMG, o que me possibilitou assumir o cargo de
oficial de justiça, para o qual havia feito concurso já próximo do fim do curso
de Direito. Assim, pude pagar escolas privadas para a minha filha,
do maternal ao curso superior.
Agora pensemos numa
história hipotética, essa da privatização da educação. Imaginemos que isso
tivesse sido feito desde os dias da ditadura.
Como meus pais não
tinham condições de pagar mensalidades escolares, eu poderia ter continuado
vivendo na agricultura, plantando e colhendo ano a ano, sendo hoje mais um
analfabeto, sem renda para pagar os altos tributos que vim a pagar ao me tornar
um funcionário público bem remunerado, e as escolas
privadas teriam deixado de ganhar uma boa soma de dinheiro que receberam com a
educação da minha filha.
Agora multipliquemos isso por milhões.
Pensando em milhões de pessoas no meu lugar, podemos ver que, sem as precárias
escolas públicas, as próprias escolas privadas de hoje estariam sem mercado, sem
demanda de
serviço; milhões de pessoas que hoje são bons contribuintes poderiam estar na
miséria, em um país muito mais pobre. Usando bem o raciocínio lógico,
podemos imaginar a tragédia que será se conseguirem privatizar toda a educação.
Agora, imaginem quão devastador seria privatizar também a saúde!
Educação não é mercadoria! Pelo menos,
não deveria ser, como está se tornando hoje. Sem investir na educação, o país,
que já tem um baixo IDH, estará fadado a ter um povo miserável, e, um dia, os
ricos que aproveitarem agora a onda neoliberal já vão estar em dificuldade
também; pois um povo miserável não prestará para sustentar os seus lucros.
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