O ANO FORA DO EIXO
- 01/01/2003 -
Por que comemoramos o ano novo em 1º de janeiro? Isso sempre foi
assim? Custou-me muito tempo descobrir por que temos essa data. Pesquisei bastante, uma vez
que tinha certeza de que os criadores da medida do tempo começavam o ano em data
bem diferente. Nenhuma razão astronômica encontrei para iniciarmos o ano no dia
em que o começamos. Certo dia, porém descobri que a distorção ficou por conta da
Lua, que não se ajusta ao movimento do Sol ao mesmo tempo que foi muito
utilizada como marca da passagem do mês. E o papa Gregório perdeu uma boa
oportunidade de corrigir isso.
Em época muito remota, o homem criou números para quantificar
suas provisões de alimentos, seus animais e outras coisas de que apossasse e,
muito tempo depois, resolveu dimensionar também o tempo. A nossa palavra
“digital”, tão utilizada em informática, deriva do fato de a humanidade ter
começado a contar as coisas comparando com os dez dedos das mãos, o que deu
origem à nossa ordem decimal.
Os sacerdotes caldeus, criadores da Astrologia e da Astronomia,
idealizaram também as medidas do tempo com base na translação da Terra, que dá o
aparente movimento do Sol. Criaram a subdivisão mensal, baseando-se na revolução
da lua, e a semana, em honra aos sete astros do sistema solar que conseguiram
distinguir das estrelas: Sol, Lua, Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno (a
disposição aqui está na ordem dos dias da semana).
Se você hoje trabalha seis dias e tem um de descanso, dê graças
ao limite da visão astronômica dos caldeus, que não conseguiram avistar Urano,
Netuno e Plutão. Se eles os tivessem avistado, nós teríamos, em vez da semana,
uma “demana”, tendo um dia de descanso em cada dez, em vez de um em sete.
Os criadores das medidas do tempo começavam o ano no equinócio da
primavera setentrional (do outono para nós do Sul). Mas os povos subseqüentes utilizaram
razões políticas ou outras não astronômicas, mudando as datas, até que chegou a
nós um ano começando em um dia que não coincide com nenhum dado astronômico
importante. Entretanto, essa falta de coincidência não está totalmente desligada
dos astros.
Observando os nomes setembro, outubro, novembro e dezembro, já
temos uma idéia de que no passado o primeiro mês era março. Mas não é só isso.
Os meses começavam nos dias correspondentes aos signos que conhecemos
atualmente. Assim, o ano deveria iniciar num dia correspondente mais ou menos a
21 de março do nosso calendário, o primeiro dia do signo de áries, coincidindo
com o equinócio.
À semelhança dos dias da semana, vários meses também receberam
nomes de deuses, com exceção do quinto, que homenageou Júlio César (julho), o
sexto, que foi dedicado a Augusto César (agosto) e do sétimo ao décimo, que
ficaram com os nomes correspondentes à ordem de contagem: setembro (sétimo),
outubro (oitavo), novembro (nono) e dezembro (décimo). Como os fundadores do
monoteísmo, os hebreus, não admitiam astrologia, criaram o mito de que Yavé
fizera todo o universo em seis dias e descansara no sétimo, dando-lhe o nome de
“shabath” (repouso), “sabbaton” para os gregos, “sabatum” para os romanos,
“sabato” para os italianos e “sábado” para nós. No calendário romano, o sétimo
dia era o dia de Saturno (dies saturni). Os cristãos romanos adotaram o nome “sabatum”,
versão latina do grego "sabbaton", “shabath” dos hebreus; alguns séculos depois
mudaram o primeiro dia, dia do Sol (dies solis), para “dies dominicum” (dia do
Senhor); e “o papa Silvestre I, líder cristão entre 314 e 335, ... dividiu a
semana da seguinte maneira: feria prima, feria secunda, feria tertia, feria
quarta, feria quinta, feria sexta e feria septima” (Superinteressante,
dez/1999). A palavra “feria” significava comemoração. Mas o povo não gostou da
nomenclatura papal, exceto os portugueses, que a incorporaram parcialmente na
semana, como temos hoje com pequena alteração da língua, porém não substituíram
o sábado hebreu nem o domingo cristão, nome que não existiu nos dias
em que se escreveram os livros que compõem o chamado Novo Testamento. Os apóstolos se referiam a fatos ocorridos no “primeiro dia da
semana” sem dar nenhum título a esse dia (Mateus, 28: 1; Marcos, 16: 1: Lucas:
24: 1; João 20: 1; Atos, 20: 7; I Coríntios, 16: 2).
Eu sempre achei muito estranho termos o ano iniciado poucos dias
depois do solstício, em lugar de começar nesse dia. Nenhuma posição astronômica
especial parecia justificar essa data. Se o ano iniciasse no natal, haveria uma
grande razão sociológica, porque, embora Jesus de Nazaré, se existiu, deva ter
nascido em data diferente, esse é o dia em que os cristãos comemoram o seu
nascimento. Entretanto, o primeiro de janeiro deixou o ano fora do eixo
planetário.
Após muita pesquisa e até pergunta a uma revista, da qual nunca
tive resposta, um dia encontrei uma matéria que dizia que Júlio César determinou
que o primeiro ano do seu novo calendário deveria começar com a primeira
lua-nova que se seguisse ao solstício meridional. E, como a lua, embora naquele
tempo utilizada para marcar início de mês, não coincide com a rotação da Terra,
naquele ano iniciou a fase nova bem depois do solstício. E, depois que os meses
passaram a ser dissociados das fases lunares, o ano passou a iniciar sempre
nessa data, mais de uma semana depois do solstício. E o papa Gregório, embora
criando um calendário baseado no nascimento do suposto salvador da humanidade,
perdeu a oportunidade de colocar o início do ano no solstício; pois, como já
tinham definido a comemoração do nascimento de Jesus em 25 de dezembro e mudado
a contagem do tempo para o ano do nascimento dele, deveria ter antecipado o
início do ano para essa data. Mas parece que não pensou bem.
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