A ÁGUA E OS IDOSOS (28/03/2009)
Arnaldo Lichtenstein

"ÁGUA E ENVELHECIMENTO‏

Sempre que dou aula de Clínica Médica a estudantes do quarto ano de Medicina, lanço a pergunta: "Quais as causas que mais fazem o vovô ou a vovó terem confusão mental?"

Alguns arriscam: "Tumor na cabeça:".   Eu digo: "Não".

Outros apostam: "Mal de Alzheimer". Respondo, novamente: "Não".

A cada negativa a turma espanta-se. E fica ainda mais boquiaberta quando enumero os três responsáveis mais comuns:
diabetes descontrolado;
infecção urinária;
a família passou um dia inteiro no shopping, enquanto os idosos ficaram em casa.

 

Parece brincadeira, mas não é. Constantemente vovô e vovó, sem sentir sede, deixam de tomar líquidos. Quando falta gente em casa para lembrá-los, desidratam se com rapidez.  A desidratação tende a ser grave e afeta todo o organismo. Pode causar confusão mental abrupta, queda de pressão arterial, aumento dos batimentos cardíacos ("batedeira"), angina (dor no peito), coma e até morte.  Insisto: não é brincadeira.

 

Ao nascermos, 90% do nosso corpo é constituído de água.

Na adolescência, isso cai para 70%. Na fase adulta, para 60%.

Na terceira idade, que começa aos 60 anos, temos pouco mais de 50% de água.

 

Isso faz parte do processo natural de envelhecimento. Portanto, de saída, os idosos têm menor reserva hídrica. Mas há outro complicador: mesmo desidratados, eles não sentem vontade de tomar água, pois os seus mecanismos de equilíbrio interno não funcionam muito bem. Explico: nós temos sensores de água em várias partes do organismo. São eles que verificam a adequação do nível.  Quando ele cai, aciona-se automaticamente um "alarme".  Pouca água significa menor quantidade de sangue, de oxigênio e de sais minerais em nossas artérias e veias. Por isso, o corpo "pede" água. A informação é passada ao cérebro, a gente sente sede e sai em busca de líquidos.  Nos idosos, porém, esses mecanismos são menos eficientes. A detecção de falta de água corporal e a percepção da sede ficam prejudicadas. Alguns, ainda, devido a certas doenças, como a dolorosa artrose, evitam movimentar-se até para ir  tomar água.

 

Conclusão: Idosos desidratam-se facilmente não apenas porque possuem reserva hídrica menor, mas também porque percebem menos a falta de água em seu corpo. Além disso, para a desidratação ser grave, eles não precisam de grandes perdas, como diarréias,  vômitos ou exposição intensa ao sol. Basta o dia estar quente - e o verão já está aí - ou a umidade do ar baixar muito - como  tem sido comum nos últimos meses. Nessas situações, perde-se mais água pela respiração e pelo suor. Se não houver reposição  adequada, é desidratação na certa. Mesmo que o idoso seja saudável, fica prejudicado o desempenho das reações químicas e funções de todo o seu organismo.

 

Por isso, aqui vão dois alertas.


O primeiro é para vovós e vovôs: tornem voluntário o hábito de beber líquidos. Bebam toda vez que houver uma oportunidade.  Por líquido entenda-se água, sucos, chás, água-de-coco, leite. Sopa, gelatina e frutas ricas em água, como melão, melancia,  abacaxi, laranja e tangerina, também funcionam. O importante é, a cada duas horas, botar algum líquido para dentro.  Lembrem-se disso!

 

Meu segundo alerta é para os familiares: ofereçam constantemente líquidos aos idosos. Lembrem-lhes de que isso é vital. Ao mesmo tempo, fiquem atentos. Ao perceberem que estão rejeitando líquidos e, de um dia para o outro, ficam  confusos, irritadiços, fora do ar, atenção. É quase certo que esses sintomas sejam decorrentes de desidratação. Líquido  neles e rápido para um serviço médico.

Arnaldo Lichtenstein (46)
Médico, é clínico-geral do Hospital das Clínicas e professor colaborador do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

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