LEGALIZAÇÃO DA PROSTITUIÇÃO
por Isabel Moreira
13/02/2015
Temos de enfrentar este tema sem rodeios. O tráfico de mulheres e a exploração
de mulheres através da prostituição é um flagelo. Vale a pena ler a tese da
Alexandra Oliveira – O mundo da prostituição de rua: trajetórias, discursos e
práticas – a qual reúne a investigação da Professora da Faculdade de Psicologia
e Ciências de Educação da Universidade do Porto no sentido de que se deve
profissionalizar o trabalho sexual.
O primeiro argumento a favor da profissionalização do trabalho sexual é o de que
a exploração do homem ou da mulher em causa advém das condições em que trabalha,
precisamente este limbo em que o lenocínio é crime e a prostituição é zona de
ninguém.
O discurso amigo do combate ao tráfico das mulheres esbate-se com a prática
policial concreta de expulsão dos imigrantes ilegais prostitutos ou prostitutas
numa rusga a uma casa de alterne, quando melhor seria exigir a quem lhes oferece
trabalho sexual um contrato legítimo e condições dignas de existência.
Várias investigações demonstram que à exceção de redes de tráfico – uma outra
realidade, de resto obscena – o perfil atual da prostituição é caracterizado
pela escolha. Mesmo havendo fatores estruturais mais fortes nuns casos do que
noutros, há uma grande margem de escolha, cujas razões são múltiplas, podendo
uma delas ser, pura e simplesmente, ganhar dinheiro mais rapidamente.
É também um mito – sobretudo dirigido às mulheres – a ideia de que as
prostitutas e os prostitutos são seres humanos encerrados num estigma, amorais,
sem vida privada. Não é verdade. Têm relações como quaisquer outras pessoas, têm
tanta propensão para a monogamia como quaisquer outras pessoas, não valendo aqui
a piada de isso não ser por natureza possível, precisamente porque
o sexo com os
seus companheiros faz parte da vida amorosa e o resto, goste-se ou não se goste,
é, de facto, trabalho.
Também não vale a pena, parece-me, tentar eliminar os clientes, porque estes são
pessoas de todos os estratos sociais, são as pessoas que se sentam ao nosso
lado, não são um nicho pequenino de perversos.
Sei que o tema é complicado e que há argumentos a ter em conta. Mas estou
cansada da invocação das janelas da Holanda, como se existisse um único modelo
de regulamentação. Ali, naquele país, temos uma abordagem específica da
prostituição, o que não entendo.
De resto, há muita coisa que não entendo. Não gosto de retirar do Código Penal
comportamentos, como a prostituição ou o consumo de drogas e ficar com uma ordem
jurídica esquizofrénica em que vender é crime, mas snifar não e em que
ser
proxeneta é crime e ser prostituta não é nada, nem lícito, nem ilícito.
Deixo a pergunta: não seria mais coerente os trabalhadores do sexo terem um
contrato de trabalho comum, com descontos, com impostos, com acesso a coisas da
vida como um crédito para a habitação? Não seria melhor minorar as agressões por
que esta gente passa numa zona a que o Direito vira as costas e deixa andar?
<http://mariacapaz.pt/cronicas/legalizacao-da-prostituicao-por-isabel-moreira/>
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