STF APROVA
DOUTRINAÇÃO RELIGIOSA NAS ESCOLAS
Supremo permite promoção de crenças no ensino religioso em
escolas públicas
Seis ministros votaram para educador ter liberdade de pregar a fé e cinco
votaram para impedir professor de promover crenças. Com decisão, todos os
modelos de ensino continuam permitidos.
Por Renan Ramalho, G1, Brasília
27/09/2017 16h37 Atualizado há 13 horas
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta
quarta-feira (27) permitir que professores de ensino religioso em escolas
públicas promovam suas crenças em sala de aula.
No julgamento, iniciado em agosto e finalizado nesta quarta-feira, somaram-se 6
ministros, entre os 11 integrantes da Corte, favoráveis à possibilidade do
modelo “confessional”. Nessa modalidade, os professores lecionam como
representantes de uma religião, com liberdade para influenciar os alunos.
Para especialistas ouvidos pelo G1, a decisão pode gerar disputa por espaço em
sala de aula.
Veja na tabela abaixo quais ministros
votaram a favor do modelo "confessional" e quais votaram contra:
COMO VOTARAM OS MINISTROS
A FAVOR |
CONTRA |
ALEXANDRE DE MORAES |
LUÍS ROBERTO BARROSO |
EDSON FACHIN |
ROSA WEBER |
DIAS TOFFOLI |
LUIZ FUX |
RICARDO LEWANDOWSKI |
MARCO AURÉLIO MELLO |
GILMAR MENDES |
CELSO DE MELLO |
CÁRMEN LÚCIA |
|
Fonte: Supremo Tribunal Federal
Entenda o julgamento
A Constituição Federal prevê o ensino religioso nas escolas públicas brasileiras
como disciplina do ensino fundamental (para alunos de 9 a 14 anos de idade), mas
estabelece que a matrícula é facultativa. Ou seja, o estudante pode se recusar a
cursar a disciplina por vontade própria ou da família, sem prejuízo nas notas ou
frequência exigidas para ser aprovado.
Cada estado organiza a melhor maneira de oferecer o ensino religioso dentro de
sua grade de horários. Parte dos estados faz parcerias com igrejas e
instituições religiosas para contratar professores (remunerados ou não,
dependendo da religião) para dar as aulas.
Outros estados optam pelo modelo não confessional, com professores não
necessariamente representantes de uma religião.
A ação em julgamento, apresentada pela Procuradoria Geral da República (PGR),
propunha que as aulas se limitassem à exposição das doutrinas, história,
práticas e dimensões sociais das diferentes crenças, assim como do ateísmo e do
agnosticismo – o chamado modelo "não-confessional".
A PGR contestava a possibilidade de “catequese” ou “proselitismo” nas aulas.
A maioria dos ministros, porém, entendeu que o caráter
laico do Estado não significa que ele deve atuar contra as religiões, inclusive
na esfera pública.
Com a decisão da Corte, continua permitido o ensino confessional, o não
confessional e também o chamado interconfessional, com aulas sobre valores e
práticas religiosas baseadas em características comuns das religiões.
Votos a favor da promoção de
crenças
Primeiro a votar pela possibilidade de ensino confessional, o ministro
Alexandre de Moraes argumentou que impedir a promoção de crenças contraria a
liberdade de expressão dos professores.
Para ele, a adoção do modelo oposto levaria o Estado a
definir o conteúdo da disciplina, criando assim uma “religião estatal”.
“O ministro da Educação baixaria uma portaria com os dogmas a serem ensinados,
em total desrespeito à liberdade religiosa.
O Estado deve ser neutro, não pode escolher da religião
A, B ou C, o que achar melhor, e dar sua posição, oferecendo ensino religioso
estatal, com uma nova religião estatal confessional”, disse.
Moraes ressaltou que as aulas são facultativas. Ele argumentou que somente
representantes das religiões, que defendem sua fé, teriam o domínio suficiente
dos preceitos para ensiná-los.
“Nós não contratamos professor de matemática se queremos aprender física. Não
contratamos professor de educação física para dar aulas de português. Quem
ensina religião, os dogmas, são aqueles que acreditam na própria fé e naqueles
dogmas. Ora, um exército de professores que lecionam preceitos religiosos,
alguns contraditórios escolhidos pelo Estado, não configuram ensino religioso”,
assinalou.
Ao seguir Moraes, Edson Fachin argumentou que a democracia admite que a religião
faça parte não só da vida privada, mas também da esfera pública da sociedade,
contra a qual o Estado não pode nem deve atuar. “A separação entre Igreja e
Estado não pode, portanto, implicar o isolamento daqueles que guardam uma
religião à sua esfera privada. O princípio da laicidade não se confunde com
laicismo", afirmou.
Gilmar Mendes disse que a tentativa de implantar o modelo não-confessional é uma
forma de fazer o Estado “tutelar” a religião, um “domínio do chamado
politicamente correto”. Ele lembrou que a referência a Deus na própria
Constituição não retira o caráter laico do Estado, e destacou que a religião
cristã, por exemplo, faz parte da cultura da sociedade brasileira.
Dias Toffoli, por sua vez, disse não haver uma “separação
estanque” entre Estado e religião, citando vários trechos da Constituição
que não só impedem o poder público de embaraçar o exercício da fé, como também
promovem a liberdade de culto – em escolas e nos quartéis militares, por
exemplo.
Última a votar no julgamento, Cármen Lúcia também destacou o caráter facultativo
da disciplina. “Não fosse com conteúdo específico de alguma religião ou de
várias religiões, não vejo por que seria facultativa essa disciplina. Se fosse
história das religiões ou filosofia, isso se tem como matéria que pode
perfeitamente e é oferecida no ensino público”, afirmou.
Votos contra a promoção de crenças
Primeiro a votar no julgamento, em agosto, o relator, ministro Luís Roberto
Barroso, se posicionou pelo veto à admissão de professores “na qualidade de
representantes de confissões religiosas” – como padres, pastores, rabinos ou
pais-de-santo, por exemplo.
"As escolas privadas podem estar ligadas a qualquer confissão religiosa, o que
igualmente é legítimo. Mas não a escola pública. A
escola pública fala para o filho de todos, e não para os filhos dos católicos,
dos judeus, dos protestantes”, afirmou.
Rosa Weber acompanhou Barroso, sob o argumento da "neutralidade" do Estado. "Religião
e fé dizem respeito ao domínio privado, e não público. Neutro há de ser o Estado",
disse.
Luiz Fux, por sua vez, sustentou que seria impossível ao
governo contratar professores de cada uma das 140 religiões catalogadas no
Brasil.
"Qual será a autodeterminação religiosa de uma criança que
estuda desde sua primeira infância num colégio doutrinada para uma determinada
religião, sendo certo que é absolutamente
impossível o Estado contratar professores para 140 religiões hoje consagradas
pelos órgãos federais?", questionou.
Marco Aurélio Mello também considerou inviável às escolas
públicas brasileiras, em situação precária, oferecerem ensino confessional de
todas as crenças, considerando a ampla diversidade religiosa no país.
“É razoável supor que as escolas, ante a dificuldade de abranger integralmente o
espectro de religiões, limitem-se a disponibilizar turmas referentes às crenças
majoritárias. Ou mesmo aquelas com as quais a própria direção simpatize. O
quadro impõe ao Supremo atuar em defesa do pluralismo religioso e do Estado
laico”, disse.
Celso de Mello também defendeu neutralidade do Estado na matéria. “O
estado laico não pode ter preferências de ordem confessional e não pode,
portanto, interferir na esfera das escolhas religiosas. O
Estado não tem nem pode ter interesses confessionais,
ao Estado é indiferente o conteúdo das ideias religiosas que eventualmente
venham a circular e a ser pregados por qualquer grupo confessional, mesmo porque
não é lícito ao poder público interditá-las ou censurá-las”, afirmou.
<https://g1.globo.com/politica/noticia/supremo-permite-promocao-de-crencas-no-ensino-religioso.ghtml>
Isso é um precedente
muito perigoso para a liberdade de pensamento.
O que o ministro
Alexandre de Moraes chama
"total desrespeito à liberdade religiosa" é um
argumento distorcido para promover o cristianismo, uma vez que jamais haverá em
uma escola espaço para professores que professem quaisquer religiões de fora do
extenso grupo de fé cristã.
Tomar o espaço
educacional para promover religião, isso sim, é um desrespeito à liberdade
religiosa. Liberdade religiosa é a permissão da prática de todas as
religiões, não a promoção de determinadas religiões
a custa do erário público.
Persistindo esse
entendimento da maioria da corte suprema de justiça, fica aberto o espaço para
os políticos religiosos irem alterando aos poucos as regras jurídicas, uma vez
que o Estado já não é exatamente laico como se diz, e a qualquer momento, as
diversas correntes cristãs que agora estão unidas chegarem a um impasse em que a
que predominar possa aos poucos eliminar as outras, e até serem ressuscitados os
horrores da Idade Média, em que uma religião com poder político perseguia,
prendia, torturava e assassinava quem pensasse diferentemente de suas doutrinas.
Ademais, com já
acontecia no tempo em que estudei o primário, um aluno que não pertencer ao
cristianismo tende a sofrer buling dos demais que pertencem a famílias cristãs.
Quando estudei o
primário, minha professora fazia uma oração, acompanhada por todos os alunos,
antes de começar cada aula.
No dia que entrou nessa escola um menino filho de pais protestantes, alguns
meninos começaram a agredi-lo por não ser ele de família católica.
Imaginem se esse menino fosse filho de um ateu!
Esse é o risco que correrão nas escolas os alunos não cristãos após essa
legalização da promoção de religião nas escolas, já que, assim como órgãos
públicos brasileiros abrigam crucifixos e nunca símbolos de qualquer outra
religião, as escolas só terão professores cristãos.
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O RISCO DE UM ESTADO RELIGIOSO