CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA DE 1988
Aprovada pela Assembleia Nacional Constituinte em 22 de setembro
de 1988 e promulgada em 5 de outubro de 1988,[1] a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 é a lei fundamental e suprema do Brasil, servindo
de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no
topo do ordenamento jurídico.[2] Pode ser considerada a sétima ou a oitava
constituição do Brasil e a sexta ou sétima constituição brasileira em um século
de república.[nota 1]
Ficou conhecida como "Constituição Cidadã", por ter sido concebida no processo
de redemocratização, iniciado com o encerramento da ditadura militar no Brasil
(1964–1985).[4] Até dezembro de 2019 foram acrescentadas 112 emendas, sendo 104
emendas constitucionais ordinárias,[5] seis emendas constitucionais de
revisão[6] e dois tratados internacionais aprovado de forma equivalente.[7]
No dia 5 de outubro de 2013 a Constituição completou 25 anos de vigência e a
data foi celebrada em várias entidades e movimentos sociais, entre os quais: foi
o ato do Conselho Federal da OAB, em Brasília, que reuniu juristas, lideranças
de movimentos organizados e políticos que participaram da Assembleia
Constituinte, entre eles, os ex-presidentes Lula e José Sarney.[8] Na noite da
mesma data o programa Repórter Senado da TV Senado exibiu um especial de uma
hora e 10 minutos sobre os acontecimentos, sugestões populares e discussões da
constituinte e seus desdobramentos nos 25 anos de vigência da Carta
Constitucional.[9] Em 29 de outubro de 2013 foi realizada uma sessão especial no
Congresso Nacional brasileiro alusiva aos 25 anos da Carta Política com a
participação de atores políticos e sociais da época da constituinte e foi
entregue a Medalha Ulysses Guimarães para várias personalidades, entre eles,
Bernardo Cabral que fora relator na assembleia que construiu o texto
constitucional de 1988.[10] Como parte das comemorações, o Governo Federal
lançou uma versão da Constituição em texto, áudio e linguagem de sinais,
atendendo assim a uma demanda de acessibilidade a milhões de brasileiros com
deficiência sensorial.[11]
Índice
História
Desde 1964 o Brasil estava sob uma ditadura militar, e desde 1967
(particularmente subjugado às alterações decorrentes dos Atos Institucionais)
sob uma Constituição imposta pelo governo federal.
O regime de exceção, em que as garantias individuais e sociais eram restritas,
ou mesmo ignoradas, e cuja finalidade era garantir os interesses da ditadura,
internalizados em conceitos como segurança nacional, restrição das garantias
fundamentais etc, fez crescer, durante o processo de abertura política, o anseio
por dotar o Brasil de uma nova Constituição, defensora dos valores
democráticos.[2] Anseio que se tornou necessidade após o fim da ditadura militar
e a redemocratização do Brasil, a partir de 1985.
Independentemente das controvérsias de cunho político, a Constituição Federal de
1988 assegurou diversas garantias constitucionais, com o objetivo de dar maior
efetividade aos direitos fundamentais, permitindo a participação do Poder
Judiciário sempre que houver lesão ou ameaça de lesão a direitos. Para
demonstrar a mudança que estava havendo no sistema governamental brasileiro, que
saíra de um regime autoritário recentemente, a constituição de 1988 qualificou
como crimes inafiançáveis a tortura e as ações armadas contra o estado
democrático e a ordem constitucional, criando assim dispositivos constitucionais
para bloquear golpes de qualquer natureza.
Com a nova constituição, o direito maior de um cidadão que vive em uma
democracia representativa foi conquistado: foi determinada a eleição direta para
os cargos de Presidente da República, Governador do Estado e do Distrito
Federal, Prefeito, Deputado Federal, Estadual e Distrital, Senador e
Vereador.[2]
A nova Constituição também previu maior responsabilidade fiscal. Pela primeira
vez, uma Constituição brasileira define a função social da propriedade privada
urbana, prevendo a existência de instrumentos urbanísticos que, interferindo no
direito de propriedade (que a partir de agora não mais seria considerado
inviolável), teriam por objetivo romper com a lógica da especulação imobiliária.
A definição e regulamentação de tais instrumentos, porém, deu-se apenas com a
outorga do Estatuto da Cidade em 2001.[12]
Constituintes
A Assembleia Constituinte que promulgou a Constituição era composta por 559
congressistas, sendo Ulysses Guimarães (PMDB-SP) o presidente da Assembleia.
Inspirações
Reformas de Base
O ex-presidente João Goulart apresentou em 1964 uma série de propostas de
reformas, cujo conjunto ficou conhecido como Reformas de Base. Parte dessas
propostas foram adotadas pela Nova Constituição, tendo como exemplo a Medida
Provisória, os monopólios estatais na economia, o voto dos analfabetos, e a
função social da propriedade.[13][14]
Constituição portuguesa
A Constituição da República Portuguesa de 1976 é apontada como uma das
influências para o texto brasileiro de 1988. O ministro Gilmar Mendes, do
Supremo Tribunal Federal, vê essa relação “notada e manifesta” quanto aos
direitos fundamentais.[15] Doutrinadores apontam também semelhanças em matéria
de controle de constitucionalidade.[16]
Canotilho e a Constituição Dirigente
Constituição dirigente ou compromissória é aquela que traça os objetivos a serem
perseguidos pelo Estado. Recebem, ainda, o nome de constituição programática ou
diretiva. As ideias foram desenvolvidas pelo jurista português José Joaquim
Gomes Canotilho em sua obra Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador de
1982.[17][18] Essa exerceu enorme influência na Constituição de 1988.[19][20]
sendo a Carta Magna de 1988 um exemplo de Constituição dirigente, pois consagra
inúmeras normas programáticas, como, por exemplo, as que estabelecem os
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil previstos no artigo 3º.
Conquistas
Democracia
A carta magna de 1988 é exaltada por ter restabelecida a democracia.[21] Para
Gilmar Mendes, a nova Constituição assegurou o mais longo período de
estabilidade institucional da história republicana brasileira.[22]
Direitos e Garantias
A Constituição de 1988 é a mais abrangente e extensa de todas as anteriores no
que se trata de Direitos e Garantias Fundamentais[23]. Segundo o jurista
italiano Luigi Ferrajoli, é uma das mais avançadas do mundo no tocante aos
direitos e garantias fundamentais.[24] Especialistas apontam que a Constituição
de 1988 trouxe avanços no reconhecimento dos direitos individuais e sociais das
mulheres.[25] Outros sustentam que a Constituição foi um marco nos direito
indígenas.[26] A proteção do meio ambiente também é ressaltado como um
avanço.[27]
Atuação do Ministério Público
Antes da Constituição, o Ministério Público estava subordinado ao poder
judiciário. O constituinte outorgou ao Ministério Público autonomia e
independência sem subordinação à estrutura dos Poderes do Estado. Essa distinção
tem sido considerado fundamental para avanço no combate à corrupção.[28][29]
Alguns sustentam que ações de combate à corrupção, como a Operação Lava Jato, só
foram possíveis graças às novas atribuições conferidas pela carta magna de
1988.[30]
Características
Formal — possui dispositivos que não são normas essencialmente constitucionais.
Escrita — apresenta-se em um documento sistematizado dentro de cada parâmetro.
Promulgada — elaborada por um poder constituído democraticamente.
Rígida — não é facilmente alterada. Exige um processo legislativo mais
elaborado, consensual e solene para a elaboração de emendas constitucionais do
que o processo comum exigido para todas as demais espécies normativas
legais.[31] Alguns autores, como Alexandre de Moraes, ressaltam que a
Constituição pode ser classificada como "super-rígida", tendo em vista que no
artigo 60, § 4º há a previsão de quatro cláusulas que não podem ser alteradas
através de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), as chamadas cláusulas
pétreas.[31]
Analítica — descreve em pormenores todas as normas estatais e direitos e
garantias por ela estabelecidas.
Dogmática — constituída por uma assembleia nacional constituinte.
A Constituição de 1988 está dividida em nove títulos. As temáticas de cada
título são:[2]
Título I — Princípios Fundamentais
Ver artigo principal: Princípios Fundamentais na Constituição do Brasil
Do artigo 1.º ao 4º temos os fundamentos sob os quais constitui-se a República
Federativa do Brasil.
Título II — Direitos e Garantias Fundamentais
Ver artigo principal: Direitos e Garantias Fundamentais na Constituição do
Brasil
Do artigo 5.º ao 17 são elencados uma série de direitos e garantias, reunidos em
cinco grupos básicos:[32]
Capítulo I: Direitos e Deveres Individuais e Coletivos.
Capítulo II: Direitos Sociais.
Capítulo III: Nacionalidade.
Capítulo IV: Direitos Políticos.
Capítulo V: Partidos Políticos.
As garantias ali inseridas (muitas delas inexistentes em Constituições
anteriores) representaram um marco na história brasileira.
Título III — Organização do Estado
Ver artigo principal: Organização do Estado na Constituição do Brasil
Do artigo 18 ao 43 é definida a organização político-administrativa, ou seja,
das atribuições de cada ente da federação (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios); além disso, tratam das situações excepcionais de intervenção nos
entes federativos, versam sobre administração pública e servidores públicos
militares e civis, e também das regiões do país e sua integração geográfica,
econômica e social.
Capa da Constituição de 1988 original sob guarda do Arquivo Nacional.
Título IV — Organização dos Poderes
Ver artigo principal: Organização dos Poderes na Constituição do Brasil
Do artigo 44 ao 135 é definida a organização e as atribuições de cada poder
(Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário), bem como de seus
agentes envolvidos. Também definem os processos legislativos, inclusive os que
emendam a Constituição.
Título V — Defesa do Estado e das Instituições Democráticas
Ver artigo principal: Defesa do Estado e das Instituições na Constituição do
Brasil
Do artigo 136 ao 144 são definidas as questões relativas à Segurança nacional,
regulamentando a intervenção do Governo Federal através de decretos de Estado de
Defesa, Estado de Sítio, intervenção das Forças armadas e da Segurança pública.
Título VI — Tributação e Orçamento
Ver artigo principal: Tributação e Orçamento na Constituição do Brasil
Do artigo 145 ao 169 são estabelecidas as limitações tributárias do poder
público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), organizando o sistema
tributário e detalhando os tipos de tributos e a quem cabe cobrá-los. Tratam
ainda da repartição das receitas e das normas para a elaboração do orçamento
público.
Título VII — Ordem Econômica e Financeira
Ver artigo principal: Ordem Econômica e Financeira na Constituição do Brasil
Do artigo 170 ao 192 são reguladas a atividade econômica e financeira, bem como
as normas de política urbana, agrícola, fundiária e reforma agrária, versando
ainda sobre o sistema financeiro nacional.
Título VIII — Ordem Social
Ver artigo principal: Ordem Social na Constituição do Brasil
Do artigo 193 ao 232 são tratados os temas relacionados ao bom convívio e
desenvolvimento social do cidadão, como deveres do Estado, a saber: seguridade
social (saúde pública, previdência social e assistência social); educação,
cultura e esporte; ciência e tecnologia; comunicação social; meio ambiente;
família (incluindo nesta acepção crianças, adolescentes e idosos); e populações
indígenas.
Título IX — Disposições Constitucionais Gerais
Ver artigo principal: Disposições Gerais na Constituição do Brasil
Do artigo 234 ao 250 (o artigo 233 foi revogado) são tratadas as disposições
esparsas versando sobre temáticas variadas e que não foram inseridas em outros
títulos em geral por tratarem de assuntos muito específicos.
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
Emendas constitucionais
Ver artigo principal: Lista de emendas à constituição brasileira de 1988
Pórtico com o texto e as chancelas da Emenda Constitucional n.º 78, de 14 de
maio de 2014.
O artigo 60 da Constituição estabelece as regras para o processo de criação e
aprovação de Emendas Constitucionais. Uma emenda pode ser proposta pelo
Congresso Nacional (um terço da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal), pelo
Presidente da República ou por mais da metade das Assembleias Legislativas dos
governos estaduais. Uma emenda é aprovada somente se três quintos da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal aprovarem a proposta, em dois turnos de votação.
As emendas constitucionais devem ser elaboradas respeitando certas limitações,
definidas pelo artigo 60. Há limitações materiais, conhecidas como cláusulas
pétreas (§ 4.º), limitações circunstanciais (§ 1.º), limitações formais ou
procedimentais (incisos I, II, III, § 3.º). Há ainda uma forma definida de
deliberação (§ 2.º) e promulgação (§ 3.º).
Implicitamente, considera-se que o art. 60 da Constituição é inalterável, pois
alterações neste artigo permitiriam uma revisão completa da Constituição. Nos
casos não abordados pelo art. 60, é possível propor emendas. Os órgãos
competentes para submeter emendas são: a Câmara dos Deputados, o Senado Federal,
o Presidente da República e de mais da metade das Assembleias Legislativas das
unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de
seus membros.
Os direitos fundamentais, previstos nos incisos do artigo 5.º, também não
comportam Emendas que lhes diminuam o conteúdo ou âmbito de aplicação.
A emenda constitucional de revisão, conforme o art. 3.º da ADCT (Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias), além de possuir implicitamente as
mesmas limitações materiais e circunstanciais, e os mesmos sujeitos legitimados
que o procedimento comum de emenda constitucional, também possuía limitação
temporal - apenas uma revisão constitucional foi prevista, 5 anos após a
promulgação, sendo realizada em 1993. No entanto, ao contrário das emendas
comuns, ela tinha um procedimento de deliberação parlamentar mais simples para
reformar o texto constitucional pela maioria absoluta dos parlamentares, em
sessão unicameral e promulgação dada pela Mesa do Congresso Nacional.
A Constituição brasileira já sofreu noventa reformas em seu texto original,
sendo 84 emendas constitucionais tendo a última sido promulgada no dia 2 de
dezembro de 2014, e seis emendas de revisão constitucional. A única Revisão
Constitucional geral prevista pela Lei Fundamental brasileira aconteceu em 5 de
outubro de 1993, não podendo mais sofrer emendas de revisão. Mesmo assim, houve
tentativas, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 157, do deputado Luiz
Carlos Santos, que previa a convocação de uma Assembleia de Revisão
Constitucional a partir de janeiro de 2007.[33]
Remédios constitucionais
A Constituição de 1988 incluiu dentre outros direitos, ações e garantias, os
denominados "Remédios Constitucionais".[34] Por Remédios Constitucionais
entendem-se as garantias constitucionais, ou seja, instrumentos jurídicos para
tornar efetivo o exercício dos direitos constitucionais.[35]
Os Remédios Constitucionais (listados abaixo) são previstos no artigo 5.º e no
artigo 129, Inciso III, da Constituição de 1988:
Habeas data (artigo 5.º, Inciso LXXII e Lei n° 9.507 de 1997[36]) — sua
finalidade é garantir ao particular o acesso às informações que dizem ao seu
respeito constantes do registro de banco de dados de entidades governamentais ou
de caráter público ou correção destes dados, quando o particular não preferir
fazer por processo sigiloso, administrativo ou judicial.
Ação Popular (artigo 5.º, Inciso LXXIII e Lei n.º 4.717 de 1965)[37] — objetiva
anular ato lesivo ao patrimônio público e punir seus responsáveis.
Ação civil pública (artigo 129, Inciso III) — objetiva reparar ato lesivo aos
interesses descritos no artigo 1º (todos os incisos), da Lei nº 7.347.
Habeas corpus (artigo 5.º, Inciso LXVIII) — instrumento tradicionalíssimo de
garantia de direito, assegura a reparação ou prevenção do direito de ir e vir,
constrangido por ilegalidade ou por abuso de poder.
Mandado de segurança (artigo 5.º, Inciso LXIX) — usado de modo individual, tem
por fim proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou
habeas data
Mandado de Segurança Coletivo (artigo 5.º, Inciso LXX) — usado de modo coletivo,
tem por finalidade proteger o direito de partidos políticos, organismos
sindicais, entidades de classe e associação legalmente constituídas em defesa
dos interesses de seus membros ou associados.
Mandado de injunção (artigo 5.º, Inciso LXXI) — usado para viabilizar o
exercício de um direito constitucionalmente previsto e que depende de
regulamentação.
Capa criada por Cosme Coelho Rocha.
Impressões
Capa
A capa da atual Constituição Brasileira foi criada em 1988 pelo artista Cosme
Coelho Rocha, tendo sido aprovada por Ulysses Guimarães, "por sua simplicidade e
por seu simbolismo". Cosme reestilizou a bandeira do Brasil, tornando-a mais
simples, sem as estrelas e sem a faixa "Ordem e Progresso". Foi colocada no
sentido vertical, para transmitir a ideia de algo que estava "nascendo,
começando a crescer".
Em Braille
Em 1998 o Senado Federal imprimiu uma versão, em três volumes, toda em
Braille,[38] com reedições posteriores.[39]
Críticas
A Constituição Federal de 1988 é criticada na doutrina por ser muito extensa,
prolixa e analítica.[40][41] Essa característica obrigou a Constituição a ser
emendada diversas vezes, em processos politicamente custosos, para se adequar às
mudanças da sociedade.[42][43]
Outra crítica é que a Constituição Federal de 1988 reproduz um modelo de
Capitalismo de Estado,[44] ampliando monopólios estatais e regulações,[45] o que
permitiu ao estado brasileiro, em 2017, ter participações em mais de 650
empresas, envolvidas em um terço do PIB nacional.[46] Esse modelo também criou
restrições para a atuação de empresas estrangeiras em diversos campos com
consequências danosas ao crescimento do país.[47][48] Na visão de alguns
doutrinadores, esse modelo econômico favorece o Patrimonialismo e a
corrupção.[49][50]
Desde a aprovação da Constituição Federal de 1988, a taxa de homicídios cresceu
124% no Brasil e mais de um milhão de pessoas foram assassinadas. Enquanto na
década de 80 foram registrados 11,7 homicídios por 100 mil habitantes, em 2010 o
índice chegou a 26,2 – um aumento médio de 2,7% ao ano.[51]
Constituição do Brasil de 1988, sob a bandeira nacional do Brasil, em exposição.
Uma parcela da doutrina tem culpado a Constituição. Raul Jungmann criticou o
fato da Constituição ter dado aos estados a responsabilidade com a segurança
pública, deixando a União apenas com um papel residual.[52] Isso teria
possibilitado o crescimento de facções como o Primeiro Comando da Capital e o
Comando Vermelho.[53] Na visão de Alexandre de Moraes, o Brasil confundiu o
respeito à dignidade da pessoa humana com a leniência às lideranças
criminosas.[54]
A Constituição também é responsabilizada por ter deixado um sistema processual
lento.[55] O Brasil tem o 30º Judiciário mais lento entre 133 países, segundo o
Banco Mundial.[56] Isso tem feito o poder judiciário a utilizar as prisões
provisórias como antecipação da pena.[57] Em 2015 mais de 40% dos presos no
Brasil eram provisórios.[58]
Estudo do Banco Mundial criticou a Constituição Federal de 1988 por ter ampliado
privilégios dos funcionário públicos, agravando a desigualdade de renda no
Brasil.[59] Remuneração e aposentadoria são desproporcionalmente elevados
segundo estudos.[60] Em 2015, o déficit do governo federal com a aposentadoria
dos cerca de 1 milhão de servidores da União foi maior do que todo o registrado
com 33 milhões de aposentados da iniciativa privada.[61] Para o Banco Mundial,
os funcionários públicos integram o um quinto mais rico da população
brasileira.[62] Para Roberto Brant, a Constituição Federal foi capturada por
grupos de funcionários públicos em 1988.[63] Já o filósofo Fernando Schüler
sustenta que o Brasil andou na contramão nos anos 1980: "Enquanto o mundo
tratava de ajustar o Estado à globalização e modernizar a gestão pública, o
Brasil apostou em um super Estado burocrático na Constituição de 1988.
Oferecemos estabilidade rígida no emprego para os servidores, misturamos
carreiras de Estado com carreiras comuns do serviço público, criamos a lei das
licitações, engessamos os orçamentos e eliminamos qualquer espaço para a
meritocracia na área pública.".[64] Para o jurista Modesto Carvalhosa, apenas
uma nova constituição "principiológica" acabaria com os privilégios da carta
magna de 1988.[65]
A Constituição Federal de 1988 também é criticada por ter adotado um dos mais
amplos Foro especial por prerrogativa de função do mundo[66], juristas entendem
que essa extensão incentiva à corrupção.[67][68] Um quarto das ações com Foro
Privilegiado levam mais de dez anos para serem julgadas.[69] O STF leva 1,3 mil
dias para julgar ações penais de pessoas com foro privilegiado.[70] Entre 2001 e
2017, 200 ações envolvendo o Foro Privilegiado prescreveram.[71]
Também é criticada a exigência de Trânsito em julgado para a execução da pena.
Para o juiz Sergio Moro, aguardar o trânsito em julgado contribui para a
impunidade.[72] Conforme o ministro Teori Zavascki após a confirmação de
sentença penal condenatória em segundo grau, não mais se poderia falar no
princípio da não culpabilidade, vez que "os recursos excepcionais, para os
tribunais de superposição, não ostentam capacidade de revolvimento de fatos e
provas".[73] Nas Organização das Nações Unidas 193 dos 194 países têm prisão em
1ª ou 2ª instância.[74][75]
No aspecto eleitoral, a Constituição adotou o voto obrigatório. Entre as 15
maiores economias do mundo, o Brasil é o único país no qual o voto é
obrigatório.[76] Pesquisa de 2014, demonstrou que o voto obrigatório é rejeitado
por 61% dos brasileiros.[77] Alguns doutrinadores questionam se é democrático
obrigar as pessoas a votarem.[78][79]
A Constituição adotou o modelo social democrata de organização do Estado,
segundo define o articulista do jornal O Estado de S. Paulo Luiz Sérgio
Henriques.[80] Para o professor e advogado Marco Aurélio Marrafon, presidente da
Academia Brasileira de Direito Constitucional, a Carta Magna brasileira de 1988
organizou o Estado segundo o modelo Welfare State ou Estado de Bem-Estar Social,
em que se pretende conciliar "o componente liberal da preservação de direitos
individuais e limitação do poder estatal, com a intervenção econômica direta e
fomento de políticas públicas, de modo a redistribuir recursos e diminuir as
desigualdades sociais".[81][82] Para financiar o Welfare State, foi necessário
elevar a carga tributária, que passou de 23,4% do PIB em 1988, para 33,6% do PIB
em 2005,[83] e vincular as receitas orçamentárias. Assim, a União chegou a 93%
de gastos obrigatórios em 2017,[84] diminuindo a margem de manobra dos
governantes[85] e afetando os investimentos. Essa opção política é criticada por
alguns doutrinadores.[86][87][88][89]
Doutrinadores criticam um suposto poder excessivo concedido à Ordem dos
Advogados pela Constituição. O filósofo e jornalista brasileiro Hélio
Schwartsman considera que a Constituição de 1988 conferiu "poderes
desproporcionais" aos advogados "como o de indicar juízes, escrever leis, propor
ações diretas de inconstitucionalidade, definir quem pode e quem não pode
tornar-se advogado".[90] Roberto Campos, economista, ex-senador e Ministro do
Planejamento do Brasil nos primeiros anos da ditadura militar notou que "A OAB
conseguiu a façanha de ser mencionada três vezes no que ele define como a
"Constituição besteirol" de 1988. Segundo ele, "é talvez o único caso no mundo
em que um clube de profissionais conseguiu sacralização no texto
constitucional.".[91]
Ver também
Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988)
Controle de constitucionalidade no Brasil
Notas
A ordem depende de se considerar ou não a reforma constitucional de 1969 como um
texto constitucional.[3][2]
Referências
«Constituicao-Compilado». planalto.gov.br
Thais Pacievitch (18 de agosto de 2008). «Constituição de 1988». InfoEscola.
Consultado em 5 de setembro de 2012
«Constituição de 1988 (1) - História do Brasil - UOL Educação». web.archive.org.
20 de maio de 2011. Consultado em 28 de janeiro de 2020
Oliveira, Guilherme (5 de outubro de 2017). «30 anos da Constituição Cidadã».
Senado Federal. Consultado em 25 de novembro de 2017
«Quadro_emc». planalto.gov.br. Consultado em 25 de fevereiro de 2017
«Quadro_ecr». planalto.gov.br
«Tratados equivalentes a Emendas Constitucionais». Portal da Legislação.
Consultado em 6 de dezembro de 2019
AB celebra os 25 anos da Constituição defendendo reforma política [1]. Conselho
Federal da OAB. Acesso em 06/10/2013
A TV Senado nos 25 anos da Constituição Federal de 1988 [2] Arquivado em 24 de
dezembro de 2013, no Wayback Machine.. senado.leg.br. Acesso em 06/10/2013
«G1 - Lula compara Sarney a Ulysses em sessão pelos 25 anos da Constituição -
notícias em Política». Política
«Constituição da República Federativa do Brasil multiacessível». Consultado em 9
de junho de 2014
Rolnik, 2002
«As reformas de base aconteceram e João Goulart venceu». Consultado em 1 de
março de 2018
«Jango foi pioneiro da transformação social do país, afirma Tarso em São Borj».
Consultado em 1 de março de 2018
«Influência para o Brasil, Constituição portuguesa chega aos 40 menos
ideológica». Consultado em 8 de março de 2018
«Encontro discute Direito Constitucional em Lisboa». Consultado em 8 de março de
2018
«Canotilho torna-se Doutor Honoris Causa pela UFMG». Consultado em 1 de março de
2018
«Professor Canotilho e sua Constituição Dirigente». Consultado em 1 de março de
2018
Oliveira, Gustavo da Gama Vital de. Direito constitucional do Brasil. [S.l.:
s.n.] p. 38
Macedo, Ubiratan Borges de. Temas de direito constitucional tributário
brasileiro. [S.l.: s.n.] p. 38
«Constituição de 88 é marco entre ditadura e democracia». Consultado em 8 de
março de 2018
«25 anos de redemocratização: estabilidade política garantida pela Constituição
Federal de 1988». Consultado em 8 de março de 2018
«DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS». Consultado em 8 de março de 2018
«Constituição brasileira é das mais avançadas do mundo». Consultado em 8 de
março de 2018
«Carta de 1988 é um marco contra discriminação». Consultado em 8 de março de
2018
«Povos Indígenas: conheça os direitos previstos na Constituição». Consultado em
8 de março de 2018
«O Estado, a proteção do meio ambiente e a jurisprudência». Consultado em 8 de
março de 2018
«O Ministério Público e o combate à corrupção». Consultado em 8 de março de 2018
«Ministério Público forte, sociedade protegida». Consultado em 8 de março de
2018
«Investigados na Lava-Jato deram poder ao Ministério Público». Consultado em 8
de março de 2018
Moraes, Alexandre de. (2008). Direito constitucional 23. ed ed. São Paulo:
Atlas. p. 10. ISBN 978-85-224-5027-5. OCLC 230895232
SILVA, José Afonso (1995). Curso de direito constitucional positivo 18.ª ed.
[S.l.]: Malheiros. p. 181
Câmara dos Deputados (4 de setembro de 2003). «PEC 157/2003»
Aloisio Costa Siqueira (1 de novembro de 2003). «Remédios Constitucionais»
Civilex. «Remédios Constitucionais»
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9507.htm
«L4717». www.planalto.gov.br. Consultado em 24 de maio de 2017
SENADO LANÇA CONSTITUIÇÃO EM BRAILE. Senado Federal. Acesso em 3 de janeiro de
2018
Constituição da República Federativa do Brasil, em Braile. Senado Federal:
Secretaria especial de publicações e editoração
«Erro político produziu Constituição difícil até para técnicos». Conjur. 13 de
junho de 2004. Consultado em 7 de março de 2018
«Entrevista: Luís Roberto Barroso — Parte 1». Conjur. 14 de maio de 2006.
Consultado em 7 de março de 2018
«A marca inequívoca da CF de 88 é a da judicialização». Conjur. 14 de maio de
2006. Consultado em 7 de março de 2018
«Constituição Federal completa 20 anos envelhecida e remendada». Conjur. 4 de
outubro de 2010. Consultado em 7 de março de 2018
«The Case of Brazil». Consultado em 26 de fevereiro de 2018
«Críticas de Roberto Campos à Constituição ainda ecoam». Conjur. 25 de novembro
de 2012. Consultado em 7 de março de 2018
«Privatizações: ainda é pouco». Consultado em 26 de fevereiro de 2018
«Constituição de 1988 pára pesquisa mineral». Folha. 29 de maio de 2004.
Consultado em 7 de março de 2018
«Governo quer ampliar abertura da economia e flexibilizar monopólios». Folha. 29
de maio de 2004. Consultado em 3 de março de 2018
«ANÁLISE - A questão é: haverá mais?». 29 de maio de 2004. Consultado em 7 de
março de 2018
«Inchaço estatal». Folha. Consultado em 7 de março de 2018
«País está em situação epidêmica, de acordo com a OMS, que limita em 10 o número
de assassinatos por 100 mil habitantes; taxa do Brasil é de 26,2%». Veja. 14 de
dezembro de 2011. Consultado em 5 de agosto de 2017
«Raul Jungmann: "Prendemos muito, mas prendemos mal"». Folha. 27 de fevereiro de
2018. Consultado em 5 de agosto de 2017
«Facções criminosas se alimentam das falhas do Estado, diz pesquisadora». Folha.
27 de fevereiro de 2018. Consultado em 5 de agosto de 2017
«País deve acabar com a hipocrisia ao tratar questões penitenciárias, diz
Moraes». Istoé. 30 de novembro de 2017. Consultado em 5 de agosto de 2017
«Por que a Justiça brasileira é lenta?». Istoé. Consultado em 5 de agosto de
2017
«Por que a Justiça brasileira é lenta?». Istoé. Consultado em 5 de agosto de
2017
«Justiça, mesmo tardia». Istoé. Consultado em 5 de agosto de 2017
«JNo Brasil, 40% dos presos são provisórios». Carta Capital. Consultado em 5 de
março de 2018
«Assim não dá». Veja. 24 de novembro de 2017. Consultado em 5 de agosto de 2017
«Os privilégios salariais do servidor público». Globo. 24 de novembro de 2017.
Consultado em 5 de agosto de 2017
«Serviço público puxa desigualdade na Previdência». Globo. 24 de novembro de
2017. Consultado em 5 de agosto de 2017
«Para o Banco Mundial, Brasil precisa reduzir os privilégios de servidores». 24
de novembro de 2017. Consultado em 5 de agosto de 2017
«"Pobre paga privilégios de servidores", diz ex-ministro da Previdência». 24 de
novembro de 2017. Consultado em 5 de março de 2018
«Reforma administrativa ou do Estado?». Consultado em 10 de outubro de 2019
«"Os brasileiros estão a eliminar os políticos que sugam o Estado"». Consultado
em 10 de outubro de 2019
«Foro privilegiado no Brasil é mais amplo comparado a outros 20 países». O
Globo. 24 de outubro de 2016. Consultado em 14 de dezembro de 2016
Estevão Taiar (24 de outubro de 2016). «Para ministro Barroso, foro privilegiado
'é feito para não funcionar'». Valor Econômico. Consultado em 14 de dezembro de
2016
José Nêumanne (13 Junho 2016). «O privilégio do foro».politica.estadao.com.br
«Casos de foro privilegiado se arrastam por até 18 anos». 6 de novembro de 2016.
Consultado em 5 de março de 2018
«STF leva 1,3 mil dias para julgar ações penais de pessoas com foro
privilegiado». 19 de março de 2017. Consultado em 5 de março de 2018
«O foro privilegiado em números». 23 de novembro de 2017. Consultado em 5 de
março de 2018
«Aguardar o trânsito em julgado contribui para a impunidade, diz Moro».
Consultado em 20 de março de 2018
«Prisão antes do trânsito em julgado: mudança de rumos no STF». Consultado em 20
de março de 2018
«Na ONU, 193 dos 194 países têm prisão em 1ª ou 2ª instância». 20 de março de
2018. Consultado em 20 de março de 2018
«'Prisão em 2ª instância é moralizadora'». Consultado em 20 de março de 2018
«Voto obrigatório no mundo». 12 de maio de 2014. Consultado em 5 de março de
2018
«Rejeição a voto obrigatório atinge 61% e alcança taxa recorde entre
brasileiros». 12 de maio de 2014. Consultado em 5 de março de 2018
«Na democracia o voto é um direito, não uma obrigação». 24 de maio de 2005.
Consultado em 5 de março de 2018
«Principal instrumento da democracia tem de ser facultativo». 24 de maio de
2005. Consultado em 5 de março de 2018
«A perspectiva social-democrata». Consultado em 5 de março de 2018
«Esgotamento do Estado de Bem-Estar afeta concretização de direitos sociais».
Consultado em 5 de março de 2018
«Do poder constituinte lipoaspiracional». Consultado em 5 de março de 2018
«Pesquisadores alertam para sistema tributário regressivo no Brasil; mais pobres
são afetados». Consultado em 17 de junho de 2019
«União tem 93% de gastos obrigatórios». Consultado em 29 de março de 2018
«"Quem vencer as eleições vai governar de mãos amarradas"». Consultado em 29 de
março de 2018
«"Constituição de 1988 é a causa do atraso do Brasil, diz descendente de D.
Pedro II"». Consultado em 5 de março de 2018
«A Constituição de 1988 na visão de Roberto Campos». Consultado em 5 de março de
2018
«Carta criou despesas sem fonte de recursos». Consultado em 5 de março de 2018
«Uma visão crítica». Consultado em 5 de janeiro de 2020
«Negócios da OAB». Consultado em 30 de agosto de 2012
«O pior corporativismo». Consultado em 5 de março de 2018
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Constitui%C3%A7%C3%A3o_brasileira_de_1988>
Constituições