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RELIGIÃO FAZ MUITO MAL
O novo anticristo
Ateu convicto, o filósofo americano propõe que a
religião pare de determinar o que é certo e errado em nossa conduta
Tiago Mali
Por segurança, o
filósofo americano Sam Harris não revela onde mora. Depois de escrever
Carta a uma Nação Cristã (2007) e O Fim da Fé (2009), em que
diz que as religiões são responsáveis por boa parte dos males do mundo,
Harris não fez muitos amigos. Recebeu milhares de e-mails furiosos,
alguns com ameaças. Aparentemente, ele não quer fazer as pazes com os
religiosos que o criticaram. Ph.D. em neurociência, Harris acaba de
lançar nos EUA Moral Landscape (Panorama moral, ainda sem edição no
Brasil), no qual defende que, para construir nossos valores, não precisamos
de crenças. Bastam alguns cálculos científicos.
*Você critica cientistas que defendem a convivência entre crenças
culturais e ciência. Por quê?
Sam Harris: Nos últimos 100 anos, a antropologia, baseada nos
testemunhos de diferentes identidades culturais, estabeleceu que não poderia
haver uma verdade moral, que deveríamos considerar os pontos de vista de
todas as culturas e levar em conta seus valores. Isso se espalhou e
os
cientistas hoje fingem que é possível conciliar ciência e religião. Mas
não
é. Se, na ciência, desprezamos várias hipóteses que se mostram ridículas,
por que deveríamos considerar todas as ideias, por mais bizarras que sejam,
sobre os valores de uma sociedade? Há formas de organização social e
ideias claramente inferiores que deveriam acabar.
*Você pode citar exemplos?
Harris: É claro que os muçulmanos estão errados uma vez que as
mulheres, nessa cultura, sofrem mais do que nas outras.
No
Afeganistão, a expectativa de vida para as mulheres é de 44 anos,
apenas 20% são alfabetizadas e a taxa de mortalidade materna (em decorrência
da gravidez) é uma das maiores do mundo. Por causa da religião, aquele
é um lugar terrível para ser uma mulher. Não podemos respeitar seus
valores.
*Você não teme ser taxado de intolerante?
Harris: Ao criticar culturas, estou preocupado com o sofrimento
terrível causado por elas. Tolerar a intolerância não
é uma virtude, é uma covardia. Quem aceita o
comportamento de homens muçulmanos com as mulheres, as ameaças aos
jornalistas e a trabalhadores de ajuda humanitária, não é tolerante.
Apenas tem uma compaixão falha.
*Se não pela religião, como poderíamos construir valores?
Harris: Há uma ciência da moralidade surgindo. O objetivo, com
novos estudos e pesquisas, é aumentar o bem-estar, que pode ser medido pela
expectativa de vida, taxas de mortalidade e indicadores cerebrais de prazer,
por exemplo. Muito em breve será possível analisar o cérebro de pessoas em
diferentes regiões do planeta para medir que tipos de prática as deixam num
estado mais próximo ao da felicidade. Esse tipo de pesquisa já começa a ser
feito por neurocientistas. Com esse tipo de abordagem, podemos
argumentar, cientificamente, que algumas culturas estão erradas, porque são
falhas em promover o bem-estar.
* A ciência é subproduto da cultura e também usada politicamente.
Buscar nela os valores não seria igualmente perigoso?
Harris: Cientistas podem falhar, mas a ciência é a forma mais honesta de
lidar com os valores. Ela confia em observações claras e raciocínio honesto
num grau não alcançado por nenhuma outra área do discurso humano. Há, por
exemplo, 21 estados americanos em que é permitido
bater em crianças na escola como forma de punição educativa, mesmo com
incontáveis estudos mostrando que isso é prejudicial ao seu desenvolvimento.
Essa prática está baseada em ensinamentos da Bíblia.
A ciência é claramente mais indicada para estabelecer esse tipo de
conduta social do que as tradições religiosas.
* A religião não deve, então, influenciar nenhuma decisão?
Harris: Não. Após a globalização, nosso desafio é construir uma
civilização unicultural, com os mesmos valores para todos. Não podemos
tolerar argumentos radicais na saúde, por exemplo. Se os chineses
agirem mal sobre alguma doença, matando milhares nas suas cidades, isso se
torna um problema em todo o mundo porque tal doença pode se espalhar em
horas. Meio ambiente, política e economia também não podem se sujeitar a
diferentes interpretações. Só deveriam resistir as diferenças que não
causam sofrimento, como na arte, na arquitetura e na gastronomia.
Mas crenças díspares sobre o que é bom e ruim para
as nossas vidas podem causar um dano tremendo. (Galileu,
janeiro/2011, pg. 71).
Já disse Steven Weinberg, físico americano ganhador de prêmio nobel:
"Com ou sem religião, pessoas boas fazem coisas boas
e pessoas más fazem coisas más; mas, para pessoas boas fazerem coisas más, é
necessária a religião".
Explicando: uma pessoa boa é capaz de fazer coisas boas independente de ter ou
não uma religião, e uma pessoa má, tenha ou não uma religião, sempre está
inclinada a fazer coisas más. Todavia, tendo uma religião, uma pessoa,
ainda que boa, pode ser induzida a fazer coisas ruins quando essas coisas ruins
fazem parte das coisas que sua religião dizem ser a vontade de seu deus.
Multidões assistindo a execuções nas fogueiras católicas sem nenhum sentimento
de compaixão pelo sofrimento dos condenados é um bom exemplo.
Ver mais RELIGIÃO É PRÁTICA MUITO
MALÉFICA
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