Quando ainda criança, quando não sabia
que a Terra fosse um globo, nem sabia da existência de fusos horários, no começo
do programa Voz do Brasil, eu ouvi aquela bela voz, nem sei de quem, dizer:
"Em Brasília, dezenove horas".
Eu comecei a raciocinar: Se ele diz
que em
Brasília são dezenove horas, as horas não devem ser as mesmas em todos os
lugares. Imaginei mais: bem distante de nós, lá pelo lado do nascente, as horas
devem estar mais avançadas, deve ser mais tarde; e, por outro lado, lá pelas
bandas do poente, deve ser mais cedo.
Todavia, havia uma séria dúvida a
resolver: como o Sol surgia no oriente, desaparecia no ocidente e não era visto
voltando para começar o novo dia.
Observando o Sol ao longo do dia,
senti que seu caminho se inclinava para a direita na perspectiva de quem olha
para o céu. Deduzi que, em lugar distante, longe dos nosso olhos, ele
deveria fazer a volta para no outro dia poder estar surgindo novamente no
nascente.
Meu raciocínio não estava errado do
ponto de vista de quem está no hemisfério sul. Se eu vivesse lá pelo sul
da Argentina ou do Chile, eu teria visto essa curva muito mais claramente, e me
pareceria estar solucionado no problema. Entretanto, se eu vivesse
lá e fosse à Noruega, eu iria encontrar outro grande problema: lá eu iria ver o
Sol seguindo um caminho pelo lado oposto. Sem saber que estamos em
um globo que gira e nos dá a impressão de que o Sol está caminhando pelo céu
como pensou o escritor bíblico (Salmos, 19:6),
não haveria explicação para o fenômeno que ocorre em sentidos opostos nas duas
metades do planeta. Ao descobrir que a Terra é um globo, tudo se
encaixou perfeitamente.
Processo semelhante ocorreu com a
descoberta do engano do geocentrismo. Anaxágora,
partindo da suposição de a Terra ser plana, calculou os graus de
inclinação da sombra em locais distantes e concluiu que o Sol estivesse
aproximadamente cinco mil quilômetros de distância da Terra. Todavia,
percebeu-se que havia algo muito errado com isso.
Se o Sol estivesse a cinco mil quilômetros de altura, quem estivesse vendo-o
no nascente ou no poente estaria a uma distância muito maior e teria que vê-lo
muito menor. Como o diâmetro do Sol não
diminui em nada do meio-dia à tarde, concluiu-se que o Sol deveria
estar a uma distância extremamente maior do que imaginou Anaxágora.
Raciocinando sobre esse fator, é que Eratóstenes concluiu que o Sol está a uma
distância tão grande, que seus raios chegam a todos os
pontos do planeta quase paralelos. E, se os raios chegam quase
paralelos, a inclinação da sombra em dois lugares
afastados
tem que decorrer da curvatura da Terra, curvatura
essa que os gregos já haviam percebido observando embarcações no oceano.
Medindo a inclinação da sombra entre duas cidades cuja distância ele conhecia,
ele chegou à conclusão do tamanho da circunferência da Terra quase com exatidão.
E pela observação dos astros errantes (astera planetes), é que se descobriu que
as estrelas não giram em torno da Terra, mas a Terra gira, nos dando a impressão
de que o céu está girando.