O homem
primitivo, tentando explicar o inexplicável, criou deuses, demônios, anjos, etc.
e até foi capaz de imortalizar a si próprio. Mas isso não passa de um universo
imaginário.
“Ao sentir-se em lugares distantes, realizando os mais diversos feitos enquanto
permaneciam inertes durante o sono, esses humanos primevos, sem compreenderem o
fenômeno onírico, acreditavam estarem realmente naqueles lugares. E como eram
vistos dormindo em suas cavernas por seus familiares, a única explicação que
encontraram foi a existência de um lado imaterial de cada pessoa.
O que esses nossos remotos ancestrais não observaram, e até hoje há muitos que
não observam, é que, enquanto um indivíduo, em sonho, se achava a carregar para
sua caverna a fêmea preferida, poderia essa mulher estar, também em sonho,
vendo-se espreitada por outro troglodita, e esse, por sua vez, até estar
sonhando com uma implacável perseguição àquela caça necessária para o seu
jantar. Para comprovar esse fato, basta você, ao sonhar com alguém, perguntar no
dia seguinte se essa pessoa sonhou com você. Raramente você terá resposta
afirmativa, e a coincidência de fatos dos sonhos tem muito menos probabilidade
do que acertar em uma loteria. Isso é uma das provas incontestes de que o sonho
é apenas imaginação. Se essa alma existisse, encontrando com outra alma no
sonho, teríamos cem por cento de reciprocidade, ou seja, quando você sonhasse
com alguém, esse estaria inevitavelmente sonhando com você.” (João de Freitas,
em “Ateu Graças a Deus”, págs. 83-85).
A crença em uma existência imaterial do ser humano se propagou pelo mundo
inteiro, só perdendo terreno com o desenvolvimento cultural capaz de por à
mostra a fragilidade desse pensamento. E dela derivou a crença em ciclos de
vida, em que um mesmo espírito passa por sucessivos corpos, a chamada
reencarnação.
O povo hebreu, na fase mosaica, parecia contrário a essas idéias:
O Gênesis diz que “formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra, e lhe soprou
nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente“ (Gênesis, 2:
7); não diz que o Senhor Deus colocou uma alma no corpo do homem.
Salomão disse que OS MORTOS NÃO TÊM CONSCIÊNCIA e não conhecia a esperança de
ressurreição: “Pois os vivos sabem que morrerão, mas os mortos não sabem
coisa nenhuma, nem tampouco têm eles daí em diante recompensa; porque a sua
memória ficou entregue ao esquecimento” (Ecl. 9: 5).
Jó também não sabia de tais doutrinas: disse que o homem “morre e... enquanto
existirem os céus não acordará...”. E lançou a pergunta: “Morrendo o homem,
porventura tornará a viver? ” (Jó, 14: 10-14).
Mas a idéia de existência após a morte aparece ainda no velho testamento, como
se nota no relato da necromante de En-Dor, que teria levantado Samuel do Túmulo
(I Samuel, 28: 11-14).
No livro do profeta Daniel, que já foi criado sob a influência babilônica e
provavelmente também persa, temos a primeira promessa de ressurreição: “Tu,
porém, segue o teu caminho até ao fim; pois descansarás, e, ao fim dos dias, te
levantarás para receber a tua herança” (Daniel, 12: 13).
Antes do cativeiro babilônico, não existia ressurreição entre as promessa de
Yavé. Mas, após conhecer a cultura babilônica, os profetas passaram a falar em
ressurreição, como se vê em Daniel. Todavia, foi o cristianismo que disseminou
pelo mundo inteiro a esperança de ressurreição.
A crença na consciência dos mortos também existiu entre cristãos primitivos:
Pedro escreveu que Cristo, após a morte, “pregou aos espíritos em prisão”, e
deixou mais clara sua crença animista, dizendo que “o evangelho foi pregado a
mortos” (II Pedro, 3: 19; 4: 6). Não há como dizer que se trate de sentido
figurado, pois os mortos ali mencionados são do tempo em que Noé preparava a
arca.
Analisando, minuciosamente, encontramos entre os discípulos de Jesus até a
crença na reencarnação (crença espírita de que um espírito passa por sucessivos
corpos humanos), embora não tenha sido confirmada pelo próprio Jesus e tenha
sido claramente combatida posteriormente pelo apóstolo Paulo. “Perguntaram-lhe
os seus discípulos: Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?
Respondeu Jesus: Nem ele pecou nem seus pais; mas foi para que nele se
manifestem as obras de Deus.” (João, 9: 2, 3). Paulo, por sua vez, afirmou:
“...aos homens está ordenado, morrerem UMA Só VEZ, depois disto o juízo”
(Hebreus, 9: 27). Isso deixa claro que ele era ressurreicionista, mas combatia a
teoria reencarnacionista. Em seus escritos não aparece a crença em consciência
dos mortos, mas na ressurreição.
Deixando de lado teorias e considerando as evidências físicas, o que podemos
dizer da vida e da morte?
Uma pessoa que sofre uma forte pancada na cabeça perde temporariamente a
consciência. Uma lesão no cérebro não deixa dúvida de que ali está todo o
sentimento e raciocínio do homem. Agora, raciocinando bem, temos algum
fundamento para pensar que a consciência volte a existir quando esse cérebro se
deteriorar por completo? Não vejo como aceitar tal despautério.
Ser-me-ia muito agradável a esperança de reviver após a morte e vir a viver em
um lugar maravilhoso, sem qualquer sofrimento. Por outro lado, seria
hirripilante a possibilidade de ficar infindavelmente em meio das chamas dos
chamado inferno. Mas, o que todas as evidências me indicam é que nascemos,
crescemos, envelhecemos e morremos, não restando nada de nós senão nossa
descendência. Vida e morte não têm ciclos.