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26/09/2009
Discurso criacionista faz a Santa Sé e a
Igreja Anglicana defenderem Charles Darwin
Thomaz Favaro
Jim Zuckerman/Corbis/Latin Stock |
METÁFORA CRISTÃ Afresco de Michelangelo, no teto da Capela Sistina, é uma representação simbólica da criação de Adão |
O reverendo anglicano Michael Reiss cometeu uma heresia. Em discurso na Inglaterra, há duas semanas, ele sugeriu que a teoria da evolução, de Charles Darwin, deveria ceder ao criacionismo parte de seu espaço no currículo escolar básico. O que se seguiu ao pronunciamento foi uma tempestade pública que só amainou com a demissão sumária de Reiss do cargo de diretor de educação da Royal Society, a mais prestigiada sociedade científica da Inglaterra. O episódio deu a oportunidade para duas das mais importantes confissões cristãs reiterarem seu apoio à teoria da evolução de Darwin. O primeiro veio da Igreja Anglicana, na qual o naturalista inglês foi batizado, que pediu perdão pela posição contrária de alguns de seus clérigos – mas não da instituição, que jamais o condenou – em relação a suas idéias: "Duzentos anos após seu nascimento, a Igreja da Inglaterra lhe deve desculpas pelos mal-entendidos". O segundo veio do presidente do Conselho para a Cultura do Vaticano, Gianfranco Ravasi, que reafirmou que não há contradições entre o evolucionismo e as idéias católicas.
The Bridgeman Art Library/Getty Images |
A ORIGEM DO HOMEM |
A Igreja Católica jamais condenou formalmente a teoria de Darwin, embora tenha mostrado certa relutância em aceitá-la nas primeiras décadas após a publicação de A Origem das Espécies, em 1859. A retomada das descobertas genéticas do monge austríaco Gregor Mendel, no século XX, permitiu à ciência comprovar a teoria evolucionista – até então controversa e puramente abstrata. Em 1950, o papa Pio XII afirmou que não há contradição entre a evolução e a doutrina cristã, posição reforçada por João Paulo II, em 1996. "Os primeiros mal-entendidos a respeito da aceitação da teoria da evolução pela doutrina católica referem-se a uma interpretação literal da narração bíblica da criação", disse a VEJA Rafael Martínez, sacerdote espanhol e professor de história da ciência da Pontifícia Universidade da Santa Cruz, em Roma. "Hoje sabemos que a sabedoria divina criou o mundo utilizando as forças da natureza."
A aversão atual às idéias de Darwin deve-se a um grupo de religiões, como algumas confissões de batistas, metodistas e pentecostais, que permanece preso à leitura ao pé da letra da origem do universo contida na Bíblia. São os criacionistas, um grupo minoritário, mas bem instalado em algumas regiões dos Estados Unidos. Felizmente, sua influência é diminuta fora do país, exceto por alguns casos pontuais, como o de Michael Reiss. Que assim continue.