|
|
|
|
Religiões antigas adoravam o gato. Mas o Cristianismo o satanizou.
Um novo
olhar sobre o gato
Com
seu ar enigmático, ele já foi associado a deuses e demônios ao longo da
história. Hoje, após milênios de convivência com o homem, o bichano é o
animal de estimação mais adaptado à vida moderna e um aliado
considerável na hora de cuidarmos da nossa saúde
Paola
Bello
Dona Luiza*, 65 anos, ficou viúva
neste ano. Para piorar, não podia contar com o apoio dos filhos, que viviam
distantes dela, física e afetivamente. Por conta disso, além de tremores nas
mãos, passou a ter problemas estomacais, enxaquecas e dores musculares.
Mesmo nesse estado, ela teve disposição para recolher um gato que fora
atropelado na rua onde mora. O que era apenas um ato de solidariedade acabou
virando uma estratégia que, em vez de uma vida, pode estar salvando duas.
Entre as idas e vindas ao
veterinário, ela e o gatinho vira-lata começaram a participar de sessões de
zooterapia. Nelas, percebeu que, ao assumir a responsabilidade de manter o
animal vivo e bem cuidado, dona Luiza exigia saúde e bem-estar de si mesma.
Em conseqüência, conseguiu purgar a perda do marido e resgatou o
relacionamento com os filhos.
Casos como esse entram para a
contabilidade que está ajudando os felinos a atenuar o estigma de
interesseiros e anti-sociais. Com isso, ganham mais espaço nos lares. No
Brasil, eles são um para cada 12 habitantes - há um cachorro para cada 6
brasileiros. Entretanto, veterinários, zooterapeutas e o mercado de
alimentos para animais apostam na tendência de o gato se tornar o animal do
futuro. Pudera, as famílias estão se tornando menos numerosas, os lares
estão cada vez menores, e as pessoas estão passando muito menos tempo em
casa. Se há um bicho que consegue se adaptar bem a esse quadro, é o gato,
que vem dividindo o ambiente com os humanos há muito tempo.
|
Toma lá, dá cá
Apesar do
temperamento de caçador solitário, o gato aprecia a proximidade com
os humanos. E, claro, sabe que vai sobrar comida nesse açougue em
Marrocos |
Quando o homem começou a procurar
um local para chamar de lar, lá estava o gato. Logo que desenvolveu a
agricultura - entre 10.000 e 12.000 a.C. -, deixou de ser nômade e começou a
estreitar os laços de amizade com os felinos. E tudo teve início como uma
troca de favores: o homem passou a armazenar alimento; com a estocagem de
grãos, vieram os roedores, que, por sua vez, atraíram os gatos. O mais
antigo fóssil que comprova essa amizade é de 9.500 a.C. Descoberta em 2004,
a ossada de um gato selvagem dividia a tumba com a de um humano. O achado
derruba a tese de que os egípcios teriam sido os pioneiros na domesticação
dos felinos, em aproximadamente 2000 a.C., já que o fóssil foi encontrado na
ilha mediterrânea de Chipre.
Pelo tamanho da ossada, o primeiro
amigo felino não devia ter mais de 8 meses de vida, o que indica que teria
sido morto para acompanhar a dona após a morte. Porém, o indício mais forte
da amizade consiste no fato de que, nenhum gato, de espécie alguma, é nativo
da ilha de Chipre. Para a existência desse fóssil, a hipótese mais provável
é a de que os próprios moradores da ilha viajaram cerca de 70 quilômetros,
até a Turquia, onde adquiriram o animal e o levaram para a vila.
"Pesquisando os componentes
genéticos de gatos selvagens da Europa, da Ásia, da África e do Oriente
Médio, concluímos que realmente a domesticação começou na ilha de Chipre,
com gatos provenientes do Crescente Fértil [região entre os rios Nilo, Tigre
e Eufrates, onde iniciou a agricultura]", afirma Stephen O'Brien, chefe do
laboratório de diversidade genômica no Instituto Nacional do Câncer, em
Maryland, EUA.
De deuses a demônios
Séculos de convivência - e o ar enigmático dos felinos - fizeram com que,
além de aliados, os gatos passassem a ser considerados um canal para
diálogos com o divino. "No Antigo Egito, acreditava-se que eles tinham
propriedades espirituais e que eram capazes de se comunicar com divindades",
diz Elaine Evans, professora da Universidade do Tennessee e curadora do
museu McClung (no campus da universidade, em Knoxville), que desde 2001
abriga uma exposição de gatos mumificados.
No início, os egípcios cultuavam
os leões. O gato selvagem, que mais parecia um leão em miniatura, começou a
ser introduzido na mitologia. Assim, os deuses passaram a ganhar atributos e
temperamentos ainda ligados aos leões, mas adaptados ao comportamento dos
bichanos. "O gato representa a civilização, relação feita a partir da
agricultura. Também representa o Sol, por ficar bastante tempo deitado na
areia se bronzeando. Essas características foram atribuídas ao deus-sol Rê,
metade homem, metade gato", afirma Antonio Brancaglion Jr., egiptólogo e
professor no Museu Nacional do Rio de Janeiro.
|
Quem mandou?
A
Inquisição condenou os gatos à morte. A Europa pagou caro por isso,
pois, proliferando à vontade, os ratos disseminaram a "peste negra"
|
Com a popularização dos rituais
fúnebres envolvendo a mumificação, os gatos passaram a acompanhar seus donos
até a eternidade. A mais antiga múmia de gato conhecida data de 1.500 a.C.
Apenas na cidade de Beni-Hassan, na margem leste do rio Nilo, mais de 300
mil múmias felinas foram encontradas. Também há registros de cemitérios
gigantescos nos arredores do Cairo, com mais de 4 milhões de gatos
mumificados.
Essa aura de adoração não ficou
enterrada nas tumbas egípcias. Séculos depois, nas comunidades gregas e
romanas, eram comuns imagens e cultos às deusas Háthor e Bastet. Baseados
nessas duas divindades, os gregos também transferiram ao gato alguns
atributos de Afrodite, a deusa do amor e do prazer sexual, e associaram a
agilidade e a rapidez dos bichanos para a fuga a Ártemis, a deusa da caça.
Da mesma forma, os romanos associaram a feminilidade felina à deusa Diana,
da caça e da fecundidade, e relacionavam o bichano à deusa Vênus, da
sensualidade e das emoções maternas.
Já na era
cristã, a Inquisição veio para pôr um fim na paz entre humanos, gatos
e divindades. "O bichano só começou a ser visto de forma negativa a partir
do cristianismo, na Idade Média. Essa ligação maligna foi feita justamente
porque era um animal atribuído aos deuses pagãos. Com a Inquisição, tudo que
não era da religião católica era do mal e deveria ser queimado na fogueira",
afirma Brancaglion. Profissões que tinham qualquer ligação com o gato também
foram condenadas. As parteiras, por exemplo, usavam a deusa Bastet como
símbolo e, por isso, foram tachadas de bruxas. No
século 13, a perseguição foi ainda maior. Com a promulgação de bulas nas
quais condenava os gatos, especialmente os de cor preta, associado ao
satanismo, o papa Gregório IX determinou a exterminação de centenas de
felinos.
A humanidade pagou caro por esse
destempero da Inquisição. Com a redução da população felina, os ratos
tomaram conta do pedaço. Falta de saneamento, condições precárias de higiene
e tráfego de navios infestados de roedores ajudaram a deixar o século 14
marcado na Europa pela pandemia da peste bubônica. Transmitida através da
picada de pulgas infectadas por ratos doentes, a "peste negra" dizimou cerca
de um terço da população européia.
<http://revistagalileu.globo.com/Revista/Galileu/0,,EDG84040-7943-204,00-UM+NOVO+OLHAR+SOBRE+O+GATO.html>
Só mais uma do Cristianismo. Nem
os gatos escaparam do representante de Cristo.
Ver mais
MALEFÍCIOS DA RELIGIÃO
|
..
|
. |
|
|