Regulamentação da prostituição no Brasil: a proposta, as
críticas e possíveis cenários André Cabette Fábio e Juliana Domingos de Lima
28 Out 2016 (atualizado 07/Mar 17h00) Conhecido como ‘PL Gabriela Leite’,
proposta de regulamentação é controversa entre defensores dos direitos das
mulheres Foto: Sheila Tostes/Creative Commons Projeto de lei Gabriela Leite
quer regulamentar prostituição Projeto de lei Gabriela Leite quer
regulamentar prostituição Desde 2002 a prostituição é reconhecida pelo
Ministério do Trabalho como uma ocupação profissional. Ela ainda não é, no
entanto, regulamentada. Na avaliação de algumas militantes e prostitutas,
isso torna impossível diferenciar o exercício da atividade da exploração
sexual, que ocorre em parte dos milhares de locais onde sexo é
comercializado no Brasil. Um dos defensores do ponto de vista de que é
necessário deixar mais clara essa diferença é o deputado federal Jean Wyllys
(PSOL). Ele resgatou em 2012 um projeto de lei de 2003 que regulamenta a
prostituição. Batizado de projeto de lei Gabriela Leite, em homenagem à
prostituta e ativista que morreu em 2013, ele foi elaborado em parceria com
a Rede Brasileira de Prostitutas. O documento propõe alterações no Código
Penal e vale para prostitutas cisgênero - com a identidade de gênero
correspondente ao sexo - ou transexuais, mulheres ou homens. O projeto
distingue de forma clara a prostituição da exploração sexual, que é ilegal -
ambos, hoje, marginalizados e não fiscalizados pelas autoridades
competentes. E também permite casas de prostituição, que atualmente são
ilegais. É improvável que o projeto seja colocado em votação em breve,
devido à composição conservadora do Congresso. A proposta recebe, no
entanto, atenção de prostitutas militantes e é combatida por parte do
movimento feminista, já que a prostituição é exercida principalmente por
pessoas do gênero feminino. Entenda o que o projeto propõe e quais as
críticas direcionadas a ele. O que diz o projeto Exploração sexual O projeto
de lei estabelece que “a obrigação de prestação de serviço sexual é pessoal
e intransferível”. A exploração é vedada. Quem se apropriar de mais do que
50% da renda obtida pela prostituta, não pagar pelo serviço, ou obrigar
alguém a se prostituir mediante ameaça ou violência seria considerado
explorador sexual. Rufianismo Atualmente, o rufianismo, mais conhecido como
cafetinagem, é completamente proibido, ou seja, qualquer um que se aproprie
de parte da renda de uma prostituta está cometendo um crime. Com a mudança
na lei, se enquadra nesse crime quem realiza exploração sexual. Ou seja, se
apropria de mais de 50% do rendimento de uma prostituta ou facilita o
deslocamento, para dentro ou fora do país, de alguém para que seja submetido
a exploração. Casas de prostituição Atualmente proibidas, casas de
prostituição passariam a ser permitidas, contanto que não se exercesse nelas
exploração sexual. As prostitutas poderiam trabalhar nesses locais como
autônomas ou em cooperativas. ‘As casas de prostituição, onde há prestação
de serviço e condições de trabalhos dignas, não são mais punidas’, afirma o
projeto. Aposentadoria especial A lei também avalia que profissionais do
sexo se sujeitam a ‘condições de trabalho aviltantes, sofrem com o
envelhecimento precoce e com a falta de oportunidades da carreira, que cedo
termina'. Por isso, teriam direito a aposentadoria especial pelo INSS
(Instituto Nacional de Seguro Social), ou seja, obtida após apenas 25 anos
de contribuição, dez a menos do que a aposentadoria regular para mulheres. O
que diz quem defende o projeto Em defesa de seu projeto, o deputado Jean
Wyllys afirma que ele lida, de forma pragmática, com o fato de que a
prostituição existe, apesar de ressalvas que possam existir à prática. E que
manter a profissão sem um marco legal não ajuda as mulheres que trabalham na
área. “Se há um serviço, há demanda. A sociedade que estigmatiza e
marginaliza a prostituta é a mesma sociedade que recorre a ela”, afirmou em
entrevista concedida em março de 2016 à Agência Brasil. Para ele, a
ilegalidade permite os abusos dos cafetões e cafetinas, os abusos da
polícia, a propina, a repressão e a violência. Em entrevista ao Nexo, Cida
Vieira, presidente da Aprosmig (Associação de Prostitutas de Minas Gerais),
afirma que a regulamentação deve fortalecer e dar visibilidade à categoria
das prostitutas, o que poderia impulsionar políticas públicas para essas
trabalhadoras. Cida Vieira defende a proposta de regularização das casas de
prostituição, que permitiria às prostitutas cobrar condições de ventilação e
higiene melhores. “Embora a prostituição seja autônoma, precisamos olhar
para os locais em que ela acontece. A sífilis e a tuberculose estão voltando
com tudo”, diz. A garota de programa Luiza, que trabalha entre Rio de
Janeiro e São Paulo, afirmou em entrevista concedida por e-mail e ao Nexo:
“[A regulamentação significaria] iniciar um processo de desmarginalização de
uma profissão que existe às cegas e movimenta um mercado gigantesco. E
evitar que pessoas que trabalham nele sejam ignoradas pela sociedade, pelo
Estado e exploradas inclusive pelos que usufruem de seus serviços”. Ela
disse que da primeira vez que leu o projeto de lei Gabriela Leite enxergou o
ponto que libera o repasse a terceiros de 50% do rendimento como um
retrocesso. Hoje ela avalia, no entanto, que isso pode ajudar a manter
locais que garantem algum nível de proteção a prostitutas mais vulneráveis.
Isso vale, segundo ela, “principalmente no caso das trans, as mais
marginalizadas, estigmatizadas e excluídas da sociedade e que muitas vezes
trabalham inseguras nas ruas. Seria muito fácil para mim, como acompanhante
de luxo privilegiada, dizer que todxs deveriam ter total autonomia em seu
trabalho, quando eu não preciso andar em guetos para sobreviver”. Ela também
rebate a ideia de que a prostituta é, necessariamente, uma vítima do
machismo. “A experiência da prostituição subverte muito mais do que se
imagina. Dentro da prostituição eu vi a possibilidade de me libertar do
papel que se espera de uma recatada e do lar, e mesmo de uma feminista. De
propor novas estéticas, propor o sexo que eu quero sem moralismo, e
conversar sobre coisas e com pessoas que nunca conversaria”. Por que a
proposta é controversa Parte do movimento feminista no Brasil tem críticas à
regulamentação da prostituição. Ao Nexo Clarisse Goulart Paradis, que
participa do grupo Marcha Mundial das Mulheres, criado em 2000, afirma que
liberar o repasse a terceiros de 50% da receita obtida pelas prostitutas é,
na prática, institucionalizar a cafetinagem, que atualmente é crime
independente da quantia repassada. A Marcha Mundial das Mulheres também
afirma que a lei não traz políticas de assistência para quem vive da
prostituição, e não resolveria a vulnerabilidade a que profissionais do sexo
estão expostas atualmente. Outro ponto que levanta desconfiança foi o
momento em que o projeto de lei foi apresentado: às vésperas da Copa do
Mundo sediada pelo Brasil, em 2014. Prostitutas foram incluídas no debate, o
que Clarisse Goulart considera positivo. Ela pondera, no entanto, que “em
vários outros países que sediaram a Copa, se tem notícia de que esse
processo de flexibilização da legislação em relação à prostituição também
aconteceu. Como se a tarefa do país que sedia o evento fosse também a de
oferecer corpos femininos no mercado para a satisfação do prazer sexual
masculino”. Há ainda uma crítica conceitual à proposta. Para parte do
movimento feminista, a normatização da prostituição dialoga com a ideia de
que há uma sexualidade masculina irrefreável, que precisa ser saciada, mesmo
sem o consentimento do outro - um dos pilares da cultura do estupro. A
interpretação é de que a regulamentação trata o consentimento como
mercadoria e que ocorre uma “comoditização do consenso”. “Como o
consentimento sexual pode se tornar algo vendido e comprado e nós
continuamos a falar, com uma cara séria, sobre haver conceitos como
relacionamentos sexuais saudáveis e consentimento verdadeiro?”, escreveu em
junho de 2016 a feminista Kat Banyard ao jornal britânico “The Guardian”. A
regulamentação na prática Em artigo de opinião publicado em outubro de 2016
na revista “Forbes”, Simon Hedlin, pesquisador de políticas públicas que foi
conselheiro sobre igualdade de gênero do primeiro ministro da Suécia, afirma
que há alguns indícios de que a demanda por serviços sexuais aumenta em
países que os regulamentam. Por exemplo: a prostituição foi legalizada em
1999 na Dinamarca. Entre 2000 e 2009, houve um aumento de 40% no número de
prostitutas no país. Os clientes têm, no entanto, em geral poucos elementos
para diferenciar aquilo que é atividade legal do que é ilegal. No caso
brasileiro, a prostituição já não é ilegal, mas o projeto de lei Gabriela
Leite permitiria também casas de prostituição. Para seguir a lei, clientes
teriam o desafio de identificar locais em que o limite de 50% da renda do
programa recolhida por um terceiro fosse respeitado, ou em que as
prostitutas se organizassem em cooperativas. O temor é que, incapazes de
fazê-lo, estimularia-se o mercado ilegal - que envolve, inclusive, o tráfico
humano. Publicada na revista científica “World Development” em janeiro de
2013, a pesquisa “A Legalização da Prostituição Aumenta o Tráfico de
Pessoas?” analisou o caso de 150 países e concluiu que “países onde a
prostituição é legal têm uma quantidade maior de tráfico humano reportada”.
Em seu artigo, Hedlin ressalta, no entanto, que a pesquisas deve ser
encarada com cautela. “Os dados sobre tráfico sexual são em geral ruins, e
fazer pesquisas sobre esse tópico é, sabidamente, excepcionalmente difícil.”
A preocupação com tráfico sexual ocorre também no Brasil. Em entrevista
concedida em março de 2016 à Agência Brasil, Tânia Navarro Swain,
historiadora da Universidade de Brasília, afirmou que “a legalização da
prostituição incentiva o tráfico ignóbil, imundo e nojento, que força as
mulheres a se prostituírem. É um ato que só favorece os homens e o
patriarcado. Mulheres não são mercadorias, são pessoas”.
Regulamentação da
prostituição no Brasil: a proposta, as críticas e possíveis cenários
André Cabette Fábio e Juliana Domingos de Lima
28 Out 2016 (atualizado 07/Mar 17h00)
Projeto de lei
Gabriela Leite quer regulamentar prostituição. Desde 2002 a prostituição é
reconhecida pelo Ministério do Trabalho como uma ocupação profissional. Ela
ainda não é, no entanto, regulamentada.
Na avaliação de algumas militantes e
prostitutas, isso torna impossível diferenciar o exercício da atividade da
exploração sexual, que ocorre em parte dos milhares de locais onde sexo é
comercializado no Brasil.
Um dos defensores do ponto de vista de que é
necessário deixar mais clara essa diferença é o deputado federal Jean Wyllys (PSOL).
Ele resgatou em 2012 um projeto de lei de 2003 que regulamenta a prostituição.
Batizado de projeto de lei Gabriela Leite, em homenagem à prostituta e ativista
que morreu em 2013, ele foi elaborado em parceria com a Rede Brasileira de
Prostitutas.
O documento propõe alterações no Código Penal e vale para
prostitutas cisgênero - com a identidade de gênero correspondente ao sexo - ou
transexuais, mulheres ou homens.
O projeto distingue de forma clara a
prostituição da exploração sexual, que é ilegal - ambos, hoje, marginalizados e
não fiscalizados pelas autoridades competentes. E também permite casas de
prostituição, que atualmente são ilegais.
É improvável que o projeto seja
colocado em votação em breve, devido à composição conservadora do Congresso.
A
proposta recebe, no entanto, atenção de prostitutas militantes e é combatida por
parte do movimento feminista, já que a prostituição é exercida principalmente
por pessoas do gênero feminino. Entenda o que o projeto propõe e quais as
críticas direcionadas a ele.
O que diz o projeto
Exploração sexual
O projeto de
lei estabelece que “a obrigação de prestação de serviço sexual é pessoal e
intransferível”. A exploração é vedada. Quem se apropriar de mais do que 50% da
renda obtida pela prostituta, não pagar pelo serviço, ou obrigar alguém a se
prostituir mediante ameaça ou violência seria considerado explorador sexual.
Rufianismo
Atualmente, o rufianismo, mais conhecido como cafetinagem, é
completamente proibido, ou seja, qualquer um que se aproprie de parte da renda
de uma prostituta está cometendo um crime. Com a mudança na lei, se enquadra
nesse crime quem realiza exploração sexual. Ou seja,
se apropria de mais de 50%
do rendimento de uma prostituta ou facilita o deslocamento, para dentro ou fora
do país, de alguém para que seja submetido a exploração.
Casas de prostituição
Atualmente proibidas, casas de prostituição passariam a ser permitidas, contanto
que não se exercesse nelas exploração sexual. As prostitutas poderiam trabalhar
nesses locais como autônomas ou em cooperativas. ‘As casas de prostituição, onde
há prestação de serviço e condições de trabalhos dignas, não são mais punidas’,
afirma o projeto.
Aposentadoria especial
A lei também avalia que profissionais
do sexo se sujeitam a ‘condições de trabalho aviltantes, sofrem com o
envelhecimento precoce e com a falta de oportunidades da carreira, que cedo
termina'. Por isso, teriam direito a aposentadoria especial pelo INSS (Instituto
Nacional de Seguro Social), ou seja, obtida após apenas 25 anos de contribuição,
dez a menos do que a aposentadoria regular para mulheres.
O que diz quem defende
o projeto
Em defesa de seu projeto, o deputado Jean Wyllys afirma que ele lida,
de forma pragmática, com o fato de que a prostituição existe, apesar de
ressalvas que possam existir à prática. E que manter a profissão sem um marco
legal não ajuda as mulheres que trabalham na área.
“Se há um serviço, há
demanda. A sociedade que estigmatiza e marginaliza a prostituta é a mesma
sociedade que recorre a ela”, afirmou em entrevista concedida em março de 2016 à
Agência Brasil. Para ele, a ilegalidade permite os abusos dos cafetões e
cafetinas, os abusos da polícia, a propina, a repressão e a violência.
Em
entrevista ao Nexo, Cida Vieira, presidente da Aprosmig (Associação de
Prostitutas de Minas Gerais), afirma que a regulamentação deve fortalecer e dar
visibilidade à categoria das prostitutas, o que poderia impulsionar políticas
públicas para essas trabalhadoras.
Cida Vieira defende a proposta de
regularização das casas de prostituição, que permitiria às prostitutas cobrar
condições de ventilação e higiene melhores. “Embora a prostituição seja
autônoma, precisamos olhar para os locais em que ela acontece. A sífilis e a
tuberculose estão voltando com tudo”, diz.
A garota de programa Luiza, que
trabalha entre Rio de Janeiro e São Paulo, afirmou em entrevista concedida por
e-mail e ao Nexo: “[A regulamentação significaria] iniciar um processo de
desmarginalização de uma profissão que existe às cegas e movimenta um mercado
gigantesco. E evitar que pessoas que trabalham nele sejam ignoradas pela
sociedade, pelo Estado e exploradas inclusive pelos que usufruem de seus
serviços”.
Ela disse que da primeira vez que leu o projeto de lei Gabriela Leite
enxergou o ponto que libera o repasse a terceiros de 50% do rendimento como um
retrocesso. Hoje ela avalia, no entanto, que isso pode ajudar a manter locais
que garantem algum nível de proteção a prostitutas mais vulneráveis.
Isso vale,
segundo ela, “principalmente no caso das trans, as mais marginalizadas,
estigmatizadas e excluídas da sociedade e que muitas vezes trabalham inseguras
nas ruas. Seria muito fácil para mim, como acompanhante de luxo privilegiada,
dizer que todas deveriam ter total autonomia em seu trabalho, quando eu não
preciso andar em guetos para sobreviver”.
Ela também rebate a ideia de que a
prostituta é, necessariamente, uma vítima do machismo. “A experiência da
prostituição subverte muito mais do que se imagina. Dentro da prostituição eu vi
a possibilidade de me libertar do papel que se espera de uma recatada e do lar,
e mesmo de uma feminista. De propor novas estéticas, propor o sexo que eu quero
sem moralismo, e conversar sobre coisas e com pessoas que nunca conversaria”.
Por que a proposta é controversa
Parte do movimento feminista no Brasil tem
críticas à regulamentação da prostituição. Ao Nexo Clarisse Goulart Paradis, que
participa do grupo Marcha Mundial das Mulheres, criado em 2000, afirma que
liberar o repasse a terceiros de 50% da receita obtida pelas prostitutas é, na
prática, institucionalizar a cafetinagem, que atualmente é crime independente da
quantia repassada.
A Marcha Mundial das Mulheres também afirma que a lei não
traz políticas de assistência para quem vive da prostituição, e não resolveria a
vulnerabilidade a que profissionais do sexo estão expostas atualmente.
Outro
ponto que levanta desconfiança foi o momento em que o projeto de lei foi
apresentado: às vésperas da Copa do Mundo sediada pelo Brasil, em 2014.
Prostitutas foram incluídas no debate, o que
Clarisse Goulart considera
positivo. Ela pondera, no entanto, que “em vários outros países que sediaram a
Copa, se tem notícia de que esse processo de flexibilização da legislação em
relação à prostituição também aconteceu. Como se a tarefa do país que sedia o
evento fosse também a de oferecer corpos femininos no mercado para a satisfação
do prazer sexual masculino”.
Há ainda uma crítica conceitual à proposta. Para
parte do movimento feminista, a normatização da prostituição dialoga com
a ideia
de que há uma sexualidade masculina irrefreável, que precisa ser saciada, mesmo
sem o consentimento do outro - um dos pilares da cultura do estupro. A
interpretação é de que a regulamentação trata o consentimento como mercadoria e
que ocorre uma “comoditização do consenso”. “Como o consentimento sexual pode se
tornar algo vendido e comprado e nós continuamos a falar, com uma cara séria,
sobre haver conceitos como relacionamentos sexuais saudáveis e consentimento
verdadeiro?”, escreveu em junho de 2016 a feminista Kat Banyard ao jornal
britânico “The Guardian”.
A regulamentação na prática
Em artigo de opinião
publicado em outubro de 2016 na revista “Forbes”, Simon Hedlin, pesquisador de
políticas públicas que foi conselheiro sobre igualdade de gênero do primeiro
ministro da Suécia, afirma que há alguns indícios de que a demanda por serviços
sexuais aumenta em países que os regulamentam.
Por exemplo:
a prostituição foi
legalizada em 1999 na Dinamarca. Entre 2000 e 2009, houve um aumento de 40% no
número de prostitutas no país. Os clientes têm, no entanto, em geral poucos
elementos para diferenciar aquilo que é atividade legal do que é ilegal.
No caso
brasileiro, a prostituição já não é ilegal, mas o projeto de lei Gabriela Leite
permitiria também casas de prostituição. Para seguir a lei, clientes teriam o
desafio de identificar locais em que o limite de 50% da renda do programa
recolhida por um terceiro fosse respeitado, ou em que as prostitutas se
organizassem em cooperativas. O temor é que, incapazes de fazê-lo, estimularia-se o mercado ilegal - que envolve, inclusive, o tráfico humano.
Publicada na revista científica “World Development” em janeiro de 2013, a
pesquisa “A Legalização da Prostituição Aumenta o Tráfico de Pessoas?” analisou
o caso de 150 países e concluiu que “países onde a prostituição é legal têm uma
quantidade maior de tráfico humano reportada”.
Em seu artigo, Hedlin ressalta,
no entanto, que a pesquisas deve ser encarada com cautela. “Os dados sobre
tráfico sexual são em geral ruins, e fazer pesquisas sobre esse tópico é,
sabidamente, excepcionalmente difícil.”
A preocupação com tráfico sexual ocorre
também no Brasil. Em entrevista concedida em março de 2016 à Agência Brasil,
Tânia Navarro Swain, historiadora da Universidade de Brasília, afirmou que “a
legalização da prostituição incentiva o tráfico ignóbil, imundo e nojento, que
força as mulheres a se prostituírem. É um ato que só favorece os homens e o
patriarcado. Mulheres não são mercadorias, são pessoas”.
A argumentação de Tânia
Navarro Swain não tem sentido, uma vez que prostituição não é coisa exclusiva
de mulheres, homens também prostituem, e, em vez de, como ela diz,
estimular "o tráfico ignóbil, imundo e nojento, que força
as mulheres a se prostituírem", a regulamentação pode até
facilitar a
investigação e combate a esse tráfico. As pessoas que prostituem, em
grande parte, escolhem
essa atividade, porque nela conseguem ganhar muito mais do que com um emprego
comum. Se algumas o fazem por não ter outra oportunidade de trabalho, não
estão em condições tão diferentes da maioria das pessoas, que exercem uma
determinada profissão, não por gostar dela, mas por não encontrarem outra melhor para
se manter. E a conclusão da revista World Development pode
conter engano, como ressalta Simon Hedlin, uma vez que
onde há regulamentação o tráfico humano é descoberto com
mais facilidade, e onde não há ficam muito mais crimes encobertos.
A regulamentação é o caminho.