O COMPLEXO UNIVERSO IMAGINÁRIO DO HOMEM 

-  ORIGEM DA RELIGIÃO -

24/04/2001

 

 

Tudo começou com microorganismos, mas a maravilhosa evolução biológica aperfeiçoou tanto os seres vivos, até chegar à complexidade do ser humano, que criou o mais complexo mundo imaginário, complicando sobremodo o mundo real.

 

As primeiras almas viventes, unicelulares, não pararam em sua simplicidade. Progressivamente, pluricelulares vinha à existência, como derivados daquelas vidas primitivas. Em milhões de anos, uns se tornaram grandes e fortes; outros ficaram extremamente ágeis, para se livrarem daqueles; outros sintetizaram venenos poderosos para fazer face aos ataques dos inimigos; muitos criaram asas para se desprenderem do solo e ficarem longe do alcance de seus predadores; espécies e mais espécies desenvolveram seus mais variados meios de sobrevivência.

 

Um dos animais, posto não privilegiado com o desenvolvimento de força e tamanho, nem asas, nem veneno, sobreviveu a todas as ameaças e destacou-se entre todos os outros pelo aperfeiçoamento da comunicação. Da onomatopéia (formação de palavras por imitação dos sons das coisas), chegou ao mais aprimorado código sonoro (a fala) e daí, ao gráfico, o que permitiu a transmissão de experiências e o avanço científico que nos rodeia e se desenvolve cada vez mais vertiginosamente.

 

Artificialmente, graças à capacidade de inventar e de acumular experiência, o homem superou em muito os olhos da águia, enxergando a anos-luz; conseguiu substituto eficiente para as asas das aves; criou armas muito superiores aos dentes dos felinos, aos chifres dos bovinos e ao veneno das serpentes.

 

A enorme criatividade humana, em um mundo tão misterioso, cheio de fenômenos incompreensíveis, buscando explicações para tudo isso, produziu um universo imaginário riquíssimo em personagens sobrenaturais. Em sua imaginação, o animal inteligente povoou a Terra e os céus de deuses, anjos, demônios, duendes, almas imateriais (fruto do sonho), com um sem-número de invisíveis entidades sobre-humanas, dominadoras dos destinos dos homens.  Assim surgiram as milhares de religiões que infestam o mundo inteiro até hoje.

 

O homem do passado (e mesmo alguns de hoje) ouviu as vozes dos deuses no trovão e nos ecos de seus próprios gritos; sentiu o poder maléfico dos demônios nas pessoas acometidas de distúrbios mentais; agradeceu as bênçãos divinas, expressas na chuva, no crescimento das plantas e outros frutos da natureza, com sacrifícios de animais e - que barbaridade!!! - até de seus semelhantes. Em todos os tempos, tudo para que o homem não encontra uma explicação plausível tende a ser atribuído a entidades sobrenaturais.

 

A inteligência, para possibilitar a convivência, exigiu a criação de normas para conter os nossos impulsos egoístas. Religião, Moral, Direito, Etiqueta, tudo foi criado para limitar a completa realização da nossa vontade e até impedir que sejamos verdadeiramente nós mesmos; mas com razão: sem nenhuma dessas regras de conduta, o mundo certamente estaria pior do que se acha hoje. A liberdade sem limites não funciona.

 

Para ironia do homem, a religião, que deve ter sido o primeiro código de conduta humana, é hoje a maior causa de guerras, como deve ter sido no passado também. A maioria das mortíferas batalhas dos nossos dias são entre muçulmanos e cristãos; porém não é só: cristãos contra cristãos se envolvem vorazmente, desta forma tão anticristã (Jesus pregava a paz e a tolerância, segundo autores dos livros que vieram a compor o chamado Novo Testamento). Haja vista o duradouro embate catolicismo-protestantismo na Irlanda do Norte. Os mais tenebrosos, mais caóticos, mais injustos, mais hediondos períodos da nossa história foram dominados por poderes político-religiosos.

 

Como nossas democracias, além de poderes legislativo, executivo, judiciário, até outros, têm ministro da guerra, ministro da saúde, ministro da agricultura, ministro da cultura, ministro dos esportes, ministro dos transportes, ministros e mais ministros, de se perder a conta, a teocracia do homem primitivo criou uma infinidade de deuses: deus da guerra, deus da chuva, deus do fogo, deus do mar, deus dos rios, deus da fertilidade, deusa do amor, deuses benignos e deuses malignos, havendo divindades para todos os fenômenos da natureza. O próprio homem, como uma alternativa contra a morte, passou a contar com ressurreição (céu para os bons e inferno para os maus) e reencarnação (novas vidas para aperfeiçoamento espiritual, etc.) Como qualquer outro ramo intelectual, os mandamentos divinos se diversificaram como as línguas dos homens. Enquanto no antigo Egito relações sexuais compunham ritos sagrados, o sexo para os hebreus estava ligado a uma série de pecados, que podiam conduzir à pena de morte. E a abominação ao sexo se arraigou de tal modo também no Cristianismo, que chegou ao celibato de ministros religiosos. Não se aboliu por completo o ato sexual, por ser o único meio de perpetuação da espécie. Nem só por isso, entretanto: a humanidade não se submeteria jamais a tal grau de santificação, abstendo-se daquilo que é a coisa mais desejável na vida de quase todos.

 

A eterna luta entre o bem e o mal, dois valores não tão distinto (algo que é bom para uns pode ser ruim para outros), tem-se apropriado igualitariamente de todos os desenvolvimentos científicos ao longo dos séculos e milênios, sendo assim possível utilizar-se de tudo que se inventa para o bem ou para o mal.

 

O vasto politeísmo criado pela sociedade primeva evoluiu para a redução a apenas duas divindades entre os antigos persas: Masda, o deus do bem, e Arimã, o deus do mal. Todavia, a centralização divina não parou por aí. Para os hebreus, já não ficou lugar para dois deuses: Jeová, ou Yavé, é o único Deus, criador de todas as coisas, e os outros são frutos da criação humana. Para agente do mal, só ficou o cargo de anjo caído, ocupado por Satan, o popular Diabo, anjo que se rebelou contra o céu, levando consigo uma legião de outros anjos, os demônios, que dominavam as pessoas sofredoras de doenças mentais graves, os loucos, que eram chamados de endemoninhados.

 

E, como o homem duvida e testa tudo que vê ou ouve, surgiu ainda o ateísmo, ideologia que exclui a existência de qualquer divindade.

 

Hoje, embora predomine o ateísmo no mundo científico, ainda há cientistas que creem na existência de um criador de todas as coisas, sem, no entanto, se poder provar cientificamente a existência ou a inexistência de qualquer deus. O fator a reforçar o ateísmo atualmente são as provas científicas dos enganos contidos em muitas afirmações tidas como de procedência divina. Mas a religião, resultado das tentativas de explicar do inexplicável, não se extingue facilmente, e o animal imaginário que o homem transformou no criador de todas as coisas ainda continua ameaçando o mundo.

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