“Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti
imagem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem embaixo na
terra, nem nas águas debaixo da terra; não te encurvarás diante delas, nem as
servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que
visito a iniqüidade
dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam, e
uso de misericórdia com milhares dos que me amam e guardam os meus mandamentos”
(Deuteronômio,5: 7-10).
Naqueles tempos, cada povo tinha seus deuses. Os dos outros eram falsos. Havia
deuses de todas as formas animais. Parece que a idéia original foi de que cada
deus fez suas criaturas à sua “imagem e semelhança”. E, como para os hebreus,
havia um único deus, todos os outros seriam falsos: “em cima no céu” havia as
“aves” (Deuteronômio, 4: 17), deificadas por povos vizinhos, “na terra”,
“quadrúpedes e répteis”, também os humanos (Deuteronômio, 4: 16, 17), e o mais
adorado era o boi; e “nas águas debaixo da terra”? Há águas debaixo da terra?
Sabemos que a Terra não está em cima de nada. Mas para o onisciente Javé, à
imagem e semelhança dos hebreus, a Terra estava como um disco a flutuar sobre o
oceano, e debaixo dela havia peixes e animais marinhos (Deuteronômio, 4: 18).
Esses também, se deificados, seria afronta ao grande Javé.
“Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos” - Para povo
tão bárbaro, ferir ou matar o filho por vingança contra o pai era coisa muito
natural. Seu deus não poderia deixar de ser como eles.
Ellen Gould White, com sua grande habilidade de adaptação das afirmações
bíblicas, escreveu:
"É inevitável que os filhos sofram as conseqüências das más
ações dos pais, mas não são castigados pela culpa deles, a não ser que
participem de seus pecados. Dá-se, entretanto, em geral o caso de os filhos
andarem nas pegadas de seus pais. Por herança e exemplo, os filhos se tornam
participantes do pecado do pai. Más tendências, apetites pervertidos e moral
vil, assim como enfermidades físicas e degeneração, são transmitidos como um
legado de pai a filho, até a terceira e quarta geração. Esta terrível verdade
deveria ter uma força solene para restringir os homens de seguirem uma conduta
de pecado". (Patriarcas e Profetas, p. 312).
Todavia, o registro de I Reis 11:34, 35 confirma a literalidade do mandamento e
refuta o argumento de E. G. White: "Todavia não tomarei da sua mão o reino todo;
mas deixá-lo-ei governar por todos os dias da sua vida, por amor de Davi, meu
servo, a quem escolhi, o qual guardou os meus mandamentos e os meus estatutos.
Mas da mão de seu filho tomarei o reino e to darei a ti, isto é, as dez tribos".
Jeová estaria vingando a idolatria de Salomão no seu filho, nos termos do
referido preceito.
Essa mentalidade irracional é ilustrada também na maldição de Noé sobre Canaã, o
filho de Cão. Cão teria rido da nudez de seu pai, Noé. A punição teria sido
lançada sobre seu filho, que nenhum desrespeito teria cometido, mas pagaria o
mal praticado pelo pai, segundo a “justiça” dos hebreus.
Resquício dessa “justiça” primitiva chegou até quase os nossos dias, atingindo
os filhos e netos de Tiradentes. Seu julgador sentenciou: "declaram o réu
infame, e seus filhos e netos, tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e
Câmara Real". Foi mais clemente do que o deus de Israel, injustiçando apenas os
filhos e netos. Felizmente nossa atual Constituição, de modo diverso, afirma:
"Nenhuma pena passará da pessoa do condenado" (CF/1988, art. 5º, XXV). Nossos
pecaminosos legisladores são mais justos.
Cobrar dos pais sobre os filhos é algo difícil de se aceitar numa sociedade mais
civilizada. Entretanto, para um povo de hábitos tão primevos, isso não era nada
errado, mas se enquadrava perfeitamente na justiça do seu deus, que, como todos
os outros, não poderia ser muito diferente de seu povo.
Esse mandamento mostra também um
deus implacável, que não perdoa quem busca outro deus. Como para os hebreus
todos os outros povos estavam excluídos do favor divino, todos os outros deuses
também deveriam ser banidos como obras das mãos dos homens.
Em suma, o primeiro
mandamento já nos apresenta um deus ciumento, vingativo, com um conceito muito
bárbaro de justiça e desconhecedor da geologia do mundo que ele próprio teria
criado.
Esse primeiro
mandamento já é suficiente para concluirmos que Yavé não é mais do que um
produto do pensamento daquele povo primitivo e terrorista.