Se do nada não por surgir nada, como
poderia surgir o ser perfeito criador de tudo?
“O teólogo do
século XIII, São Tomás de Aquino, propôs cinco provas para a existência de Deus
que ainda são aceitas de forma oficial pela Igreja Católica:
a realidade da mudança requer um agente de mudança;
a cadeia do acaso precisa basear-se numa causa primeira que não é causada;
os fatos contingentes do mundo (fatos que podem não ter sido como são)
pressupõem um ser necessário;
Observa-se uma gradação nas coisas desde o ponto mais alto até o mais baixo e
isto aponta para uma realidade perfeita, no ponto mais alto da hierarquia;
a ordem e o desenho da natureza solicitam, como fonte, um ser que possua a mais
alta sabedoria.
À cadeia de causas proposta por Tomás de Aquino não podemos deixar de
acrescentar a pergunta:
De onde não pode surgir o pouco pode surgir o muito?
Em outras palavras, se as
coisas que conhecemos não podem ter surgido no nada, pode do nada ter surgido o
criador delas?
Se a cadeia do acaso precisa basear-se numa causa primeira que não é causada,
por que essa causa primeira pode existir por si mesma?
Esse “ser que possua a
mais alta sabedoria” deveria ter uma origem como as outras causas, e assim não
se poderia chegar nunca à causa originária. É mais simples uma combinação
casual de alguns elementos evoluir por meio das reações química do que surgir
espontaneamente um ser perfeito e onisciente,
ser esse cuja onisciência já comprovamos que não
ultrapassava o conhecimento equivocado do homem do tempo em que foi escrito o
livro sagrado.
É comum ouvirmos dizer: O só fato de estarmos vivos é um milagre suficiente para
crermos que temos um criador.
Em realidade, o nosso organismo tem a capacidade de reagir contra os agentes
patogênicos invasores, que não são captados pela nossa consciência, capacidade
esta sem a qual não sobreviveríamos mesmo. Mas seria lógico imaginar que isso
não poderia evoluir do acaso e ao mesmo tempo crer que o criador dessa perfeição
não tenha precisado de outro criador? Nessa linha de pensamento de tudo depender
de uma inteligência criadora, necessário haveria de ter o criador do criador,
que teria sido criado por outro, numa linhagem infindável.
A evolução dos seres vivos, hoje aceita até pelo Papa, é algo inegável, que se
pode perceber na modificação dos vírus e bactérias e no desenvolvimento de
resistência que ocorre nos insetos. Se os fósseis encontrados pelos arqueólogos
mostram organismos tão mais simples quanto mais distante retrocedemos no tempo,
não há como continuarmos apegados à idéia de que tudo foi criado há seis
milênios, cada um segundo a sua espécie imutável.
Como se vê, o princípio de Tomás de Aquino não prova nada. A dúvida permanece.
Temos que continuar, como disse José Saramago, a procurar “um sinal de Deus”.
E como os textos bíblicos, conforme apresentado em “Ateu Graças a Deus”, capítulo
“ONDE ESTÁ A PERFEIÇÃO E A ONISCIÊNCIA?”, não mostram perfeição, justiça, nem
conhecimento perfeito do universo, só resta dar razão a Luis Buñuel, cineasta
espanhol, (1900-1983), quando disse: “Eu continuo ateu, graças a Deus” (SUPERINTERESSANTE,
julho/98, pág. 90). Pois, se a chamada palavra de Deus contém tantos enganos dos
quais não temos mais dúvida, como poderíamos acreditar que elas provenha de
inteligência sobre-humana onisciente?
O não termos explicação para um fato não é justificativa para inventarmos um
autor para ele. O homem criou Deus como resposta ao irrespondível, explicação do
inexplicável; mas nós não podemos acreditar na existência algo de que não haja qualquer indício,
só porque não temos explicação para algumas coisas. Se não temos informação do que
era antes do que conhecemos, não cabe a nós inventar uma explicação mais
improvável. Se do dana não vem nada, não podemos do nada tirar um ser
perfeito criador de tudo, além do que já está provado o quanto esse ser é falso.