ENTREVISTA DE BOLSONARO EM 22/08/2022
O que dizem especialistas sobre a entrevista de Jair Bolsonaro ao Jornal
Nacional
O presidente se sobressaiu ao falar de economia e da corrupção, avaliam
analistas. Em meio ambiente e pandemia, contudo, fracassou
Por Victor Ohana | 22.08.2022 23h13
O presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), durante sabatina no Jornal
Nacional. Foto: Reprodução
A sabatina ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no Jornal Nacional, da TV Globo,
foi marcada pela manutenção de suas posições em
diferentes assuntos e pelo não compromisso com o resultado das eleições deste
ano. É o que destacam três especialistas ouvidos por CartaCapital
nesta segunda-feira 22.
O reconhecimento da apuração dos votos foi tema da primeira pergunta da
sabatina, feita pelo âncora William Bonner, que citou ofensas feitas pelo
presidente da República a ministros do Supremo Tribunal Federal.
O presidente da República negou ter proferido xingamentos
e acusou o apresentador de divulgar “fake news“, mas
foi confrontado com os registros de declarações
agressivas ao ministro Alexandre de Moraes.
Bolsonaro citou, como argumento para levantar suspeitas sobre as urnas, a
existência de um inquérito sobre a invasão hacker ao sistema eleitoral em 2018,
caso em que o Tribunal Superior Eleitoral já disse não ter provocado nenhuma
alteração no resultado.
Logo depois, Bolsonaro diz que espera que a relação com o TSE tenha sido
pacificada e mencionou o que chamou de “contato amistoso” com Moraes durante a
posse na Corte na semana passada.
O presidente disse que “pode ter certeza que teremos eleições limpas e
transparentes no corrente ano”, mas quando foi questionado se assumiria o
compromisso de respeitar o resultado das urnas, seja ele qual for, o chefe do
Executivo não foi objetivo.
“Seja qual for. Eleições limpas serão, devem e têm que ser respeitadas. Limpas e
transparentes, têm que ser respeitadas”, afirmou. Logo em seguida, Bonner disse
que está atestado que as eleições brasileiras são limpas, transparentes e
auditáveis, e repetiu o questionamento. Bolsonaro continuou: “Serão
respeitados os resultados das urnas, desde que as eleições sejam limpas e
transparentes. Como você diz que são auditáveis, se em 2014 não aconteceu
isso? Mas tudo bem, vamos botar um ponto final nisso? Tá resolvido, ponto final,
vamos para outra pergunta, outro assunto. Vamos respeitar o resultado das
urnas.”
Para Felippe Mendonça, Bolsonaro fez uso de um “jogo de palavras” para
que depois “não seja cobrado por ter afirmado que respeitaria as eleições”.
Na prática, na visão do professor, o presidente da
República “reforçou que, somente se ele considerar que as eleições foram limpas,
ele irá aceitar”.
Na mesma linha, o cientista político Ricardo Fagundes Leães observou que
Bolsonaro “tentou adotar um tom mais moderado, mas não assumiu o compromisso em
reconhecer o resultado das urnas”.
Na opinião de Danilo Martuscelli, também cientista político, Bolsonaro
utilizou um discurso ambíguo e evasivo – moderado, inclusive, quando comparado
às suas declarações nos palanques das manifestações.
“No final das contas, acabou sustentando que deseja eleições limpas e
transparentes e que as coisas estão pacificadas com o STF. Também afirmou que
não pode sustentar o fechamento do Congresso e do STF e uma intervenção militar,
mas também não vai criminalizar a sua base social que sustenta essas posições.”,
avalia. “Novamente uma contradição flagrante. Foi um ponto ruim, não foi
convincente.”
Na economia, Bolsonaro ‘nadou de braçada’
Questionado sobre a situação econômica, Bolsonaro enalteceu o auxílio
emergencial e citou dados sobre a redução do desemprego, do preço dos
combustíveis e da inflação.
O presidente disse que houve “promessas frustradas” devido à ocorrência da
pandemia, ao registro de secas históricas e à deflagração da guerra entre a
Rússia e a Ucrânia, mas disse que o governo federal fez “a sua parte”.
“Dados de hoje mostram o Brasil com deflação, com inflação menor que Inglaterra
e Estados Unidos. A taxa de desemprego tem caído. Os números da economia são
fantásticos“, disse o presidente, sem mencionar que a inflação dos preços dos
alimentos continua alta e que 33 milhões de pessoas estão em situação de fome.
“Isso é sinal de competência da equipe econômica.”
Para Martuscelli, Bolsonaro começou a crescer na sabatina durante a etapa da
economia.
“Aqui ele nadou de braçada, no sentido de que ele foi mostrando que os
resultados obtidos agora são comparativamente melhores que os de outros países,
como a Inglaterra e os Estados Unidos”, avaliou o professor.
Bolsonaro ‘se atrapalhou’ com meio ambiente, mas foi bem em corrupção
O presidente da República foi confrontado com a falta de fiscalização de alertas
do desmatamento, o desmonte de instituições que trabalham com o combate às
devastações e o crescimento de índices negativos de preservação ambiental na
Amazônia.
Em sua resposta, minimizou as queimadas ao dizer que elas são comuns em outros
países e citou percentuais de preservação nas propriedades rurais. Além disso,
acusou o Ibama de praticar “abuso” contra proprietários rurais e se queixou de
uma suposta omissão da imprensa sobre casos de desmatamento no exterior.
“Na França, há mais de 30 dias está pegando fogo. Na Califórnia, pega fogo todo
ano. No Brasil, não é diferente. Acontece”, declarou Bolsonaro.
Para Felippe Mendonça, Bolsonaro “se atrapalhou” na resposta. O momento crítico,
aponta, veio quando o presidente teve de responder sobre o uso de tratores em
áreas de desmatamento ilegal.
Fagundes Leães também acredita que Bolsonaro “não conseguiu explicar
adequadamente as questões da Amazônia”, mas pontua que Bolsonaro voltou a
recuperar o controle quando foi questionado sobre o tema da corrupção, em que
deixou de lado a postura defensiva e atacou os governos petistas.
Na mesma linha, Martuscelli crê que Bolsonaro se saiu bem ao tratar sobre a sua
relação com Centrão. Nesse trecho, o presidente afirmou que Bonner o estimulou a
se tornar um ditador, porque supostamente estaria cobrando do governo que
ignorasse a existência de mais de 300 parlamentares do bloco no Congresso.
“Se eu deixar de lado, vou fazer o quê? São 513 deputados e 300 pejorativamente
chamados de Centrão”, disse Bolsonaro.
Nas considerações finais, Bolsonaro mencionou a queda do preço dos combustíveis,
a criação do Pix, a anistia de dívidas de estudantes do Fies, o oferecimento do
Auxílio Brasil e a finalização da transposição do Rio São Francisco.
“Claramente, Bolsonaro buscou atingir um público mais amplo do que seus
eleitores mais fiéis, mas não mudou suas posições fundamentais em nenhuma área”,
avaliou Fagundes Leães. “Acho que não saiu derrotado da entrevista, mas não
tenho motivos para acreditar que cresceu entre os eleitores que precisa.”
Victor Ohana
Repórter do site de CartaCapital
Tags: eleições 2022, Jair Bolsonaro, Jornal Nacional,
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