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AS MEDIDAS DO TEMPO

"O TEMPO 

Por Carlos Drummond de Andrade


 "Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias,
 a que se deu o nome de ano,
 foi um individuo genial.
 Industrializou a esperança,
 fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
 
 Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar
 e entregar os pontos.
 
 Aí entra o milagre da renovação
 e tudo começa outra vez, com outro número
 e outra vontade de acreditar
 que daqui para diante vai ser diferente..."

 

Esse indivíduo genial parece que não precisou pensar em nada ligado ao cansaço humano; baseou-se em ciclos astronômicos.  Mas, sem essas medidas realmente as coisas ficariam mais cansativas mesmo.   Todo ano as pessoas parece esperarem alguma coisa de melhor sim.  

 

Quem inventou o ano não criou férias.  Talvez tenha criado o repouso semanal; mas não temos certeza disso, uma vez que quem nos trouxe repouso semanal foi o Judaísmo, seguido pelo cristianismo.   E, quem criou as medidas do tempo não foram os cristãos, nem os judeus, mas os caldeus.  

 

Os sacerdotes caldeus, ao inventarem as divisões do tempo, o ano (período de translação da Terra) e o mês (decurso de uma revolução lunar), criaram a semana (latim septimanas = sete manhãs) em honra aos sete astros que julgavam gravitar em torno da Terra.  “Inventaron... la semana dividida en siete días, en honor de los siete astros” (A. Malet, História del Oriente, pág. 118) Os nomes dos dias da semana no calendário romano, dies solis (dia do Sol), lunae (da Lua), martis (de Marte), miercolis (de mercúrio), juevis (de Júpiter), viernis (de Vênus) e saturni (de Saturno) mostram a adoração que tinham pelos sete componentes conhecidos do nosso sistema solar à época, excluída a Terra, que imaginavam ser o centro do sistema, em vez do Sol.  Iam além: tinham a Terra como o centro do universo. Os hebreus, que certamente não tinham informação da origem da semana (“septimanas” = sete manhãs), informaram que o criador do universo fez todas as coisas em seis dias e descansou no sétimo dia, estabelecendo o dever de não trabalhar no sétimo dia da semana. Mas a origem astrológica se confirma pelos nomes que várias línguas dão aos dias. Os cristãos primitivos, conforme escreveu Paulo aos cristãos de Colossos, não se submetiam aos preceitos de guardar “dias de festa, lua nova ou sábados” (Colossenses, 2:16). Todavia, posteriormente os cristãos romanos converteram o “dies solis” (dia do sol) em “dies dominicum” (dia do Senhor), em homenagem à ressurreição de Jesus, que teria ocorrido no primeiro dia da semana.  Posteriormente, “O papa Silvestre I, líder cristão entre 314 e 335, ... dividiu a semana da seguinte maneira: feria prima, feria secunda, feria tertia, feria quarta, feria quinta, feria sexta e feria septima.” (SUPERINTERESSANTE, dez/1999, pág. 21). “Féria” significava comemoração. Para o Papa Silvestre, todos os dias seriam sagrados. Embora tenhamos adotado os novos nomes dados pelo Papa, quanto ao sétimo dia prevaleceu a tradição hebraica e o primeiro ficou mesmo como domingo (dies dominicum ou dominicus dies).  Séculos depois, Napoleão III, que gostava muito de trabalhar, ou mais provavelmente, queria ver seus súditos trabalhando mais, substituiu a semana por um período de dez dias.  Esse novo calendário, por sua vez, não agradou a ninguém e foi revogado poucos anos depois.

 

Assim, herdamos dos caldeus e dos judeus algo que hoje nos faz bem. Temos um descanso semanal e, por norma legal posterior, um descanso anual: férias.    Mas é a passagem de um ano para outro que parece renovar mais as esperanças das pessoas mesmo.

 

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