Rabin (seta à esq.) e seu assassino com o clarão de um dos dois disparos.
O governo israelense acreditava ter encontrado o caminho para a paz com o seu
primeiro primeiro-ministro nascido em Israel, Yitzhak Rabin. E a
liderança palestina, sob o comando de Yasser Arafat,
comungava a mesma esperança. Havia negociações
abertas desde os acordos de Oslo, vontade política real de superar quaisquer
obstáculos, e de ir em frente. Estados Unidos, Europa e ONU apoiavam os esforços
de ambos os lados.
As dissidências israelenses e palestinas protestavam
e atiravam bombas e pedras para impedir o avanço nas negociações. Contra essa
ruidosa oposição, os movimentos pró-paz marcaram uma manifestação para
demonstrar sua força majoritária: sábado à noite, ao final do shabath de 4 de
novembro de 1995, na Praça dos Reis de Israel, em Tel-Aviv.
O premiê Ytzhak Rabin, Nobel da Paz em 1994, pensou em não comparecer. Temia um
embaraço político se tivesse que enfrentar uma praça vazia. Acabou indo. E se
viu diante de uma multidão impressionante calculada em 100 mil pessoas, muito
para um país pequeno como Israel. Tanta gente, os serviços de segurança entraram
em prontidão contra atentado palestino, especialmente algum homem-bomba em meio
a tanta gente.
“Permitam-me dizer, estou emocionado” – falou Rabin, 73 anos, dirigindo-se à
praça totalmente tomada. “Gostaria de agradecer um a um
por ter vindo aqui se posicionar contra a violência e pela paz”.
Continuou, à la John Lennon: “Este governo decidiu dar uma
chance à paz — paz que poderá resolver grande parte dos problemas de Israel”.
Então, Rabin lembrou que, por 27 anos nas Forças de Defesa de Israel, “lutei
enquanto não havia prospectos para a paz”. Agora, pela primeira vez, ele via
“grandes prospectos”. Ainda comentou que “a violência está minando os
verdadeiros fundamentos da democracia israelense; temos que condená-la,
denunciá-la e isolá-la. Este não é o nosso caminho”.
Filho de um religioso iemenita, o estudante de Direito Yigal Amir surpreendeu-se
ao encontrar o premiê Rabin num casamento, tão desprotegido, ao alcance de… um
assassino. Prometeu-se que não deixaria passar outra oportunidade igual.
Amir armou-se. Não escondeu dos amigos que queria matar Rabin, que acusava de
entregar aos árabes a Terra Prometida que ele próprio, quando general, ajudou a
conquistar na Guerra dos Seis Dias, em 1967. Serviços secretos que o monitoravam
produziram alguns poucos parágrafos com observações, esquecidas numa pasta
arquivada. E o mais grave: alguns rabinos proclamavam
que seria aceitável, por uma interpretação talmúdica, eliminar Rabin, sob a
acusação de que ele estava “traindo o povo judeu”.
Ao fim da apoteose com a Canção da Paz, puxada por Rabin com o coro da praça dos
Reis de Israel, Amir já circulava despercebido entre os seguranças e autoridades
no cortejo que foi a pé até onde estavam estacionados os carros das autoridades,
abaixo do palanque armado diante da Prefeitura de Tel-Aviv, no mesmo nível da
avenida Ibn Gvrol. Aproximou-se. Esticou o braço. Quase não se ouviram os
disparos. Dois tiros, nas costas, à queima-roupa. Foi há 20 anos. Desde então,
Israel perdeu-se no caminho da paz.
<https://rabinovicimoises.com/2015/10/28/as-mortes-de-rabin-e-da-paz/>
Assim é o conceito de paz das religiões, eliminar todos e quaisquer que pensarem
diferente e estabelecer suas ideias como leis imutáveis. Se Rabin se
esforçou pela paz, mas Yavé teria prometido todo o Oriente Médio para judeus, o
premier era um criminoso aos olhos dos que acreditam nas promessas divinas.